STF decide em outubro se Justiça Militar pode continuar a julgar civis
Duas ações questionam competência da Justiça Militar para julgar determinados casos, como processos envolvendo civis
atualizado
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Outubro promete ser um mês decisivo para o futuro da Justiça Militar da União (JMU). O Supremo Tribunal Federal (STF) irá julgar ao menos duas ações que tratam da competência da Corte militar para julgar determinados processos, e poderá limitar a atuação da JMU.
As ações discutem a capacidade da Justiça Militar para processar e julgar: 1. Civis em tempos de paz; e 2. Delitos ocorridos durante o combate ao crime no exercício de “atribuições subsidiárias” das Forças Armadas.
São elas: a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.032, que está com o julgamento marcado para a próxima quarta-feira (6/10), e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 289, que deverá ser analisada no dia 21 de outubro.
Os julgamentos são vistos como um dos momentos mais críticos da história do tribunal militar, a mais antiga Corte do país.
A ADPF 289 trata da competência da JMU para julgar civis em tempos de paz. Hoje, o Código Penal Militar estabelece que civis podem ser julgados pela Justiça Militar caso tenham praticado crimes contra as instituições militares.
Dados publicados pelo SBT News em julho deste ano mostram que, nos últimos 18 meses, a Justiça Militar julgou 771 civis. Desse total, 163 pessoas foram condenadas e 50, absolvidas. Os julgamentos do restante dos processos ainda não tinham sido finalizados.
Autora da ADPF, a Procuradoria-Geral da República (PGR) pede que o STF reconheça a incompetência da Justiça Militar para julgar civis em tempo de paz e para que os crimes sejam submetidos a julgamento pela Justiça comum – federal ou estadual. A ação foi impetrada em agosto de 2013, quando a PGR era chefiada por Roberto Gurgel.
A PGR entendia que a submissão de civis à JMU viola o Estado Democrático de Direito e os princípios do juiz natural e do devido processo legal material. “Permitir que civis em tempo de paz sejam submetidos à jurisdição militar é estender a eles, por via transversa, os mesmos princípios e diretrizes que são próprios ao regime jurídico-constitucional especial dos militares, cujo objetivo não poderia ser outro senão resguardar a hierarquia e disciplina”, assinalou Gurgel.
“Como um civil em tempo de paz seria capaz de atentar contra a hierarquia e a disciplina da tropa, se ele nem sequer é militar ou integra os efetivos das Forças Armadas?”, interpelou.
O Ministério da Defesa, os comandos do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, a Advocacia-Geral da União (AGU) e o Superior Tribunal Militar (STM) se manifestaram contra a procedência do pedido, que está na relatoria do ministro do STF Gilmar Mendes.
“Em 2018, houve uma alteração legislativa que fixou a competência monocrática do juiz federal civil da Justiça Militar para processar e julgar sempre que as ações penais militares envolverem civis. Portanto, o principal argumento semântico da PGR contra essa competência cai por terra. Tanto é que, após a edição dessa lei, a PGR passou a se manifestar contra a inconstitucionalidade”, explica o juiz federal da Justiça Militar Fernando Pessôa da Silveira Mello, ao Metrópoles.
“Nós podemos ter consequências gravíssimas na Justiça Militar da União caso seja retirada a competência pra processar e julgar civis. A começar pela qualidade das decisões judiciais, pois os juízes federais da Justiça Militar conhecem as características da vida militar, que são conhecimentos específicos detalhados que precisam ser utilizados na avaliação de um crime militar. Essa é a justificativa para que exista um juiz do Trabalho, por exemplo”, complementa Fernando Mello.
Na ADI 5.032, impetrada em agosto de 2013 também por Gurgel, a PGR se mostra contra a competência da Justiça Militar para o julgamento dos crimes cometidos no exercício das atribuições subsidiárias das Forças Armadas – como nas GLOs (operações de Garantia da Lei e da Ordem).
A Procuradoria argumenta que o auxílio prestado na segurança pública pelas instituições militares federais não constitui atividade militar típica e explica que o alargamento da competência atenta contra todo o regime de direitos fundamentais inscritos na Carta Magna.