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Procuradores avaliam abrir novo inquérito contra Lula por obstrução

Força-tarefa da Operação Lava Jato analisa se houve destruição de provas e intimidação de autoridades e testemunhas

atualizado

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Daniel Ferreira/Metrópoles
Ex-presidente Lula
1 de 1 Ex-presidente Lula - Foto: Daniel Ferreira/Metrópoles

O depoimento de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao juiz federal Sérgio Moro reforçou os indícios reunidos por investigadores da força-tarefa da Operação Lava Jato, em Curitiba, de atuação do ex-presidente em atos de obstrução à Justiça no maior escândalo de corrupção do Brasil.

A força-tarefa da Lava Jato avalia se existem elementos de prova de que Lula, nos três anos de investigações ostensivas, buscou obstruir o trabalho de investigadores e da Justiça, com episódios que envolvem suposta destruição de provas e intimidação de autoridades e testemunhas do processo.

De acordo com reportagem do jornal O Estado de S. Paulo, as suspeitas devem resultar em novo inquérito contra Lula, em Curitiba, e, consequentemente, em mais uma denúncia criminal. O petista é réu em cinco ações penais, duas delas abertas por Moro. Na 10ª Vara Federal, no Distrito Federal, o ex-presidente é réu, desde julho de 2016, acusado de tentar comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró — crime de obstrução à Justiça.

Destruição
Em quase cinco horas de interrogatório, em Curitiba, Lula confirmou ter se reunido com três alvos da Lava Jato — um deles delator e outros dois em negociação de acordo —, em 2014, quando as investigações já tinham sido deflagradas. O petista, no entanto, negou irregularidades.

O ex-presidente confirmou encontros narrados pelo ex-diretor de Serviços da Petrobras, Renato de Souza Duque, e com o ex-presidente da OAS José Aldemário Pinheiro, o Léo Pinheiro. Os dois, também réus da Lava Jato e já condenados, contaram que Lula teria pedido para que fossem destruídas provas do esquema de corrupção na Petrobras.

Os dois são candidatos a delatores da Lava Jato, investigados desde 2014, por envolvimento no megaesquema de cartel e corrupção na Petrobras, em que empresas em conluio com políticos da base do governo Lula — em especial do PT, PMDB e PP — desviavam recursos de contratos da estatal. Um rombo de mais de R$ 40 bilhões, entre 2004 e 2014. No último mês, eles confessaram pela primeira vez envolvimento com os crimes.

Lula é réu nesse processo em que ficou pela primeira vez frente a frente com Moro, por crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro – pena pode chegar a 22 anos de prisão – pelo recebimento de R$ 3,7 milhões da OAS, em forma de “benesses” na ampliação e reforma de uma apartamento, no Guarujá (SP) e no custeio da guarda de bens presidenciais do petista.

Léo Pinheiro
O principal episódio contra Lula sob investigação, para o processo do triplex do Edifício Solaris, no Guarujá — que o petista nega ser dele — é o revelado ao juiz pelo ex-chefão da OAS. “Eu tive um encontro com o presidente em junho (de 2014), isso tenho anotado na minha agenda”, declarou Léo Pinheiro, ouvido em 20 de abril, por Moro, como réu nesse processo.

“São vários encontros onde o presidente, textualmente, me fez a seguinte pergunta. ‘Léo’, até notei que ele tava um pouquinho irritado, ‘Léo, você fez algum pagamento ao João Vaccari no exterior? Eu disse: ‘não, presidente, eu nunca fiz pagamento dessas contas que temos com Vaccari no exterior’.”

Lula insistiu, ainda de acordo com as revelações do empreiteiro. “Como é que você está procedendo os pagamentos para o PT através do João Vaccari?”

“Estou fazendo os pagamentos através de orientação do Vaccari, de caixa dois, de doações diversas que fizemos a diretórios.”

E Lula, então, deu a ordem, segundo o empreiteiro. “Você tem algum registro de encontro de contas, de alguma coisa feita de Vaccari com você? Se tiver, destrua!”

Lula negou a Moro o conteúdo da conversa, mas confirmou seus encontros frequentes.

“O senhor Léo Pinheiro afirmou em juízo que teria encontrado o senhor no início de 2014, ocasião na qual o senhor teria perguntado a ele se teriam registros documentais dos pagamentos de propina pela OAS ao Partido dos Trabalhadores por João Vaccari Neto. Na ocasião, ele afirmou que o senhor ex-presidente teria orientado a destruir essas provas se elas existissem, algo como: ‘se existir, destrua’”, disse Moro, durante o interrogatório.

“O senhor se encontrou com Léo Pinheiro durante o ano de 2014?”

“Encontrei com Léo Pinheiro”, respondeu Lula, enquanto acenava afirmativamente com a cabeça.

“Mais de uma vez?”, perguntou o juiz.

“Mais de uma vez. E jamais, jamais disse pro Léo, o que ele falou, jamais. Jamais pedi…”, respondeu Lula. “Aliás, é outra coisa, doutor Moro, que é importante o senhor saber o que eu penso. Eu vi alguns depoimentos, eu vi o sequestro… eu vi a busca e apreensão na casa do jornalista Eduardo Guimarães, depois eu vi o Duque falar, depois eu vi, acho que o Léo falar, em torno de uma introdução de tentar mostrar que eu ficava pedindo para as pessoas esconderem documentos”.

“Isso nunca aconteceu””, perguntou Moro.

“Nunca aconteceu e nunca vai acontecer, doutor!”, garantiu o ex-presidente.

O juiz da Lava Jato insistiu em detalhes sobre os encontros com o ex-presidente da OAS, que já está condenado em segunda instância pela Lava Jato. “Quantas vezes o senhor encontrou Léo Pinheiro durante 2014?”

“Ah, eu acho… veja, teve encontro com ele para discutir viagem, teve encontro com ele que foi para discutir o apartamento, tem tem discussões para discutir o futuro da economia brasileira, que 2013, depois das passeatas de junho, houve uma movimentação muito grande, no descenso da economia brasileira, e muita gente me procurava para discutir o que ia fazer nesse país com a economia. Atendi vários empresários, inclusive o Léo.”

Moro quis saber onde eram realizados os encontros com Léo Pinheiro.

“Sempre no Instituto (Lula, em São Paulo).”

Duque

Marcelo Camargo/Agência Brasil
Ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque

No dia 5, o ex-diretor de Serviços Renato Duque (2003 a 2012), que era o principal homem do PT no esquema de loteamento de cargos estratégicos da Petrobras, declarou ao juiz que foi procurado em junho de 2014 pelo ex-tesoureiro petista João Vaccari Neto para um encontro com Lula, que aconteceu no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo.

O ex-diretor, condenado a 57 anos e sete meses de prisão, atribui a Lula a frase: “Olha, presta atenção no que vou te dizer. Se tiver alguma coisa, não pode ter, entendeu? Não pode ter nada no teu nome, entendeu?”. No seu primeiro interrogatório à Lava Jato, em Curitiba, Lula confirmou a conversa, mas contou outra versão.

“Tinha muito boato que estava sendo roubado dinheiro, que o Duque tinha conta no exterior. Eu falei para o Vaccari: ‘se você conhece o Duque, eu queria falar com ele’”, contou o ex-presidente.

“Foi numa sala em Congonhas. E eu fiz a pergunta simples: ‘tem matérias nos jornais e denúncias que você tem dinheiro no exterior. Que está pegando da Petrobras e colocando no exterior. Você tem conta no exterior? Ele disse: ‘eu não tenho’. Eu falei: ‘acabou, se não tem, não mentiu para mim, mentiu para ele mesmo’”, afirmou Lula.

Para três investigadores da força-tarefa ouvidos pela reportagem, sob a condição de não terem os nomes revelados, o ato de buscar informações sobre provas de crimes, confirma a acusação de que Lula não era alheio ao esquema de corrupção na Petrobras.

Sérgio Machado
Outro elemento sob investigação pela força-tarefa é o encontro que Lula confirmou ter acontecido com o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, em 3 de junho de 2014, uma hora antes de se encontrar com Léo Pinheiro, ambos na sede do Instituto Lula, em São Paulo.

Tasso Marcelo/Estadão Conteúdo
Ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado

Ex-presidente da subsidiária da Petrobras que cuida do transporte de combustíveis, Machado virou delator e abalou a cúpula do PMDB, ao gravar conversas sobre um acórdão para “estancar” as investigações da Lava Jato. Os diálogos faziam referência a um “acórdão” amplo entre políticos para frear os avanços das investigações, que chegaram naquele mês de março à Lula. Começava ali também, as negociações da mega delação da Odebrecht — concluída em dezembro de 2016.

“O senhor se encontrou com Léo Pinheiro nessa data?”, perguntou o procurador da República Julio Motta Noronha.

“Certamente, encontrei, se está na minha agenda, encontrei”, respondeu Lula.

“Nessa data consta uma reunião do senhor com Léo Pinheiro às 17 horas e uma reunião antes com Sérgio Machado, da Transpetro?”, questionou Noronha.

Lula mostrou surpresa: “Na mesma data?”.

“Isso”, respondeu afirmativamente, o procurador.

O ex-presidente, então, deu sua versão para o motivo do encontro. “O Sérgio Machado foi me convidar para a inauguração de um navio, porque eu tomei uma atitude de colocar nome em um navio de personalidades brasileiras históricas, por exemplo, recuperar o nome do marechal negro Antonio Cândido, de colocar de Sérgio Buarque, de colocar de pessoas muito importantes da política brasileira, que tava esquecido. E ele foi me levar alguns modelos, umas réplicas de navios já feitas pela Petrobras.”

Investigação
Procuradores e policiais da força-tarefa avaliam que apesar de Lula ter negado as tentativas de enfrentamento à Lava Jato, narradas por outros réus, a confirmação das reuniões fornecem elementos para aprofundar apurações sobre novos crimes.

O processo do triplex, em que Lula foi interrogado, está em fase final e deve ser dele a primeira sentença de Moro contra o ex-presidente no escândalo Petrobras — a previsão é que a decisão seja dada até julho, se não houver interrupções no tramite da ação.

Lula confirmou ainda dados importantes para o processo do triplex, sem admitir ilícitos, como as ligações feitas do celular do empreiteiro Léo Pinheiro para o segurança que eram “certamente” para falar com ele, a visita pessoal ao triplex com ele, que tentaria “vender” o imóvel, e sua relação com Vaccari.

Ao fim do histórico interrogatório de Lula, na Lava Jato, Moro advertiu o réu ainda sobre outros cinco episódios que podem caracterizar tentativas de intimidação a autoridades, entre elas a fala de que mandaria prender procuradores da República e mesmo uma suposta ameaça velada aos policiais federais, que o conduziram coercitivamente para depor, em 4 de março de 2016, quando ele foi alvo da 24ª fase da Lava Jato, a Operação Alethea.

O advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins, se manifestou sobre o caso por meio de nota. Confira a íntegra:

“Uma nova linha de ataque foi aberta contra Lula pela Lava Jato. Consiste na utilização de pessoas que há muito buscam sair da prisão ou obter benefícios desde que incluam o nome do ex-Presidente em seus depoimentos ou o envolvam em situação de obstrução à Justiça. Estas são as condições para destravar acordos de delação. Confirme denúncias feitas por órgãos de imprensa.

Em seu depoimento ao Juízo de Curitiba, no dia 10, Lula rebateu as declarações de Leo Pinheiro e Renato Duque – que falaram sem o compromisso de dizer a verdade – e demonstrou que jamais praticou qualquer ato que possa ser entendido como obstrução à Justiça.

A inocência de Lula está comprovada após a oitiva de diversas testemunhas, que, estas sim, depuseram sob o compromisso de dizer a verdade, além de outras fartas provas no mesmo sentido.

A Força Tarefa da Lava Jato contou uma mentira ao País ao acusar Lula por meio de um PowerPoint exibido em rede nacional e de peças processuais meramente especulativas.

Há dois anos, a Lava Jato promove uma devassa na vida de Lula e seus familiares e nenhuma prova foi encontrada simplesmente porque eles não praticaram qualquer ato de corrupção, ao contrário do que foi afirmado pelos acusadores.

Qualquer iniciativa da Lava Jato neste momento servirá para reforçar que Lula é vítima de perseguição política por meio de procedimentos jurídicos, prática conhecida internacionalmente como “lawfare” e que atenta contra o Estado Democrático de Direito.”

Cristiano Zanin Martins

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