Por 9 a 1, STF decide suspender a produção de “dossiê antifascista” do MJ
Ação foi protocolada pela Rede Sustentabilidade contra o relatório do governo que investiga opositores
atualizado
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O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta quinta-feira (20/8), pela suspensão da elaboração do suposto “dossiê antifascista“, produzido pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública. O placar foi de 9 a 1. Apenas o ministro Marco Aurélio Mello foi contra a ação.
O processo foi aberto pelo partido Rede Sustentabilidade, que questiona a investigação sigilosa aberta pela pasta do ministro André Mendonça contra servidores públicos que seriam associados a “movimentos antifascistas”.
Voto da relatora
A ministra Cármen Lúcia, relatora do caso, votou por impor limites à atividade de inteligência do governo. A magistrada defende a suspensão de qualquer ato do Ministério da Justiça que leve à produção ou ao compartilhamento de informações sobre a vida pessoal e as escolhas políticas de servidores e professores universitários antifascistas.
Ela informou que o ministro da Justiça afirmou que não sabia da existência de nenhum relatório, mas que só teve conhecimento do caso pela imprensa. “Benza Deus pela imprensa livre no país”, disse Cármen Lúcia.
Como votaram os outros ministros
O ministro Alexandre de Moraes votou no mesmo sentido da relatora, ou seja, para impedir o MJ de elaborar dossiês com informações pessoais de cidadãos considerados antifascistas.
Segundo o ministro, não é possível que qualquer sistema de inteligência possa atuar fora dos limites da legalidade e começar a produzir e compartilhar informações sobre vida pessoal. “Não há a mínima razoabilidade”, disse.
Terceiro a votar, Edson Fachin acompanhou os colegas em razão “do aparente desvio de finalidade do órgão de inteligência do MJ”. Para ele, a administração pública não pode ter o direito de listar inimigos do regime. “Só em governos autoritários é que se pode cogitar dessas circunstâncias”, afirmou.
O ministro Luís Roberto Barroso seguiu a relatora e explicou que, sempre que se lida com a atividade de inteligência, é preciso ter em conta o risco que ela oferece de abuso de poder a todos os governos e governantes. “Serviço de inteligência é uma atividade de Estado e não de governo”, afirmou.
A ministra Rosa Weber votou no mesmo sentido da relatora. De acordo com ela, não acatar a ação seria acobertar o que só pode ser descrito, na melhor das hipóteses, “como bisbilhotice e na pior como perseguição política e ideológica”, disse.
Ao votar pelo deferimento da cautelar nos mesmos moldes da relatora, o ministro Luiz Fux afirmou que, em comparação com a investigação do inquérito que apura ameças contra os ministros do STF, o documento em julgamento se mostra inócuo.
O ministro Ricardo Lewandowski acompanhou a relatora. Seu voto vai no sentido de impedir que a inteligência do Estado extrapole os limites constitucionais.
“Num Estado Democrático de Direito não é legítimo que se elabore dossiê sobre cidadãos em que neles constem informações pessoais, como caráter afetivo, religioso, fatos que ocorreram num passado recente no regime militar”, disse.
O ministro Gilmar Mendes votou por suspender a produção de dossiê. Para ele, a simples defesa de uma ideia que vai contra às ideias de governo deve ser livre de qualquer constrangimento.
“O próprio presidente da República declara opiniões negativas contra os grupos antifa que se manifestam contra o atual governo, os critica ‘marginais e terroristas'”, disse.
O ministro Marco Aurélio abriu a divergência votando pela inadequação da ação ajuizada e, por conseguinte, pela extinção do processo sem apreciação do mérito.
O presidente do STF, Dias Toffoli, votou seguindo a relatora, no sentido de acolher a medida cautelar.
Sustentações orais
Pela Rede Sustentabilidade, o advogado Bruno Gonçalves defendeu que a Constituição Federal assegura a liberdade de expressão e resguarda discursos plurais, inclusive daqueles que se declaram publicamente antifascistas. “Sem divergências saudáveis de ideias, não há democracia”, disse.
Representando a União, o advogado José Levi rejeitou a alegação de autoritarismo por parte do governo. Pediu o indeferimento da concessão da liminar e rogou ao STF a avaliação de relatório da diretoria de inteligência, de modo a julgar o acerto ou desacerto “de uma prática que pode e deve ser controlada”.
O procurador-geral da República, Augusto Aras, esclareceu que relatório de inteligência não se confunde com investigação criminal. Aras enfatizou a importância da atividade de inteligência ao dizer que tal atividade antecipa atividades de risco. “A PGR não admite que o governo espione opositores do governo”, argumentou.
Ao defender o indeferimento da cautelar, Aras disse que a ação foi embasada exclusivamente por notícias da internet, oriundas de fontes abertas, tais como Facebook, Instagram e YouTube.
Dossiê
Na ação, o partido relata a existência de um dossiê com dados pessoais de um grupo de 579 servidores federais e estaduais de segurança e três professores universitários que seriam críticos ao governo. A relatora do caso é a ministra Cármen Lúcia.
Até agora, no entanto, o Ministério da Justiça não confirmou a existência do relatório, mas também não negou.