PGR pede que STF barre honorários com recurso de precatório do Fundef
Governador eleito do DF, Ibaneis Rocha recebeu esse tipo de pagamento. Para Raquel Dodge, recursos do fundo são exclusivos da educação
atualizado
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A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, solicitou nesta segunda-feira (17/12) ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, a suspensão de todas as decisões judiciais que autorizam os municípios a pagarem honorários advocatícios com precatórios recebidos do Fundo Nacional de Desenvolvimento do Ensino Fundamental (Fundef), atual Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).
Um dos beneficiados por esse tipo de pagamento foi o governador eleito do Distrito Federal, o advogado Ibaneis Rocha, cujo escritório ganhou, em 2013, uma ação contra a União e em favor do município de Jacobina (BA): a cidade reclamava o valor repassado pelo Fundef ao município. Conforme reportagem publicada pelo Metrópoles, a causa rendeu R$ 39,9 milhões, que seriam pagos por meio de precatórios. Foi determinado, também, o pagamento de R$ 9 milhões, a título de honorários, ao escritório de Ibaneis Rocha, contratado pela prefeitura para pleitear os valores referentes ao Fundef.
No entanto, por entender que o dinheiro do fundo não poderia ser utilizado para pagar o serviço advocatício, a Justiça Federal bloqueou o repasse dos R$ 39,9 milhões, no âmbito de uma primeira ação civil pública movida contra o escritório de Ibaneis. O Ministério Público Federal apontou superfaturamento, uso indevido da verba, que deveria ser exclusivamente destinada a investimentos em educação, e dano ao erário. Além de Ibaneis e seu escritório, quatro sócios do ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no DF (OAB-DF) também são alvo da ação.
Em junho de 2017, após recurso apresentado por Ibaneis, a Justiça substituiu o bloqueio pela penhora de um bem imóvel em valor similar. Atualmente, o caso segue em tramitação no TRF-1.
Verba para desenvolvimento da educação
Ao pedir a suspensão das decisões judicias ao STF, a chefe do Ministério Público Federal justifica que, segundo a lei, o dinheiro do Fundef deve ser integralmente aplicado na manutenção e no desenvolvimento da educação básica brasileira – ainda assim, na contramão das normas, várias decisões judiciais têm permitido o pagamento de honorários a escritórios de advocacia simplesmente para aplicarem sentença proferida em 2015, em Ação Civil Pública proposta pelo MPF.
Raquel Dodge pontua que, embora tenha o Ministério Público Federal iniciado o cumprimento de sentença, diversos municípios passaram a ajuizar execuções individuais com base na sentença – alguns deles, contratando escritórios de advocacia. Além de contratos sem licitação, o MPF identificou que os honorários têm sido descontados dos precatórios do Fundef recebidos pelo município.
A procuradora-geral relata que o cálculo inicial do montante do fundo é de R$ 90 bilhões. Ela narra, ainda, que alguns contratos preveem a destinação de até 20% do valor recebido pelo município para os advogados. “O objetivo da suspensão solicitada ao Supremo é evitar que parcela considerável desse valor seja desviada de sua finalidade constitucional e legal, que somente compreende os gastos com ações e serviços para a manutenção e o desenvolvimento da educação básica”, sustenta a procuradora.
Grave lesão à ordem
Dodge assinala que, por se tratar de uma ação que pode causar grave lesão à ordem e à economia públicas, e por se tratar da proteção do direito fundamental à educação, a PGR defende que o Supremo suspenda imediatamente as decisões judiciais que autorizam o pagamento desses honorários.
Ela ressalta que os julgamentos que permitem o destaque de recursos do Fundef para escritórios de advocacia violam frontalmente o ordenamento jurídico constitucional e infraconstitucional, e contrariam a orientação firmada pelos tribunais superiores sobre a temática.
A Procuradoria argumenta que tanto o Supremo quanto o Superior Tribunal de Justiça (STJ) têm entendimentos que vedam o pagamento de advogados com dinheiro do Fundef.
O Ministério Público Federal acompanha as ações do Fundef há cerca de 20 anos. Foi em Ação Civil Pública proposta pela Procuradoria da República em São Paulo, em 1999, que a Justiça reconheceu o direito de alguns municípios receberem complementação a valores pagos pelo fundo, entre 1998 e 2006. A dívida da União com os municípios é fruto de um erro na forma de cálculo do valor mínimo anual por aluno.
Na Câmara de Direitos Sociais e Fiscalização de Atos Administrativos em Geral (1CCR) do MPF há uma ação coordenada que acompanha o caso, além de um grupo de trabalho interinstitucional, que conta com membros do Ministério Público Federal, MPs dos estados e MPs de Contas.
Outro lado
Em relação ao caso de Ibaneis Rocha, seu sócio e responsável pela condução do processo citado, o advogado Johann Homonnai afirmou ao Metrópoles, na época da publicação da reportagem, que o escritório de Ibaneis atuou em dezenas de casos semelhantes ao de Jacobina, tendo, inclusive, defendido no Superior Tribunal de Justiça (STJ) o pagamento de honorários mesmo quando oriundos de fundo com destinação específica, como o Fundef.
“Conseguimos pacificar a questão, com a decisão favorável do STJ. Isso nos deu conhecimento específico, o que justifica a contratação, mesmo com outra banca de advogados atuando”, explicou o advogado.
Sobre o suposto superfaturamento, Homonnai afirmou que a OAB recomenda que, em contratos considerados de risco, como o em questão, a cobrança de honorários é geralmente estipulada a 20% do valor total. “Na causa de Jacobina cobramos 8%”, disse.
Em relação ao dano ao erário público e ao suposto uso do dinheiro oriundo do Fundef após a liberação do pagamento do precatório, o advogado afirmou que a banca desconhece a origem do dinheiro. “Nós prestamos um serviço e recebemos por ele”, concluiu.