Lista de inelegíveis do TCU inclui ocupantes de cargos do alto escalão
Entre os nomes, estão o secretário-executivo do Banco Central e o diretor-presidente em exercício da Avisa
atualizado
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Sindicalistas, ex-políticos e ocupantes de cargos do alto escalão de órgãos governamentais estão na lista de inelegíveis enviada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O documento traz uma relação de 7.431 pessoas e aponta aquelas que não podem se candidatar nas eleições gerais deste ano porque tiveram contas julgadas irregulares pelo TCU em decisão sem possibilidade de recurso. Entre os nomes, estão gestores com cargos de chefia em órgãos como o Banco Central e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Segundo a Lei de Inelegibilidade, não podem concorrer nas eleições “os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente”. Estão excluídos da norma, no entanto, casos em que a determinação da Corte de Contas tenha sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário. A inelegibilidade vale para os oito anos seguintes, contados a partir da data da deliberação.
Portanto, em anos eleitorais, o TCU envia ao TSE o documento com os nomes daqueles que se enquadram nessa situação. Quem consta na lista não está automaticamente inelegível, mas a relação pode ser utilizada para embasar pedidos de impugnação de candidatura.
Uma das pessoas que aparece no documento é Adalberto Felinto da Cruz Júnior, atual secretário-executivo do Banco Central do Brasil (Bacen). Nomeado para o cargo em fevereiro de 2017 pelo atual presidente da entidade, Ilan Godlfajn, Cruz possui um papel estratégico na instituição.
Segundo o regimento interno do Bacen, estão entre as tarefas do secretário-executivo representar a banco junto a diversos setores, selecionar propostas a serem apresentadas ao presidente e até permitir o fechamento ou a prorrogação de contratos. Pesa contra Adalberto Cruz, no entanto, uma condenação de ressarcimento aos cofres públicos proferida pelo TCU e que teve trânsito em julgado no ano de 2015.
O processo trata de um empréstimo de R$ 24 milhões concedido pelo Banco do Nordeste do Brasil (BNB) em 1997, quando Adalberto Cruz era superintendente da instituição para o Maranhão e Piauí. Segundo apurado pelo Ministério Público Federal (MPF), a empresa Almeida Consultoria Ltda. apresentou ao banco proposta para instalar uma cadeia de pequenas unidades de produção têxtil na região metropolitana de São Luís (MA). À época, o projeto foi chamado de Polo Industrial de Confecções da Grande São Luís.
Para a concessão do empréstimo, no entanto, a empresa utilizou o cadastro de trabalhadores que nunca tiveram acesso ao dinheiro. Também não sabiam que seus nomes estavam sendo usados para esse fim. Os recursos acabaram sendo desviados e não foram recuperados. Segundo o TCU, ao emprestar o montante, Cruz agiu “à revelia de normativos internos do banco que disciplinam a matéria” e, por isso, a Corte o condenou a ressarcir aos cofres públicos parte de um total de R$ 7,7 milhões.
Em defesa, o secretário-executivo do Bacen alegou não ter agido de má-fé e que a concessão do empréstimo não era de sua responsabilidade. Afirmou ainda não haver prova de sua participação em ato causador de dano ao erário, assim como não enriqueceu ilicitamente nem auferiu vantagem indevida para si ou para outrem. Não foi o suficiente para convencer os ministros do TCU.
A participação do ex-superintendente Adalberto Felinto da Cruz Júnior nas negociações para concessão de crédito para o Polo Industrial Confeccionista da Grande São Luís está claramente caracterizada nos autos. Não obstante tenha admitido o acompanhamento do projeto desde o início, com participação ativa em diversas reuniões e ciência prévia da natureza do empreendimento, inclusive no que se refere à opção pela análise individualizada dos pedidos de crédito, o responsável não adotou as medidas que lhe competiam, tendentes a resguardar os interesses do banco e os recursos públicos administrados pela instituição.
Ministro do TCU José Múcio Monteiro
A condenação pelo TCU não permite a adoção de sanções previstas na lei de improbidade administrativa nem representa empecilho para a ocupação de cargo público. Portanto, não há ilegalidade na posição que Adalberto Cruz ocupa atualmente. A decisão, porém, o deixa inelegível até 2023. Por conta do empréstimo, ele responde ainda a uma ação penal e a uma ação de improbidade administrativa. Ambas tramitam na Justiça Federal do Maranhão desde 2004.
O Metrópoles acionou o Banco Central mas, até a última atualização desta reportagem, a instituição não havia se posicionado.
Anvisa
Outro nome que aparece na lista é o do atual diretor-presidente em exercício da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Fernando Mendes Garcia Neto. Na diretoria do órgão desde 2015, acumula desde julho a Diretoria de Coordenação e Articulação do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária.
O nome de Fernando Garcia aparece na relação porque, em 2012, o TCU julgou irregulares contas relativas ao ano de 2007, quando foi diretor do Datasus, departamento de informática do Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo a apuração da Corte de Contas, ele foi um dos responsáveis por prorrogar, sem a realização de licitação, um contrato de manutenção de equipamentos. Por isso, foi condenado a pagar uma multa de R$ 5 mil.
Segundo o TCU, os motivos apresentados pelo gestor para explicar a dispensa da licitação “foram genéricos, baseados tão apenas nos atestados de exclusividade e não houve ampla pesquisa prévia de mercado para comprovação da vantagem de preços e condições da contratada, não tendo, assim, logrado demonstrar que a contratação direta tenha sido a opção mais vantajosa para a Administração”.
Em nota, a assessoria de imprensa da Anvisa afirmou que Fernando Garcia já quitou todos os seus débitos com o TCU e que suas condições de “plena idoneidade” foram comprovadas quando foi nomeado à agência.
Confira a nota na íntegra:
O diretor-presidente substituto em exercício da Anvisa, Fernando Mendes, em processo de tomada de contas conduzido pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em 2011, teve como penalidade administrativa o pagamento de multa de R$ 5 mil.
A aludida multa foi paga em 30 de novembro de 2011, dando plena quitação ao processo sancionatório.
Quando da indicação de Fernando Mendes para a diretoria da Anvisa, no final do ano de 2014, todas as verificações sobre a aptidão do indicado foram realizadas pela Presidência da República e Congresso Nacional, restando comprovadas as condições de plena idoneidade para que ele assumisse a direção da Agência.
Nessa condição de absoluta lisura e regularidade na nomeação do Diretor Fernando Mendes não há que se falar em constrangimento para o desempenho da função que lhe foi confiada.
Administração, Junta Comercial e partido
Aparecem ainda no documento o presidente da Junta Comercial do DF, Antônio Eustáquio Corrêa da Costa; o chefe de gabinete da Administração Regional de Samambaia, Claudeci Ferreira Martins; e o tesoureiro nacional do Partido da República, Jucivaldo Salazar Ferreira.
O primeiro foi condenado pelo TCU, em 2012, por irregularidades no pagamento de Gratificação por Produção Suplementar (GPS) aos servidores da Imprensa Nacional referente ao ano de 1998. À época, ele era diretor-geral do órgão. Já Claudeci Ferreira Martins foi condenado pela Corte em três processos por irregularidades na prestação de contas de serviços que contaram com apoio governamental.
Os feitos tratam de convênios firmados pelo Instituto Arte Cia e Cidadania (IACC), presidido pelo atual chefe de gabinete da Administração de Samambaia. Entre 2008 e 2009, a entidade recebeu R$ 1,45 milhão do Ministério do Turismo para a realização de eventos culturais em Tocantins e no DF. O TCU, no entanto, encontrou problemas na prestação de contas desses contratos e julgou as contas irregulares. Além disso, determinou que Claudeci e o IACC paguem R$ 843 mil aos cofres públicos, a título de ressarcimento e multa.
Já o tesoureiro do PR, Jucivaldo Salazar Ferreira, foi condenado por irregularidades nas contas do próprio partido. Ex-candidato a deputado distrital e a vice-governador do DF, ele e outros dois foram sancionados ao pagamento de R$ 43,5 mil, além de multa de R$ 6 mil, por não terem apresentado a prestação de contas do Prona, legenda incorporada pelo PR em 2006.
Ao Metrópoles, a Junta Comercial do DF afirmou que o presidente da entidade, Antônio Eustáquio, “não será candidato a nenhum cargo eletivo em 2018”. Já a Administração de Samambaia informou que “o servidor em questão não é postulante a nenhum cargo eletivo”. “Em relação às contas, já foi solicitada a revisão do julgamento do Tribunal de Contas da União, conforme previsto na legislação. O intuito é sanar as pendências junto àquele tribunal”, diz o comunicado. O Partido da República não havia se posicionado até a última atualização desta reportagem.
Nomes célebres
Além dos nomes já citados, a lista entregue em julho pelo TCU ao TSE traz ainda personagens célebres que hoje não ocupam mais cargos públicos. É o caso do ex-reitor da Universidade de Brasília Timothy Mulholland; o ex-deputado federal e ex-secretário do GDF Wigberto Tartuce – o Vigão; o ex-ministro da Agricultura e ex-senador Paulo Afonso Romano; e o ex-senador Aluízio Bezerra. Todos tiveram contas julgadas irregulares pelo TCU nos últimos oito anos e estão inelegíveis.