Juristas, políticos e acadêmicos “sabatinam” Alexandre de Moraes
A convite do Metrópoles, nove personalidades dizem o que gostariam de perguntar ao indicado por Temer para uma vaga no STF
atualizado
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Da última vez que um candidato a ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) se encontrou com os senadores da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) saiu da Casa 12 horas depois, alvejado por uma dura série de perguntas. Mesmo após o interrogatório, no dia 12 de maio de 2015, Luiz Edson Fachin foi aprovado para a vaga na Corte. Mas teve de suar a toga.
É possível que este não seja o cenário que encontrará o ministro da Justiça licenciado, Alexandre de Moraes, indicado para o cargo pelo presidente Michel Temer (PMDB-SP) na segunda-feira da semana passada (6/2). A cadeira ficou vaga após a morte de Teori Zavascki em um acidente aéreo, em 19 de janeiro. A sabatina está marcada para esta terça-feira (21/2), em reunião agendada para começar às 10h.
Além de enfrentar um Senado que há mais de um século não rejeita uma indicação presidencial ao Supremo, o titular da pasta vai encarar um Congresso com maioria favorável ao governo e acordos políticos bem costurados. A previsão é de que os senadores chancelem a indicação.Com credenciais fortes, mas um histórico de polêmicas, a opção pelo nome do ministro dividiu populares, juristas, políticos e acadêmicos. Por isso, antes que a formalidade ocorra, o Metrópoles procurou nove representantes destes segmentos para, em uma sabatina informal, saber: “Que pergunta o senhor(a) faria para Alexandre de Moraes?”
As mesmas perguntas foram enviadas a Moraes. No entanto, por meio de assessoria, o ministro licenciado afirmou: “em respeito ao Senado Federal, não irei me manifestar até a sabatina”.
Os questionamentos incluem desde a possibilidade de ele se tornar revisor da Lava Jato às posições jurídicas que pode adotar na Corte.
Clique no rosto para conferir as perguntas.
Prisão após 2ª instância
O jurista Modesto Carvalhosa abordou a possibilidade de prisão de condenados em segunda instância. Em outubro do ano passado, a tese sagrou-se vencedora no plenário do STF, por maioria apertada (6 x 5), e dividiu opiniões no meio jurídico.
Antes de a indicação de Alexandre de Moraes ser anunciada, operadores do direito levantaram a possibilidade de um novo ministro contrário ao entendimento inverter o placar e impactar o futuro de operações como a Lava Jato. O ministro da Justiça licenciado, entretanto, já disse anteriormente que é a favor da execução da pena antes do trânsito em julgado (fim do processo).
Com a possibilidade, especula-se que a crise no sistema penitenciário seja agravada. O advogado criminalista Kakay indaga Alexandre de Moraes a respeito de como vai conseguir ajustar esse posicionamento à expectativa de um aumento da população carcerária no sistema, em decorrência desse entendimento.
Brasil x Estados Unidos
O jurista Luiz Flávio Gomes questionou as diferenças entre as sabatinas realizadas no Brasil e nos Estados Unidos. A inquirição dos indicados para a Suprema Corte dos EUA é notória pelo seu rigor e pelo processo exaustivo que impõe aos candidatos.
Lá, são dias de duras conversas com dezenas de senadores. A formalidade é apontada, por vezes, como o polo oposto das sabatinas realizadas pelo Senado brasileiro, onde a regra seria chancelar o nome dos indicados.
Em terras tupiniquins, o Senado não rejeita uma indicação ao STF há mais de um século. Em toda a história, a Casa barrou apenas cinco nomes, todos oriundos do governo de Marechal Floriano Peixoto.
Toga politizada?
A ministra aposentada do STJ Eliana Calmon, por sua vez, tratou das recorrentes manifestações dos membros do STF sobre aspectos políticos do país. O delicado momento que o Brasil atravessa tem afastado, em alguns momentos, a discrição de ministros, dando espaço às falas fora dos autos dos processos.
Alguns membros da atual composição da Corte vêm sendo duramente criticados — principalmente desde a deflagração do processo de impeachment contra a ex-presidente Dilma Rousseff, em agosto do ano passado — por seus comentários críticos e supostamente politizados à imprensa.
Suposto plágio
Professores de Direito da USP, entre eles, Sérgio Salomão Shecaira (foto), abordaram a mais recente polêmica em que Alexandre de Moraes se envolveu. O jornal Folha de S.Paulo publicou reportagem na quinta-feira da semana passada (9/2), na qual revelou que um livro de direito publicado em 1997 por ele contém “três trechos idênticos” ao de uma obra do jurista espanhol Francisco Rubio Llorente.
Especialistas consultados pelo jornal levantaram a possibilidade de o ato ser caraterizado como plágio. Em sua defesa, Moraes disse que “todas as citações do livro constam da bibliografia anexa à publicação”.
Conflito de interesses
Líder do PSol na Câmara dos Deputados, Glauber Braga (RJ) levantou credenciais que supostamente tornariam a indicação de Alexandre de Moraes para o STF inviável. Devido à sua filiação ao PSDB desde dezembro de 2015 e seu trânsito no PMDB, a imparcialidade de Moraes como julgador, especialmente nos processos envolvendo a Lava Jato, foi questionada pelo parlamentar.
Caso se torne ministro, Alexandre de Moraes será o revisor dos processos da operação levados ao plenário do STF. A previsão está no artigo 24 do Regimento Interno do STF, que estabelece a seguinte regra: “Será revisor o ministro que se seguir ao relator na ordem decrescente de antiguidade”. Como Edson Fachin — último a entrar no STF — é o relator, o novo ministro se tornaria o revisor automaticamente.
Reserva do possível
Ex-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) e atual secretário da Educação do Estado, José Renato Nalini pediu a opinião de Alexandre de Moraes a respeito da possibilidade de uma flexibilização pelo STF do princípio da reserva do possível diante da crise econômica que o país enfrenta.
O princípio trata do que seria razoável se exigir do Estado. Consiste na regulação da atuação estatal para implementar direitos sociais e fundamentais de acordo com a disponibilidade financeira. No STF, a questão foi analisada em 2015, em um julgamento no qual a Corte decidiu que o princípio não poderia ser invocado pelo Executivo para deixar de realizar obras de reforma em presídios.
Previsões constitucionais
Elogioso às credenciais do ministro da Justiça licenciado, Claudio Lamachia, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), pediu a confirmação de Moraes quanto às prerrogativas constitucionais – “reputação ilibada” e “notável saber jurídico” – para se tornar ministro do STF.
Os critérios citados por Lamachia estão previstos na Constituição Federal de 1988. De acordo com o artigo 101 da Carta Magna, “o Supremo Tribunal Federal compõe-se de 11 ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de 35 e menos de 65 anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada”. Assim, o indicado para compor a Corte deve preencher estes requisitos para sentar na cadeira suprema.
Pacote anticorrupção
Em 2015, o Ministério Público Federal lançou a campanha “10 medidas contra a corrupção”, com o objetivo de “aprimorar a prevenção e o combate à corrupção e à impunidade”. De iniciativa dos procuradores da República da força-tarefa da Lava Jato, a campanha coletou mais de 2 milhões de assinaturas. As propostas foram, então, levadas ao Congresso em forma de projeto de iniciativa popular.
O ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo aborda a questão, sob o ponto de vista de que o STF tem entre suas atribuições promover o controle de constitucionalidade de leis e atos normativos. Neste sentido, se vier a compor a Corte Suprema, Alexandre de Moraes pode ter de analisar as previsões constantes do pacote anticorrupção, que já foi votado e sofreu modificações no Legislativo.