Juristas hesitam em classificar gesto de Bolsonaro como crime
O presidente compartilhou vídeo convocando a população para participar de atos em favor do governo e contra o Congresso, em 15 de março
atualizado
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Após o presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), usar a conta no WhatsApp para compartilhar um vídeo convocando a população a comparecer em atos a favor do governo – que incluem na pauta ataques ao Congresso e ao Supremo Tribunal Federal (STF), a atitude foi duramente criticada nos meios jurídicos. Além da avaliação de que o gesto do chefe do Executivo federal pode criar uma crise institucional entre os Três Poderes, juristas ainda hesitam em cravar que Bolsonaro cometeu crime de responsabilidade (passível de impeachment).
Segundo o Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), o presidente promove “conteúdos autoritários”, que “atentam” contra as liberdades democráticas e os direitos fundamentais. “Os fatos recentes chamam a atenção dos juristas, posto que é inconcebível, segundo os princípios constitucionais, propagar ou incentivar manifestações de cunho fascista, contrárias ao estado democrático”, diz trecho da nota.
A instituição chega a declarar que a atitude de Bolsonaro ultrapassa os limites da legalidade, mas não usa a palavra impeachment. “A autonomia e a liberdade dos poderes da República são inquestionáveis e indispensáveis ao equilíbrio da representação da Nação. O IAB não assistirá impassível aos ataques à democracia“, continua a manifestação. “É hora de unir forças para, o quanto antes, se contrapor ao golpismo.”
“Falta de apego democrático”
De acordo com o advogado Marco Marrafon, do escritorio Marrafon, Robl & Grandinetti, a convocação feita pelo presidente da República constitui um “atentado à democracia e mostra que ele não tem conteúdo democrático”. “É bem evidente que é gravíssimo o que ele fez. É um caso que pode iniciar um crise institucional”, disse.
Segundo o advogado, o artigo 85 da Constituição estipula que é um crime de responsabilidade atentar contra o livre exercício do poder Legislativo. Para Marrafon, contudo, as atitudes de Bolsonaro ficam “muito próximas” de ser enquadradas nesse delito, mas, para que isso efetivamente se configure, “esse atentado teria que ter um ato mais concreto”.
“Hoje não há como enquadrar como crime de responsabilidade, mas é uma ameaça gravíssima. Eu acredito que é uma demonstração clara de falta de apego democrático. É absolutamente grave. O Parlamento tem feito o seu dever de casa. Tudo deve ser resolvido com base na democracia”, afirmou o advogado.
Entenda
No último domingo (23/02/2020), foi revelado que Bolsonaro disparou entre seus contatos de WhatsApp um vídeo no qual convoca as pessoas a irem ao movimento, reforçado após áudio do ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, pregar que os cidadãos “fossem às ruas” contra o que ele chamou de “chantagem” do Congresso na execução do Orçamento federal.
Após a repercussão negativa da mensagem, o presidente foi às redes dizer que o envio do vídeo tinha “cunho pessoal“, na tentativa de desvincular o cargo do chamamento para o protesto.