Cabral depõe em inquérito sobre uso de algemas durante transferência
Para juristas, procedimento adotado na mudança do emedebista do Rio a Curitiba (PR) foi exibição desnecessária: ex-governador não é perigoso
atualizado
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Sob sigilo, o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (MDB) prestou depoimento nesta quinta-feira (19/4), por cerca de 40 minutos, no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), no centro do Rio. O depoimento ocorreu em inquérito que apura suposto crime de abuso de autoridade na imposição do uso de algemas quando Cabral foi levado, em janeiro, por policiais federais para exames no Instituto Médico Legal de Curitiba, no Paraná.
Na ocasião, o emedebista foi conduzido com mãos e pés algemados, ladeado por agentes armados e de capuz. O procedimento recebeu críticas de juristas, que o consideraram uma exibição desnecessária, já que o ex-governador não tem histórico de periculosidade.
Cabral fora transferido da Cadeira Pública José Frederico Marques, em Benfica, no Rio, para o Instituto Médico Penal de Pinhais (PR). A transferência ocorreu depois que procuradores da República constataram regalias dadas ao emedebista no presídio carioca, como acesso a comida, supostamente, de bons restaurantes. Cabral também foi acusado de envolvimento em uma montagem para criação de uma sala de vídeo na cadeia, com televisão de tela grande e DVDs.Sob sigilo
O depoimento desta quinta não foi aberto ao público, por ordem do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. Foi o ministro quem determinou a abertura do inquérito e é também seu relator. Cabral chegou por volta das 13h50 e foi embora às 15h40, na parte traseira gradeada de uma viatura da Polícia Federal.
Ele foi ouvido pelo juiz Ali Mazloum, auxiliar do gabinete de Gilmar Mendes, enviado especialmente ao Rio para acompanhar a oitiva. Depois do depoimento, funcionários do TRF entregaram a gravação da íntegra ao juiz Mazloum. Também receberam ordem para apagar imediatamente a memória do HD do computador do tribunal que armazenou a filmagem.
Na saída do tribunal, o advogado do ex-governador, Rodrigo Roca, disse que o juiz informou ter sido decretado “sigilo absoluto” no inquérito. O magistrado orientou o advogado a não dar declarações à imprensa sobre o depoimento, “para não comprometer as investigações”.
“O que eu posso dizer é: o ex-governador foi ouvido hoje (19) e relatou o fato, de conhecimento público, que ele protagonizou infelizmente lá em Curitiba”, resumiu o defensor.
Roca afirmou não haver “fundamento legal” para o uso de algemas pelo ex-governador. “Ele esteve em Curitiba outras duas vezes e nunca foi usado algemas. Aliás, nunca nenhum preso da Lava Jato foi tratado daquela maneira selvagem com o ex-governador foi em Curitiba. Então, evidentemente precisa ser apurado e, se houver culpado, que pague por isso”, disse.
Pedido de arquivamento
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, chegou a pedir o arquivamento imediato do inquérito aberto por Gilmar, na última terça-feira (17). Ela alegou que não se vislumbrava “qualquer viabilidade jurídico-constitucional na tramitação do inquérito” no Supremo.
A procuradora também afirmou que a lei não permite a um ministro determinar abertura de inquérito sem um pedido do Ministério Público. Além disso, o ministro não poderia nomear a si mesmo relator do caso. Dodge lembrou ainda não haver envolvimento no episódio de autoridade com foro privilegiado para provocar a abertura de uma investigação no Supremo, bem como alertou sobre a existência de investigação no Paraná sobre os mesmos fatos.
Roca questionou o posicionamento da procuradora. “A decisão de deflagração da investigação não foi de um ministro, foi do colegiado inteiro. No momento em que se deflagram tantas investigações, por que esse receio de se investigar também mais esse episódio? O ex-governador esteve por quase quatro meses lá em Curitiba. Se essa investigação já existia lá, ele sequer foi ouvido”, declarou.
Nos dias seguintes à condução de Cabral algemado, a Polícia Federal defendeu o seu procedimento como legal e necessário à segurança do preso.