Apenas um presidente do Brasil teve indicados ao STF rejeitados pelo Senado
Durante toda a história da República no Brasil, apenas cinco indicações não prosperaram em votação na Casa Alta
atualizado
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A sabatina do desembargador Kassio Marques, indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelo presidente Jair Bolsonaro, será na próxima quarta-feira (21/10) no Senado Federal. Nos bastidores, avalia-se que Marques não terá problema para manter a tradição, e ocupar a vaga deixada pelo ex-ministro Celso de Mello, que se aposentou no último dia 13 de outubro.
Afinal, durante toda a história da República no Brasil, ao longo de 130 anos, apenas cinco designados ao Supremo Tribunal Federal (STF) foram rejeitados pelo Senado até hoje – todos em 1894, no governo do presidente marechal Floriano Peixoto (1891-1894).
Trata-se de Barata Ribeiro, Innocêncio Galvão de Queiroz, Ewerton Quadros, Antônio Sève Navarro e Demosthenes da Silveira Lobo.
Assim como a atual Constituição, a Carta de 1891, vigente à época, determinava que os nomeados ao STF fossem submetidos à aprovação da Casa Alta, com a diferença de que os apontados assumiam antes mesmo de passar pelo Senado.
O ex-ministro Celso de Mello publicou o estudo “Nota sobre o Supremo Tribunal (Império e República)”, em 2014, com a curiosidade acerca da Corte, onde passou os últimos 31 anos.
Rejeitados
O caso mais emblemático ocorreu com o médico, professor e político Barata Ribeiro, que foi nomeado ministro do STF em 23 de outubro de 1893, em decorrência do falecimento de Barão de Sobral. Ribeiro tomou posse em 25 de novembro daquele ano.
Ele era médico-cirurgião e lecionava na Faculdade de Medicina do Rio. Foi um dos expoentes dos movimentos pelo fim da escravidão e da monarquia e prefeito do Distrito Federal – à época, Rio de Janeiro. Mas o Senado, em sessão secreta, em 24 de setembro de 1894, negou a aprovação por falta de “notável saber”. Dez meses depois de assumir, Ribeiro deixou o cargo.
Depois de Barata Ribeiro, outras quatro indicações de Floriano Peixoto foram rejeitadas. Dois deles, sob o mesmo argumento: o general Ewerton Quadros e o diretor-geral dos Correios, Demosthenes Lobo, não tinham formação em Direito.
Já o general Galvão de Queiroz e o subprocurador da República Antônio Sève Navarro, eram formados em Direito, mas também foram recusados. Como as sessões eram secretas e as atas se perderam, nunca se soube os reais motivos das recusas.
Quem mais nomeou
Apesar de ter cinco indicações rejeitadas, Floriano Peixoto é um dos presidentes da República com maior quantidade de nomeações de ministros ao STF: 15, no total. A mesma quantidade do seu antecessor, Deodoro da Fonseca (1989-1891). Getúlio Vargas (1930-1945 e 1951-1954) foi o que mais nomeou ministros ao Supremo: 21. O único presidente que não nomeou qualquer ministro para o Supremo foi Café Filho (1954-1955).
Sem Senado
Nenhum dos 21 ministros nomeados por Vargas para a Suprema Corte passaram por aprovação prévia do Senado.
“As nomeações desses ministros processaram-se em períodos de anormalidade institucional, seja durante o Governo Provisório de Getúlio Vargas (1930-1934), seja durante a vigência da Carta Política outorgada em 10 de novembro de 1937 (Estado Novo)”, contextualiza o ex-ministro, na obra.
Os ministros Eduardo Espinola, Carvalho Mourão, Plínio Casado, Laudo de Camargo, Costa Manso, Octavio Kelly e Ataulpho de Paiva foram nomeados durante o primeiro mandato. Já Armando de Alencar, Cunha Mello, José Linhares, Washington de Oliveira, Barros Barreto, Annibal Freire, Castro Nunes, Orozimbo Nonato, Waldemar Falcão, Goulart de Oliveira e Philadelpho Azevedo durante o Estado Novo.
José Linhares (1945-1946), enquanto presidente da República por 87 dias, nomeou Lafayette de Andrada, Edgard Costa e Ribeiro da Costa como ministros da Corte.
Atualidade
Os critérios estabelecidos pelo artigo 101 da Constituição de 1988 para a nomeação de um ministro para o Supremo Tribunal Federal são de idade – entre 35 e 65 anos – e “notável saber jurídico e reputação ilibada”. A Corte possui 11 ministros.
Após a indicação do presidente da República, o indicado passa por sabatina e votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, composto por 27 parlamentares. Se receber votos favoráveis pela maioria simples do colegiado, a indicação segue para votação no plenário da Casa. Lá, o sugerido precisa obter votos favoráveis de, ao menos, 41 dos 81 senadores para ser aprovado.
Atualmente, a Suprema Corte é composta por quatro ministros nomeados pela ex-presidente Dilma Rousseff (Luiz Fux, Rosa Weber, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin), três pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Cármen Lúcia), um pelo ex-presidente Fernando Collor de Mello (Marco Aurélio Mello), um por Fernando Henrique Cardoso (Gilmar Mendes), e um por Michel Temer (Alexandre de Moraes).
A cadeira do ex-ministro Celso de Mello, escolhido por José Sarney, está vaga.
Análise
O cientista político Leon Victor Queiroz, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), que estuda o Judiciário, explica que o caso de Barata Ribeiro, rejeitado após assumir, mudou a dinâmica tomar a cadeira somente depois ser referendado pelo Senado.
Queiroz destaca que há o mito de que o ministro sugerido por determinado partido ou presidente fará tudo o que a pessoa que o nomeou desejar. Mas o PT, por exemplo, tem o maior número de indicados na Corte atual e Lula foi condenado no STF. O especialista pondera que as pessoas não querem que a Corte seja política quando vislumbram algo contra elas. “A Suprema Corte é política, sim, e não tem problema algum nisso”.
Sobre o fato de não ter ocorrido rejeições posteriormente, nestes 130 anos, Queiroz afirma que há uma agenda não exposta – de conversas e articulações de bastidores – para evitar que o escolhido passe por vexame. “O presidente indica um nome de relativo consenso”, explica. “O Senado e a coalização de governo são os filtros”, acrescenta.