Análise: em duas decisões, STF confronta procuradores da Lava Jato
No mesmo dia em que senadores conseguem assinaturas para CPI da Toga, Supremo faz movimentos que limitam atuação do Ministério Público
atualizado
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Os procuradores responsáveis pela Operação Lava Jato sofreram dupla derrota nessa quinta-feira (14/3) no Supremo Tribunal Federal (STF). No plenário, por 6 votos a 5, os ministros decidiram que cabe à Justiça Eleitoral julgar os casos de crimes comuns quando conexos a delitos relativos a eleições.
Em outro movimento, o presidente do STF, Dias Toffoli, assinou uma portaria em que pede a abertura de inquérito criminal para apurar possíveis ofensas ao tribunal e aos ministros. No despacho, não ficou clara a abrangência da investigação, mas sabe-se que estão no foco os procuradores Deltan Dallagnol e Diogo Castor.
Coordenador da Lava Jato em Curitiba (PR), Dallagnol fez duras críticas nas últimas semanas à possibilidade de o STF decidir em favor da Justiça Eleitoral no julgamento desta quinta, como de fato ocorreu. Em um vídeo, ele conclamou a população a pressionar o Supremo a decidir no sentido contrário.
Castor publicou recentemente, em um site, artigo em que classifica de “novo golpe na Lava Jato” a tendência de o STF julgar em favor da Justiça Eleitoral nos processos que envolvem crimes conexos. O texto do procurador foi lido no plenário na sessão dessa quinta-feira.
As duas decisões confrontam os interesses da Lava Jato. A atuação dos representantes do Ministério Público há muito tempo incomoda os ministros do Supremo – principalmente Gilmar Mendes. No julgamento, ao proferir voto, ele chamou os integrantes da operação de “gentalha, despreparada” e “cretinos” que usam métodos de “gangster”.
Futuro incerto
Ainda não estão claros os efeitos concretos da decisão do plenário sobre o futuro das investigações que envolvem corrupção. Dallagnol afirma que uma das consequências será a contestação de processos já julgados, o que facilitaria a impunidade de políticos.
Sobre o inquérito, pode-se dizer que, no mínimo, vai intimidar críticas ao Supremo. Toffoli afirmou que não está em jogo a liberdade de expressão. Nos termos do despacho, a investigação vai tratar de “notícias fraudulentas” e “declarações difamatórias”.
Com a portaria, o presidente do STF também quer investigar a ação da Receita Federal que identificou movimentações financeiras de Gilmar Mendes, de sua esposa, Guiomar, e da mulher de Toffoli, a advogada Roberta Rangel. A apuração da receita provocou revolta dos magistrados envolvidos.
No mesmo dia em que se impôs sobre os procuradores, o Supremo sofreu um revés no Congresso. Logo depois da assinatura da portaria, o senador Alessandro Vieira (PPS-SE) conseguiu as 27 assinaturas necessárias para abrir a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), conhecida como CPI da Toga, destinada a investigar tribunais superiores. Também no Senado, o advogado Modesto Carvalhosa apresentou um pedido de impeachment de Gilmar Mendes.
Os brasileiros, portanto, podem esperar para os próximos meses um acirramento das disputas entre poderes e instituições. Pelo que foi visto nesta quinta-feira, o STF vai atuar para desidratar o Ministério Público, ao mesmo tempo em que o Senado vai trabalhar para enquadrar o Judiciário. O futuro político e jurídico do país vai depender do resultado desses confrontos.