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Ações por assédio sexual no trabalho crescem 21% no 1º semestre de 2021

Entre janeiro de 2015 e julho de 2021 foram registrados cerca de 27,3 mil processos. Vale lembrar que muitas vítimas não procuram a Justiça

atualizado

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Igo Estrela/ Metrópoles
Assédio sexual no trabalho
1 de 1 Assédio sexual no trabalho - Foto: Igo Estrela/ Metrópoles

Mesmo em meio à pandemia de Covid-19, que fez muitas empresas adotarem o modelo de home office, o número de ações relacionadas ao assédio sexual no ambiente de trabalho cresceu. De acordo com dados do Tribunal Superior do Trabalho (TST), houve um aumento de 21% em processos do gênero no primeiro semestre de 2021, em comparação com o mesmo período do ano passado.

Segundo o levantamento, foram registradas 27.390 ações sobre assédio sexual nas Varas do Trabalho, entre janeiro de 2015 e junho de 2021. Só nos primeiros seis meses deste ano, foram abertos 1.477 processos. No ano passado, no mesmo período, foram cerca de 1,1 mil.

É necessário lembrar que, na maioria das vezes, as vítimas não procuram a Justiça, e, por isso, o número de casos de assédio sexual no trabalho deve ser ainda maior.

Os setores de comércio, serviços e indústria lideram a lista de ações e, juntos, somam 14.687 casos. Veja a lista abaixo:

  • Serviços Urbanos – 184
  • Administração Pública – 221
  • Empresas de Processamento de Dados – 275
  • Agropecuária, Extração Vegetal e Pesca – 348
  • Seguridade Social – 405
  • Educação, Cultura e Lazer – 650
  • Serviços Domésticos – 729
  • Sistema Financeiro – 790
  • Comunicações – 857
  • Transporte – 1.027
  • Turismo, Hospitalidade e Alimentação – 2.088
  • Indústria – 3.871
  • Serviços Diversos – 4.853
  • Outros – 5.129
“Você faz pole dance. Quer me provocar”

Embora seja considerado crime desde 2001, esse tipo de violência ainda é relativizado e encarado com certa normalidade no ambiente de trabalho.

Aos 20 anos, Luana Teixeira*, estudante de jornalismo, ficou até tarde no estágio. O chefe ofereceu uma carona e, pensando no perigo de esperar o transporte público sozinha à noite, aceitou. No caminho, ele desviou a rota e começou a falar que a desejava, afirmando que por ela praticar pole dance – um estilo de dança – queria provocá-lo.

“Ele começou a falar que sempre me achou muito linda, que me desejava todos os dias e que tinha tesão por mim. Tentou colocar a mão na minha coxa, mas eu me afastei e disse que queria ir para casa. Ele começou a rir e disse que eu devia estar brincando. Nas palavras dele: ‘Você faz pole dance, com certeza sabe qual é a intenção. Quer me provocar, você não é inocente, eu sei que você quer'”, relatou Luana.

A então estudante, que agora tem 24 anos e atua como jornalista, contou que tentou abrir a porta do carro, em meio às propostas dele de “vamos para o motel”, e ele finalmente disse que a levaria para casa. No meio do caminho, o namorado dela ligou e ela fingiu que ele iria buscá-lo e pediu para descer.

“Ele ficou todo assustado e abriu. Era de noite e fui correndo para a parada, rezando pra passar qualquer ônibus. Acho que demorou uns 5 minutos, ele deu a volta e ficou buzinando pra eu voltar pro carro. Graças a Deus passou um ônibus e eu entrei sem nem olhar pra onde ia. Desci numa rua próxima a minha casa e depois pedi um Uber”, lembrou.

Mas o pesadelo de Luana não tinha acabado. Segundo ela, depois do episódio, o chefe começou um boato entre os outros funcionários e estagiários de que ela usava o corpo para conseguir benefícios. “Perdi amigos, as pessoas me criticavam e por onde eu passava me maltratavam. Até a editora-chefe da emissora veio me dar conselhos de ‘como se portar como jornalista’ e ‘como não chamar atenção dos homens'”.

Ela tentou denunciar o chefe ao setor de recursos humanos da empresa, mas o responsável disse que era melhor “guardar segredo, porque a corda do estagiário é sempre a mais fraca”.

Assédio não é unicamente físico

A advogada trabalhista Daniela Silveira, do escritório Ferraz dos Passos, explica que o assédio sexual não é unicamente aquele que decorre de forma física, e, mesmo no atual momento de crise sanitária, também pode ocorrer através de constrangimento que gere dano ou sofrimento mental. “Então, mesmo estando em home office, a vítima pode sofrer o assédio através de ligações, e-mails, áudios, vídeos, presentes, cartas”, diz.

De acordo com Daniela, geralmente o assediador se utiliza do cargo para cometer o crime, tomando uma decisão favorável ou prejudicial à pessoa assediada. A especialista afirma que o primeiro passo é comunicar ao RH da empresa, mas que outras medidas podem ser tomadas para garantir maior segurança à vítima.

“Deve denunciar em sindicatos ou associações, ao [Ministério Público do Trabalho] MPT da região, à Defensoria Pública, registrar o boletim de ocorrência. Sendo a vítima mulher, o boletim poderá ser registrado na Delegacia da Mulher mais próxima, e, na falta dessa, em uma delegacia comum. Caso a vítima seja homem, o registro se dará na delegacia comum”, pontua.

“Existem várias formas para conseguir o cargo”

Quando recebeu a notícia de que tinha sido recomendada para um cargo superior ao que ocupava, Mariana Freitas ficou animada, mas não esperava o que estava por vir. O chefe marcou uma reunião e pediu para que ela levasse o histórico de vendas – trabalhava como vendedora – para mostrar a ele. A conversa, no entanto, não foi sobre resultados.

“Quando cheguei, ele já estava lá. Na hora, eu reparei que o tratamento estava diferente, pois na loja ele era 100% profissional. Fui mostrar os resultados que ele me pediu e ele não demonstrou nenhum interesse nisso. Começou a falar que existiam várias formas de conseguir o cargo e que poderia me explicar isso ’em um lugar melhor, mais íntimo’.”

“Ele disse que me pagaria uma hora por isso, se eu não quisesse fazer de graça”

Mariana, aos 20 anos, assediada pelo chefe

“Fiquei sem reação e perguntei quais eram as outras formas de conseguir o cargo, já que ele disse que existiam várias formas. Ele disse que, para mim, era somente aquela […]. A minha reação foi sair da mesa e voltar para a loja. Pensei que ele iria me demitir. Fiquei com medo, porque na época fazia faculdade e precisava do emprego para pagar [a mensalidade]”, contou.

Assim como muitas vítimas, Mariana não denunciou o caso. “Na época, não vi como assédio, eu não entendia muito bem. Porém, quando saí da empresa, consegui enxergar melhor o que tinha acontecido. Tive um certo receio em outros empregos por conta disso, mas ainda bem que não voltou a se repetir”, finalizou.

Punição

De acordo com o advogado trabalhista e sócio da Advocacia Maciel, Pedro Maciel, quando comunicada, a empresa deve imediatamente realizar uma sindicância para apurar o fato, devendo, em caso de comprovado o assédio, punir o autor, o que, dependendo da gravidade da conduta, pode ser de uma advertência até a aplicação da demissão por justa causa.

“As punições dependem desde a gravidade da conduta a uma possível reincidência do autor, podendo variar de advertências e suspensões à demissão por justa causa”, explicou.

Na esfera criminal, o assediador pode enfrentar pena de detenção de 1 a 2 anos.

(*) Nome fictício para preservar a identidade da personagem

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