Ações no STF contra prisão em 2ª instância são nova aposta de Lula
Ex-presidente espera que relator dos processos na Corte, ministro Marco Aurélio, pressione pela colocação do tema na pauta do plenário
atualizado
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Mais de dois meses após ser condenado em segunda instância a 12 anos e 1 mês de reclusão, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva iniciou, nesse sábado (7/4), a execução de sua pena. O desfecho ocorre após o esgotamento de diversas investidas da defesa do petista para impedir a prisão referente à condenação no caso do triplex no Guarujá (SP).
Pedidos apresentados ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF) restaram infrutíferos e não conseguiram suspender a execução penal. Agora, a principal esperança dos advogados de Lula não está em um processo relacionado ao ex-presidente, mas sim em questões judiciais que podem beneficiar condenados de todo o país: as Ações Diretas de Constitucionalidade (ADCs) 43 e 44. Há grande possibilidade de elas serem analisadas já nesta semana.
Após o indeferimento do habeas corpus (HC) de Lula, na última quarta-feira (4/4), por um placar de 6 votos a 5 no plenário do Supremo, o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, e mais dois criminalistas que representam diversos políticos ingressaram com novo pedido de liminar na ADC 43. Os autores requerem a suspensão das execuções penais após segunda instância. Com o indeferimento de HC pelo STF e a prisão do ex-presidente Lula, o magistrado responsável pela relatoria promete trazer questão de ordem para pedir a inclusão das ações em pauta na Corte.
“Despachei com o ministro Marco Aurélio para tentar uma liminar monocrática, e ele disse que não iria deferir o pedido sozinho. No entanto, falou que levaria como questão de ordem para o plenário do STF na sessão de quarta-feira [11]”, afirma Kakay. Ele é o encarregado da ação do PEN, apresentada em 2016, antes do imbróglio judicial de Lula.
Mérito pendente
Ao lado do ministro Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello é um dos mais ferrenhos críticos no STF da execução penal após segunda instância. Em 2016, quando o plenário da Corte aprovou, também por 6 votos a 5, a jurisprudência que permite a prisão antes do fim de todos os recursos possíveis, ele foi um dos togados do Supremo mais aversos à medida.
À época, o Supremo analisou um pedido de cautelar nas ADCs 43 e 44. Falta, portanto, a deliberação quanto ao mérito da questão. No julgamento de 2016, votaram a favor da execução penal os ministros Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Edson Fachin, Gilmar Mendes, Cármen Lúcia e o falecido Teori Zavascki, primeiro relator das ações decorrentes da Lava Jato no STF.
Já os contrários à medida, além de Marco Aurélio Mello, foram Rosa Weber, Celso de Mello, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli. De lá para cá, o ministro Alexandre de Moraes assumiu o posto e manteve a posição de Teori Zavascki. Gilmar Mendes, no entanto, mudou de posicionamento e agora é contra a prisão após condenação em segunda instância.
Com o início da execução penal do ex-presidente Lula, o tema volta à tona com toda a força, e se intensificam também as pressões internas e externas na Corte, levando à possibilidade de nova inclusão do assunto na pauta do STF. A esperança dos críticos ao entendimento já adotado é que, em nova análise, seja formada uma maioria capaz de mudar a jurisprudência atual.
Resistência
A questão de ordem de Marco Aurélio pretende forçar a inclusão das ações em pauta, contra os desejos da presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia. Ela já reiterou, em diversas ocasiões, considerar que o entendimento sobre a execução penal após segunda instância é recente, e acredita não haver justificativa para sua mudança. Por isso, resiste em colocar os processos para deliberação.
A situação também demonstra uma grande divisão entre os ministros do STF. Ao pautar o habeas corpus do ex-presidente Lula antes das ADCs 43 e 44, Cármen Lúcia recebeu críticas de colegas, que a acusaram de articular para lograr o indeferimento do pedido. Segundo eles, quando colocou um caso específico na frente de uma ação geral, a presidente teria agido para conseguir o voto da ministra Rosa Weber: apesar de ser contrária à prisão após segunda instância, a magistrada costuma ser técnica e seguir a jurisprudência da Corte.
A tese se confirmou no julgamento do HC de Lula quando, ao proferir voto contrário ao petista, Rosa Weber disse que um habeas corpus não seria a ferramenta correta para a mudança de entendimento sobre a prisão após segunda instância. Caso estivesse sob julgamento uma ação direta de constitucionalidade, declarou, seu entendimento poderia ser outro.
A questão ficou clara durante troca de argumentos na sessão que julgou o processo do ex-presidente. Durante o voto de Weber, Marco Aurélio Mello pediu a palavra e afirmou: “Ministra Rosa Weber, se a apreciação dos pedidos apresentados nas declaratórias de constitucionalidade fosse hoje, haveria maioria para deferir a liminar, ante a evolução do ministro Gilmar Mendes”.
“E nós teríamos lá efeito vinculante”, respondeu Rosa Weber, indicando entendimento de considerar necessária a mudança de jurisprudência antes da concessão de liminar a uma pessoa específica. Com a possibilidade de julgamento das ADCs 43 e 44 nesta semana, a expectativa é de que a ministra seja uma das responsáveis por formar a nova maioria.
Questão de ordem
Caso o ministro Marco Aurélio Mello realmente apresente questão de ordem na sessão da próxima quarta (11/4), o assunto pode voltar à pauta e passar pelo crivo da Corte na mesma semana. Tudo indica que ele cumprirá a palavra. Também no julgamento do HC de Lula, o magistrado disse ter se arrependido de não apresentar questão de ordem anteriormente. Afirmou ainda ter vencido “a estratégia” de Cármen Lúcia de pautar o habeas corpus do petista antes das ADCs.
Para ter sucesso, no entanto, Marco Aurélio precisará do apoio da maioria do plenário. Resta saber se pelo menos seis ministros estarão dispostos a reavaliar o caso tão rapidamente, já que a discussão sobre o HC do ex-presidente Lula, na última semana, acabou se transformando em um debate geral sobre a execução penal em segunda instância. A avaliação de alguns membros da Corte é que, mesmo favoráveis à mudança no entendimento, este não é o momento ideal para uma reapreciação do tema. Afinal, seus votos contrários ao pleito do político abriram caminho para a prisão do líder petista.
Luiz Inácio Lula da Silva se entregou à Polícia Federal nesse sábado (7) para iniciar o cumprimento de pena de 12 anos e 1 mês de reclusão, em regime inicialmente fechado. Lula foi condenado em segunda instância pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, no caso do triplex no Guarujá (SP). De acordo com a acusação, o petista recebeu propina da construtora OAS ao aceitar a reforma do imóvel. Em troca, o ex-presidente teria beneficiado a empreiteira em contratos com a Petrobras.