Juíza inicia sentença de tráfico de drogas com “A vida é loka”
A juíza Karla de Oliveira usou o poema de Sergio Vaz para abrir uma sentença em que poupou um adolescente acusado de tráfico
atualizado
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A juíza Karla Aveline de Oliveira, da 4ª Vara do Juizado da Infância e Juventude de Porto Alegre (RS), analisou o caso de um adolescente acusado de tráfico de drogas pelo Ministério Público (MP) e abriu a sentença de uma forma inusitada: com um poema de Sergio Vaz, intitulado “A vida é loka”.
O MP ofereceu representação contra o jovem, o acusando de prática de tráfico de drogas e se manifestou de maneira contrárias às decisões judiciais que afastariam a responsabilização socioeducativa, “ainda que entenda que se deva combater toda e qualquer forma de trabalho infantil”.
De acordo com o portal Migalhas, Karla de Oliveira não atendeu ao pedido do Ministério Público. Ela julgou o pedido improcedente e fez uma dissertação sobre a situação dos adolescentes na cadeia do tráfico de drogas.
A juíza relatou que, desde 1997, ano em que ingressou no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, se questiona sobre qual a sua contribuição “para a permanência das desigualdades estruturais e de que modo posso apropriar-me de conhecimentos e dar a esses a função social de transformação”.
A magistrada entende que a prática do tráfico de drogas se constitui em trabalho infantil, já que as organizações criminosas se valem de adolescente desassistidos pelo Estado, que, às vezes, encontram no tráfico a única opção para conseguir acesso a saúde e alimentação.
“Para uma parcela dos jovens que estão à margem desse sistema, sem acesso a educação de qualidade, moradia, saneamento, renda, direito ao trabalho, trabalhar para o tráfico traduz-se em uma forma (talvez a única) de sair do anonimato, desse lugar estéril para concretizar o acesso a alguns desses direitos, como trabalho, saúde e alimentação”, afirmou Karla.
Assim, a juíza julgou improcedente a representação do MP, e afastou a possibilidade de impor responsabilização socioeducativa ao trabalhador infantil.
Karla de Oliveira também oficiou a Fundação de Assistência Social e Cidadania de Porto Alegre (FASC) para que adote as providências pertinentes, a partir do “Protocolo de Gestão Intersetorial do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil”.
O caso está sob segredo de Justiça.
A seguir, leia o poema de Sergio Vaz na íntegra:
A vida é loka
Esses dias tinha um moleque na quebrada
com uma arma de quase 400 páginas na mão.
Umas minas cheirando prosa, uns acendendo poesia.
Um cara sem nike no pé indo para o trampo com o zóio vermelho de tanto ler no ônibus.
Uns tiozinho e umas tiazinha no sarau enchendo a cara de poemas. Depois saíram vomitando versos na calçada.
O tráfico de informação não para, uns estão saindo algemado aos diplomas depois de experimentarem umas pílulas de sabedoria. As famílias, coniventes, estão em êxtase.
Esses vidas mansas estão esvaziando as cadeias e desempregando os Datenas.
A Vida não é mesmo loka?