Jovem levada para França quando era bebê descobre família no Brasil
Isabella dos Santos, nascida no Brasil, foi vendida no mercado de adoções ilegais. Aos 25 anos, ela achou em São Paulo a família verdadeira
atualizado
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Isabella dos Santos, sequestrada quando era bebê em São Paulo e vendida no mercado de adoções ilegais para uma família francesa, realizou o sonho de encontrar sua família biológica. Batizada de Charlotte Merryl Cohen-Tenoudji pelos pais adotivos, ela saiu sozinha de Paris aos 25 anos para achar a família de sua mãe biológica, que foi assassinada três anos depois de seu nascimento.
“Nunca tive natais felizes com irmãos, tios, avós que pudessem me contar memórias de família. Sou muito grata por ter encontrado minha mãe e, ao mesmo tempo triste porque, quando a achei, ela já não podia estar comigo. Mas quero estreitar laços com a minha família verdadeira e resolver questões com meu pai biológico ” diz Isabella, em entrevista ao jornal O Globo.
Agora, ela usa socialmente o nome de batismo original até que seus documentos sejam oficializados.
O pai adotivo, que tem 92 anos, está doente. A mulher dele, que sofria com um transtorno de bipolaridade, morreu. Isabella foi vendida com apenas 2 meses de vida para uma família de alcoólatras que não tinham condições psicológicas nem oficiais de acolher um bebê. Ela conta que sentia medo e abandono constantes, e após abusos e agressões, seus pais perderam o poder familiar e ela foi dirigida a um abrigo público.
Depois que descobriu ser filha ilegítima e começou a perguntar sobre sua origem, a mãe adotiva dizia que a havia encontrado no lixo.
Ela pôde estudar, apesar das adversidades e, aos 34 anos, é formada em cinema e letras pela Universidade de Sorbonne e fala quatro idiomas. “Minha vida é como se fosse a junção de várias novelas. Tentaram pulverizar a minha história, dividi-la em pedacinhos, e eu tive de catar cada peça.”
Teste de DNA
Em 2018, ela se submeteu a um teste de DNA que comprovou que sua mãe era Jacira Lima dos Santos. Jacira trabalhava como empregada doméstica na casa do casal que a vendeu e a enviou para a França. O assassinato de Jacira, em 1991, aos 25 anos, nunca foi totalmente esclarecido.
Ao encontrar Lucélia, irmã mais velha, em Campinas, Isabela ouviu palavras de conforto: “Ela disse que eu fui muito amada e que o grande desejo da minha mãe era me reencontrar. Foi o melhor presente que recebi e a força decisiva para a minha reconstrução”.
Ela suspeita sobre a identidade do pai biológico mas, em razão de um processo judicial, deve manter sigilo até que os filhos do suposto pai, que foi cremado, aceitem fazer o teste de DNA.
“A minha última meta, depois de conseguir confirmar na Justiça o nome do meu pai, é ter uma nova certidão de nascimento. É uma forma de dar uma resposta às pessoas que fizeram isso comigo e esconderam meu nome verdadeiro” afirma.
Quando saiu da França, falando muito pouco a língua portuguesa, Isabella teve a ajuda de Wal Ferrão, da ONG Portal Kids. Elas investigaram os passos de um esquema de tráfico ilegal de crianças a partir do Lar das Crianças Menino Jesus, na capital de São Paulo, orfanato dirigido pelo casal italiano Franco e Guiomar Morselli. Ambos morreram em 2015 e 2020, respectivamente.
Graças às informações coletadas por Isabella, eles acabaram convocados para a CPI do Tráfico de Pessoas em 2014, mas nunca foram punidos. Atualmente, a família Morselli enfrenta um processo do Ministério Público Federal de 2015 que pede indenização por danos morais.
Segundo investigações, Morselli teria vendido Isabella por 15 mil euros. Ela foi atendida pelo próprio nome para exames num grande hospital de São Paulo, mas em outra consulta já surgiu como Charlotte. Esses documentos foram encontrados por ela aos 15 anos, revelando os segredos de seu nascimento. Além de Lucélia, ela tem um irmão mais novo e outra irmã, que também foi vendida a um casal estrangeiro, mas não foram encontrados.