Jornalistas mulheres foram as maiores vítimas de violência na internet
Levantamento da Abraji revela que as profissionais foram vítimas de mais da metade das agressões em 2020
atualizado
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Levantamento da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) mostrou que, até novembro de 2020, as jornalistas mulheres foram as maiores vítimas dos ataques por meios digitais à imprensa. De 72 registros de ataques contra a liberdade de expressão em meios digitais, 40 tiveram como alvo as mulheres – ou seja, 56,76% do total.
Quando todos os indicadores de monitoramento realizados pela Abraji são considerados, de 163 ataques contra jornalistas ou comunicadores, excluindo agressões direcionadas a um conjunto (como à imprensa ou ao veículo), 61 se dirigiram a mulheres.
Doutor em direito processual pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Irapuã Santana alerta que, além dos crimes relativos à liberdade de mulheres jornalistas, também há ataques relacionados à raça. Ou seja, além de sofrer cerceamento por ser uma mulher jornalista, adiciona-se o racismo nessa receita de violência.
Das 367 investidas gerais à classe da imprensa, direcionadas a meios de comunicação, repórteres, comunicadores e outros profissionais, 62 violações à liberdade de imprensa enquadraram mulheres, ou seja, 17% do total.
Os indicadores da pesquisa da Abraji monitoram 12 ações que podem se caracterizar como violência, de alguma maneira, aos profissionais da comunicação. As mais recorrentes estão classificadas em agressões e ataques, restrições na internet, discurso e processos judiciais.
Confira as que mais aparecem:
- Agressões e ataques – A categoria diz respeito a ataques à integridade física do jornalista e/ou amigos próximos; ataques contra a infraestrutura dos meios de comunicação ou propriedade de jornalistas; destruição ou confisco de equipamento jornalístico; deslocamento forçado; ameaças; intimidação; assédio, espionagem e intimidação contra jornalistas ou meios de comunicação.
- Restrições na internet – Compreende o encerramento arbitrário e suspensão de contas de mídia social de jornalistas; acesso ilegal a qualquer meio ou meio digital; tentativa de acesso; phishing; hacking; bloqueio seletivo de páginas da web; ataques massivos em servidores; ataques de negação de serviço; bloqueio de acesso de jornalistas a contas; roubo de identidade; abuso de aplicativo de direitos autorais; vigilância ilegal de comunicações; malware; conexão não autorizada a servidores e sistemas de rede.
- Discurso – Inclui os insultos ou desqualificação de funcionários influentes e/ou figuras públicas; campanhas de difamação sistemática. e criminalização.
- Processos judiciais – Abrangem processos cíveis e criminais; processos administrativos; prisão, multas, sanções ou medidas alternativas e pedidos de divulgação de material jornalístico origens.
Monitoramento
Assistente jurídica da Abraji, Letícia Kleim afirma que o recorte o recorte de gênero feito no monitoramento é importante porque mostra como as violações às liberdades garantidas à profissão de jornalista se somam às diversas formas de violência sofridas pelas mulheres.
“Em uma sociedade marcada pela misoginia e pelo machismo, as mulheres, assim como outros grupos vulneráveis e marginalizados, são atacadas simplesmente pelo que são. E as jornalistas mulheres, ao se colocarem em uma posição de projeção pública, se tornam alvo mais recorrentes desses insultos”, diz Kleim.
Medidas
Além do artigo V da Constituição Federal, a legislação brasileira assegura a liberdade de expressão por meio da Lei 5.250/1967, que regula a liberdade de manifestação do pensamento e de informação. Entretanto, não há na lei uma previsão para a violência contra a liberdade de expressão acrescida ao gênero.
“De fato, não existe na legislação brasileira alguma previsão específica que considere a profissão de jornalista com a condição de gênero. Entretanto, é importante deixar claro que a ausência desse dispositivo não impede que sejam punidas as pessoas que abusam da liberdade de expressão para atacar mulheres jornalistas”, alerta Irapuã Santana.
“Temos os crimes contra a honra, por exemplo que podem abarcar esse tipo de situação, sem falar na responsabilidade civil de cada um que cometa um ato ilícito”, explica o colunista.
No sábado (13/3), a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) promoveu uma campanha contra a violência contra as mulheres jornalistas na internet. Em um vídeo explicativo, a Unesco alerta: “Leia do jeito que você quiser, mas isso tem que parar”.
Confira:
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Spread the word. Stand up for women #JournalistsToo.
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— UNESCO 🏛️ #Education #Sciences #Culture 🇺🇳😷 (@UNESCO) March 13, 2021
Provas
Advogada criminalista da Kolbe Advogados Associados, Hanna Gomes explica que prints de tela, degravação de mensagens e testemunhas são as provas mais pertinentes para esses casos.
“Toda vítima de crime cibernético deve colher o máximo de provas possíveis e se encaminhar à Delegacia de Polícia mais próxima a fim de que registrar um boletim de ocorrência para a que a autoridade policial possa iniciar uma investigação e, a partir do Judiciário, requerer medidas cautelares tais como a retirada do site, mensagem ou perfil injurioso ou difamatório do ar, por exemplo”, orienta Hanna.
“No caso de crimes contra a honra (injúria, calúnia ou difamação), é necessário que a vítima apresente uma Queixa-Crime, por meio de um advogado especializado, junto com todas as provas possíveis, a fim de que haja o devido processamento e julgamento dessa conduta”, afirma Hanna. Além disso, segundo a criminalista, todas as penas para ataques virtuais podem ser somadas aos crimes de gênero.