João de Deus: indefinição ameaça força-tarefa que investigou médium
Demora na designação de promotores que cuidarão do caso em tribunais pode prejudicar organização nas audiências de instrução e no julgamento
atualizado
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Depois de registrar mais de 300 relatos de vítimas de abusos sexuais contra o médium João Teixeira de Faria, o João de Deus, a força-tarefa do Ministério Público de Goiás (MPGO) corre riscos na “dança das cadeiras” da nova gestão da instituição. A prisão do líder da Casa Dom Inácio de Loyola, em Abadiânia (GO), completa três meses neste sábado (16/3).
Aos 76 anos, João de Deus é réu quatro vezes e está detido, desde 16 de dezembro de 2018, no Núcleo de Custódia de Aparecida de Goiânia. O médium nega que tenha cometido os crimes e foi diagnosticado com quadro depressivo grave em laudo do dia 24 de fevereiro, elaborado por um psiquiatra a pedido da defesa. Desde o início, os advogados tentam, sem sucesso, conseguir que ele fique em prisão domiciliar. Do lado de fora, o ícone de Abadiânia possuía grande influência política e alto poder aquisitivo.
Dos relatos de abusos sexuais coletados pelo Ministério Público, 170 foram formalizados junto a promotores. Os casos aconteceram de 1973 a 2018. Entre as vítimas identificadas, há 15 meninas com idades entre 0 e 13 anos. Muitos dos crimes já estavam prescritos, e o MPGO pediu o arquivamento de mais de 20 casos. Há na Justiça quatro denúncias, apontando 18 vítimas no total.
Nova gestão
Pendendo ao enxugamento de cargos, o procurador-geral de Justiça de Goiás, Aylton Flávio Vechi, anunciou uma reestruturação no MPGO, uniu centros de apoio e delegou novos dirigentes. Sobre o grupo de trabalho instituído para apurar os crimes sexuais do líder espiritualista, no entanto, ele ainda não se pronunciou. A configuração da equipe da força-tarefa criada em dezembro de 2018 e sua própria existência estão indefinidas.
Caso se prolongue, a dúvida acerca dos promotores que vão seguir no caso pode prejudicar as etapas futuras. A organização e o cronograma para participação nas audiências de instrução e no julgamento, por exemplo, podem ser afetados. O Ministério Público foi questionado sobre isso, mas não respondeu até a última atualização desta reportagem.
O nome de Vechi foi escolhido pelo governador Ronaldo Caiado (DEM), a partir de uma lista tríplice, e ele tomou posse em 8 de março. Três dias depois, o novo procurador-geral de Justiça estabeleceu as mudanças na estrutura do MPGO.
O novo secretário de Segurança Pública do estado, Rodney Miranda, também colocou nomes diferentes nos postos de delegado-geral da Polícia Civil e na chefia da Delegacia Especializada em Investigações Criminais (Deic), responsável pela prisão do médium no ano passado.
Caiado, que era próximo a João de Deus e chegou a prestar homenagem de aniversário ao médium em 2015 (veja vídeo), não escondeu sua frustração com as acusações, mas preferiu evitar julgamentos na ocasião em que o caso veio à tona.
Julgamento sem previsão
Ainda não há data nem previsão para que os casos envolvendo o médium sejam julgados. A Justiça informou que mais de 200 testemunhas que não residem no estado serão ouvidas por meio de carta precatória, nos locais de residência. Por ser um caso sob sigilo, o Tribunal de Justiça do estado (TJGO) não pôde informar se essas pessoas já estão sendo acionadas. A tendência é que o trabalho demore.
João de Deus é réu quatro vezes na Justiça goiana. Três denúncias unem casos de crimes sexuais e a quarta diz respeito a posse ilegal de arma de fogo. No último caso, a mulher dele, Ana Keila Teixeira, e um dos filhos, Sandro Teixeira, também são réus.
Na terça-feira (12), desembargadores da 1ª Câmara Criminal do TJGO concederam habeas corpus em favor de João de Deus e de seu filho, Sandro Teixeira. Como tem outros dois mandados de prisão contra ele, o médium permaneceu no presídio. O filho, preso por coagir testemunhas, foi solto. A juíza Rosângela Rodrigues, da comarca de Abadiânia, vai ouvir Ana Keila no dia 4 de abril.
Lavagem de dinheiro
Há ainda uma investigação em andamento na Polícia Civil sobre suspeitas de lavagem de dinheiro. Em imóveis do líder espiritualista, foram apreendidos mais de R$ 1,6 milhão em espécie e pedras supostamente preciosas.
Segundo a PCGO, as investigações seguem normalmente e sem prejuízos, mesmo com a mudança de titulares nas delegacias especializadas. O trabalho está sob responsabilidade de duas delegadas que atuaram no caso em 2018: a titular da Delegacia de Repressão a Crimes Rurais, Karla Fernandes – que era da Deic e atuou na prisão do médium –, e Paula Meotti, titular da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher.