metropoles.com

Jericoacoara tem dono? Mulher diz que sim e quer reaver terra. Entenda

Empresária diz ser dona de 80% da vila de Jericoacoara e apresenta escritura 40 anos depois. PGE-CE busca acordo para não desalojar pessoas

atualizado

Compartilhar notícia

Google News - Metrópoles
Mohamed LOUNES/Gamma-Rapho via Getty Images
Foto colorida de rocha gigante com furo ao meio em meio a uma praia - Metrópoles
1 de 1 Foto colorida de rocha gigante com furo ao meio em meio a uma praia - Metrópoles - Foto: Mohamed LOUNES/Gamma-Rapho via Getty Images

Um dos paraísos naturais mais visitados do litoral brasileiro está envolto numa polêmica. A vila de Jericoacara, no Ceará, que atrai milhares de turistas todos os anos, seria de propriedade particular, e a real dona, uma empresária chamada Iracema Correia São Tiago, entrou com pedido em órgãos do estado para retomar, pelo menos, parte das terras.

Ela é ex-esposa de José Maria de Morais Machado, um proprietário rural que adquiriu fazendas na região de Jericoacoara há mais de 40 anos, em 1983. Iracema ficou com as propriedades, após o divórcio e morte do ex-marido, e deu entrada nos papéis para solucionar o caso, notificando, oficialmente, o governo do Ceará em julho do ano passado.

Desde então, o Instituto do Desenvolvimento Agrário do Ceará (Idace) e a Procuradoria-Geral do Estado do Ceará (PGE-CE) buscam uma solução para evitar o despejo de centenas de moradores e comerciantes que vivem na vila e investiram em negócios, na região. Eles foram regularizados, ao longo do tempo, pelo próprio estado, que se viu surpreendido, agora, com a documentação da empresária.

Iracema apresentou a escritura do terreno para comprovar a aquisição e teve a autenticidade reconhecida pelos órgãos do governo. Os documentos mostram que cerca de 80% da área da vila de Jericoacoara (73,6 hectares) ficam dentro do perímetro da propriedade dela. Trata-se da maioria absoluta do lugar, que envolve, inclusive, a parte central, mais badalada, com restaurantes, bares e pousadas.

7 imagens
1 de 7

Arte/Metrópoles
2 de 7

Arte/Metrópoles
3 de 7

Arte/Metrópoles
4 de 7

Arte/Metrópoles
5 de 7

Arte/Metrópoles
6 de 7

Arte/Metrópoles
7 de 7

Arte/Metrópoles

Sobreposição: como o estado ocupou área particular

Toda essa questão seria de fácil solução, não fosse o fato de que o próprio governo do Ceará arrecadou, em meados dos anos 1990, a área correspondente aos limites atuais da vila de Jericoacoara, incorporando-a ao patrimônio do estado. Sem saber da titularidade privada do local, o governo abriu processo administrativo para promover a regularização fundiária da região, dado o aumento do interesse turístico.

As fazendas de José Maria de Morais Machado, ex-marido de Iracema, no entanto, foram regularizadas e tituladas mais de uma década antes do procedimento instaurado pelo estado e houve, portanto, uma sobreposição de escrituras. A maior parte da vila de Jericoacoara, arrecadada pelo governo cearense, fica dentro da fazenda Junco I, pertencente à empresária.

No pedido de recuperação das terras, os advogados de Iracema destacaram um trecho do texto do procedimento instaurado pelo estado, durante o processo de “regularização fundiária” da vila de Jericoacoara, nos anos 1990. Entre as condições expressas à época, consta o seguinte: “Ficam ressalvados os imóveis de domínio particular que porventura se encontrarem localizados no perímetro da área referida”.

No entendimento dos advogados, fica claro que o estado buscou resguardar os direitos de particulares não identificados, no decorrer do processo, e a situação de Iracema enquadra-se, portanto, nessa condição. “Ficou comprovado, à vista de documentos oficiais, que, na matrícula arrecadada, havia um registro anterior de propriedade abrangendo praticamente toda a vila”, concluíram a PGE-CE e o Idace.

5 imagens
Escritura apresentada por Iracema Correia São Tiago para comprovar a existência da propriedade particular na região
Titularidade da propriedade apresentada por Iracema Correia São Tiago
Traçado em azul do perímetro da fazenda de José Maria, agora de Iracema, e a parte vermelha correspondente à vila de Jericoacoara
Outra simulação da sopreposição do perímetro da fazenda e da vila de Jericoacoara (CE)
1 de 5

José Maria de Morais Machado, ex-marido de Iracema e que adquiriu terras na região de Jericoacoara (CE) em 1983

Reprodução
2 de 5

Escritura apresentada por Iracema Correia São Tiago para comprovar a existência da propriedade particular na região

Reprodução
3 de 5

Titularidade da propriedade apresentada por Iracema Correia São Tiago

Reprodução
4 de 5

Traçado em azul do perímetro da fazenda de José Maria, agora de Iracema, e a parte vermelha correspondente à vila de Jericoacoara

Reprodução
5 de 5

Outra simulação da sopreposição do perímetro da fazenda e da vila de Jericoacoara (CE)

Reprodução

Solução, após negociação com a PGE

Diante da confirmação da autenticidade dos documentos, a PGE-CE entrou em campo para buscar um acordo com Iracema. De início, os advogados da empresária pediram o restabelecimento de 18,2 hectares, correspondentes a áreas tituladas e não tituladas, mas desocupadas no interior da vila. Após nova aferição e análises topográficas, eles reduziram o pedido para 15,1 hectares.

De acordo com o sobrinho de Iracema, o empresário do agronegócio Samuel Machado, com quem o Metrópoles conversou nessa terça-feira (29/10), a principal condição expressa por ela, ao solitar a devolução de terras, foi não atingir nenhum nativo, morador, comércio ou demais estabelecimentos que funcionam na vila.

“A vila ficaria intacta como ela é hoje. A única coisa seriam as áreas desocupadas, sem uso. Ela pediu o reconhecimento da área toda, mas reivindicou, somente, as desocupados, em torno de 4% do total, que são áreas sem uso na vila. O estado entendeu muito bem esse pedido, ela não pediu nenhuma indenização pelo erro do estado por ter arrecadado a área dela e demos andamento ao acordo extrajudicial”, diz Machado.

Quase 5 hectares devem ser devolvidos a Iracema

Ficou acordado, ao final, que Iracema terá de volta algumas parcelas de terras desocupadas, equivalentes a 4,9 hectares. Áreas com construção ou ocupadas por moradores da vila, conforme a minuta do acordo, não poderão ser alvo de ação de despejo por ordem judicial. Além disso, todas as vias e acessos locais foram preservados.

“Essas áreas, que correspondem a mais de 90% da matrícula da proprietária, permaneceriam com o Estado a fim de se dar continuidade ao processo de regularização da vila, mantendo as pessoas em suas residências e o comércio local”, informa a PGE-CE.

A tratativa, no entanto, foi interrompida após a PGE conceder um prazo de 20 dias para que moradores da vila enviem documentos que contestem as escrituras públicas de Iracema. Representantes da comunidade local estiveram em reunião com o procurador-geral no dia 16 de outubro. Até essa segunda-feira (28/10), eles não apresentaram nenhuma documentação. O prazo vence em 4 de novembro.

Quais assuntos você deseja receber?

Ícone de sino para notificações

Parece que seu browser não está permitindo notificações. Siga os passos a baixo para habilitá-las:

1.

Ícone de ajustes do navegador

Mais opções no Google Chrome

2.

Ícone de configurações

Configurações

3.

Configurações do site

4.

Ícone de sino para notificações

Notificações

5.

Ícone de alternância ligado para notificações

Os sites podem pedir para enviar notificações

metropoles.comNotícias Gerais

Você quer ficar por dentro das notícias mais importantes e receber notificações em tempo real?