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Rede de firmas fantasmas irrigou esquema que envolve assessor de Lira

Endereços que não existem, andar trancado e uma lotérica chamada Mina integram a lista. PF aponta lavagem de dinheiro

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Quem entra no elevador logo percebe que, ao contrário dos demais, o botão para o segundo piso não funciona. Pela escada também não há acesso. A porta que leva ao andar está trancada. É um pavimento fantasma no centro de Brasília. Ali perto, onde deveria haver uma empresa de serviços de informática, funciona um curso para dentistas.

“Nunca ouvi falar nessas pessoas”, diz a atendente do estabelecimento, repetindo, em linhas gerais, a resposta ouvida pela reportagem em outros 12 endereços ligados a Pedro e Juliana Salomão, presos pela Polícia Federal sob suspeita de operar, a partir da capital da República, o braço financeiro de um esquema que desviou milhões de reais do Ministério da Educação.

O casal tem relação com uma rede de 25 firmas espalhadas pelo Distrito Federal. O Metrópoles esteve em 13 delas e descobriu que só uma — o Basic Lounge Bar — funciona de acordo com as declarações prestadas à Receita Federal. As demais estão registradas em locais em que, atualmente, há outras empresas. A maioria das pessoas abordadas em cada um desses lugares está por ali há anos e desconhece a atividade das firmas do casal.

Se por um lado as empresas não existem fisicamente nos endereços, por outro as transações financeiras que elas fazem são bem reais. O movimento que o Metrópoles não encontrou nos endereços a Polícia Federal achou em transferências bancárias entre as diferentes firmas. Foi desse fluxo, dizem os investigadores, que a verba desviada de contratos para a compra de kits de robótica para escolas de Alagoas virou dinheiro vivo supostamente entregue a gente com conexões importantes no mapa do poder.

As investigações apontam para um esquema grandioso. Entre os alvos da PF está o motorista de um assessor bem próximo do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL). Como o Metrópoles mostrou nesta terça-feira em primeira mão, os policiais flagraram entregas de “pacotes” ao hoje deputado federal pelo Distrito Federal Gilvan Máximo (Republicanos) e a Laurício Monteiro Cruz, diretor de Imunização do Ministério da Saúde durante a gestão do general Eduardo Pazuello, no governo de Jair Bolsonaro.

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Em Taguatinga, letreiro indica que a sala 210, onde funcionaria a Search e Tech Pesquisas, não existe no edifício
No centro de Brasília, elevador não vai até o segundo andar. E, pela escada, uma porta tranca todo o pavimento onde deveria funcionar a Tendência e Negócios
Uma igreja funciona no endereço da Personal Motors, em Taguatinga
Imagem do escritório de contabilidade que funciona no endereço  em que estão registradas duas firmas do casal
O Basic Bar Lounge, em Águas Claras, é o único dos endereços visitados em que há uma empresa funcionando de acordo com os dados informados à Receita Federal. O estabelecimento também é investigado por lavagem de dinheiro
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Um curso de dentista funciona no endereço de uma empresa de informática do casal preso pela PF

Breno Esaki/Metrópoles
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Em Taguatinga, letreiro indica que a sala 210, onde funcionaria a Search e Tech Pesquisas, não existe no edifício

Breno Esaki/Metrópoles
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No centro de Brasília, elevador não vai até o segundo andar. E, pela escada, uma porta tranca todo o pavimento onde deveria funcionar a Tendência e Negócios

Breno Esaki/Metrópoles
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Uma igreja funciona no endereço da Personal Motors, em Taguatinga

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Imagem do escritório de contabilidade que funciona no endereço em que estão registradas duas firmas do casal

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O Basic Bar Lounge, em Águas Claras, é o único dos endereços visitados em que há uma empresa funcionando de acordo com os dados informados à Receita Federal. O estabelecimento também é investigado por lavagem de dinheiro

Breno Esaki/Metrópoles

Os investigadores sustentam que as empresas ligadas a Pedro e Juliana Salomão (veja galeria) “têm substancial e intensa participação em possível esquema de lavagem de capitais, supostamente ocultando e dissimulando bens”. Segundo a PF, a fornecedora dos kits de robótica comprados pelas prefeituras alagoanas – provavelmente de forma superfaturada –, a Megalic, repassou R$ 1,4 milhão para três empresas do casal entre 2021 e 2022.

Depois que recebiam os aportes, as empresas, que seriam de fachada, faziam repasses para uma casa lotérica de nome sugestivo: Mina. Entre setembro do ano passado e janeiro deste ano — ou seja, em apenas quatro meses — R$ 2,4 milhões transitaram entre contas da loteria e das empresas de Pedro e Juliana. Os donos da “Mina” têm outras duas loterias em Brasília.

A lotérica seria, a julgar pelas suspeitas levantadas pelos policiais, uma das jazidas de dinheiro vivo do casal, que ia rotineiramente ao estabelecimento para fazer saques. No dia 27 de dezembro de 2022, quando já estava sendo monitorado, Pedro entrou com uma bolsa vermelha na lotérica. No pedido de prisão feito pela PF à Justiça de Alagoas, os investigadores dizem que, “fazendo análise dos vídeos de chegada e saída da lotérica”, a bolsa “chega à lotérica vazia e volta da lotérica com um certo volume”.

Um relatório da investigação afirma que é “possível inferir que, provavelmente, a lotérica funciona com uma espécie de lavanderia para as quantias ilícitas movimentadas pelas empresas do casal Pedro e Juliana” — dinheiro que, depois, era repassado aos outros investigados. O horário em que ele costumava ir até a loteria também chamou a atenção. “As idas à lotérica de Pedro são sempre realizadas no fim do expediente diário”, “momento em que há um maior quantitativo de recursos em espécie no estabelecimento”. Ao que tudo indica, diz o relatório, Pedro “realiza transferências bancárias e, logo em seguida, vai buscar a quantia em espécie”.

As firmas do casal também faziam repasses entre si, mesmo sem ter atividade comprovada, num movimento supostamente destinado a limpar o rastro sujo dos recursos. A PF encontrou muitos saques dessas contas, sempre fracionados, o que amplia ainda mais as suspeitas de que se tratava de uma tentativa de burlar os mecanismos de fiscalização.

A lista de empresas ligadas ao casal da mala do esquema do MEC é eclética. No papel, as firmas declaram atuação em diversos segmentos, de informática a turismo, passando por reparação de carros, consultoria, vestuário e comunicação. Tem também casa noturna. Uma outra tem como negócio principal a venda de coxinhas.

A empresa Exclusiva Tecnologia Limitada, por exemplo, recebeu das demais firmas do casal cerca de R$ 500 mil nos primeiros quatro meses de 2022. A Exclusiva tem endereço declarado no Edifício Trindade, em Taguatinga, cidade-satélite de Brasília. Com um detalhe: ela declara funcionar na sala 202, onde há um escritório de contabilidade. No local, um funcionário disse que é frequente o movimento de pessoas procurando a Exclusiva. A resposta que ele dá é sempre a mesma: “Não sei como ajudar”.

Em nota, o escritório de advocacia que faz a defesa do casal Pedro e Juliana Salomão afirmou que “seus clientes não têm nenhum envolvimento com as supostas fraudes apontadas pela PF e estão à disposição para colaborar com os órgãos de investigação”.

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