Indígenas convocam manifestação contra marco temporal em Brasília
Pelo marco temporal, povos indígenas poderão reivindicar apenas as terras ocupadas até o dia da promulgação da Constituição de 1988
atualizado
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Indígenas de diversas etnias estão em Brasília para mobilização contra o marco temporal que deverá ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quarta-feira (7/6). A presidente da Suprema Corte, ministra Rosa Weber, se comprometeu a analisar o processo que envolve um território originário de Santa Catarina e que pode ter repercussão geral.
O marco temporal é uma tese jurídica que entende que as comunidades indígenas só poderão reivindicar a demarcação dos territórios que estavam ocupados até o dia da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988.
A mobilização das comunidades indígenas em Brasília, organizada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), é pela rejeição do marco temporal, defendida pelo setor do agronegócio. Os povos chegaram à capital federal nessa segunda-feira (5/6) e deverão permanecer acampados nas proximidades da Esplanada dos Ministérios até a manhã de quinta-feira (8/6).
Na manhã desta quarta, o acampamento indígena deverá lançar o relatório realizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) sobre o ciclo de debates promovidos pela mobilização. No início da tarde, os povos que estão em Brasília deverão realizar uma manifestação contra a tese e logo após irão acompanhar o julgamento do recurso que definirá o entendimento sobre o marco temporal no STF.
Os indígenas pretendem organizar uma marcha da Praça da Cidadania até o STF. No entanto, a Polícia Militar do Distrito Federal (DF) fechou parte do acesso à Esplanada durante parte da tarde de terça. Até o momento não se sabe se o trânsito estará livre nesta quarta.
Para Apib o marco temporal se apresenta como inconstitucional e nega a presença dos indígenas nas terras reivindicadas.
“O marco temporal nega a presença do indígena neste território e negando a presença do indígena ele nega a contribuição. O marco temporal nega as práticas que a gente teve de sobrevivência, nega a nossa ciência, nega o canto, a pintura, a culinária”, ressalta por meio de nota.
O coordenador da rede jurídica da Amazônia do Instituto Clima e Sociedade (iCS), Ciro Brito, declara que várias populações indígenas perderão o direito à demarcação de suas terras caso o marco temporal seja aprovado.
“Na prática, significa que os povos indígenas que ocuparam ou mudaram de território após essa data, não teriam direito de ter suas terras demarcadas. Isso significa, por exemplo, que nenhum dos territórios indígenas do Baixo Tapajós, no Pará, seriam demarcados. Isso inclui demandas de 14 povos indígenas”, afirma Brito.
Última manifestação
Em 25 de maio, comunidades indígenas protestaram em Brasília contra a aprovação do marco temporal no STF. O julgamento sobre o recurso estava marcado para acontecer na tarde daquele dia, mas foi remarcado.
Entenda a votação no STF
Está na pauta do STF o julgamento do do Recurso Extraordinário (RE) nº 1.017.365, que trata das demarcações de terras indígenas e teve repercussão geral reconhecida. O processo em questão analisa o caso de um território originário de Santa Catarina.
A tese do marco temporal foi utilizada pelo Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina, antiga Fundação de Amparo Tecnológico ao Meio Ambiente (Fatma), em que solicitou a reintegração de posse de uma área localizada na Reserva Biológica do Sassafrás, onde está localizada a terra indígena Ibirama LaKlãnõ, onde vivem os povos Guarani, Xokleng e Kaingang.
O STF deverá julgar o recurso apresentado pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) que questionou a decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) de 2013 que autorizou a reintegração da área ocupada pelas comunidades originárias.
Para a Funai, a aplicação do marco temporal é inconstitucional, uma vez que fere o artigo 231 da Constituição de 1988. O órgão entende que o direito de posse da terra não poderá prevalecer o que está presente na Carta Magna.
O relator do processo no Supremo é o ministro Edson Fachin, que votou contra a adoção do marco temporal para definição da ocupação das terras indígenas. Para o ministro, o direito à demarcação dos territórios originários é garantido pela Constituição e não depende de um marco temporal para isso.
Em discordância, o ministro Nunes Marques entendeu que as comunidades tradicionais só terão direito à demarcação dos territórios ocupados até a promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988.
O julgamento sobre o caso foi suspenso logo após um pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes. O magistrado pediu mais tempo para analisar o caso.
Agronegócio
Ruralistas defendem que a tese do marco temporal apresenta uma segurança jurídica para o setor do agronegócio, uma vez que as comunidades tradicionais não poderão mais reivindicar as terras ocupadas por grandes latifundiários.
A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) compartilhou uma nota em que apresenta os principais pontos a favor da adoção da tese jurídica. “O Supremo Tribunal Federal tem a oportunidade de garantir a segurança jurídica, com a resolução dos conflitos, ao equilibrar o direito de todos os cidadãos brasileiros, evitando excessos no processo de ‘autodemarcação’, que leva a tensão no campo”, destacou.