Incor não acha fábrica para produzir vacina em spray e pesquisa atrasa
Pesquisador-chefe do estudo, Jorge Kalil, afirma que imunizante formulado no Brasil poderia ser arma contra variante Ômicron do coronavírus
atualizado
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O desenvolvimento de uma vacina brasileira contra a Covid-19 formulada para ser aplicada via spray nasal está paralisado porque os responsáveis pela pesquisa não estão conseguindo encontrar fábricas para produzir o imunizante a ser inoculado em voluntários nos testes clínicos.
A vacina que está sendo pesquisada pelo Instituto do Coração (Incor) do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo tem o objetivo de bloquear a entrada do coronavírus no corpo humano por meio de um antígeno que aumenta o nível de anticorpos do tipo IgA nas mucosas.
De acordo com o pesquisador-chefe da equipe, o médico Jorge Kalil, uma vacina assim seria muito importante para combater a variante Ômicron do coronavírus, que já se tornou a que mais circula no país.
“Infectados que estão transmitindo a Ômicron muitas vezes estão assintomáticos, ficam com o vírus no sistema respiratório superior, espalhando. Uma vacina nasal resolveria isso”, afirma o professor e chefe do Laboratório de Imunologia do Incor.
Essa vacina nacional é pensada para funcionar como dose de reforço e ajudar a preencher uma lacuna no desempenho dos imunizantes utilizados atualmente, que protegem os doentes de desenvolver quadros graves de Covid, mas não tanto da infecção em si. Nos teste pré-clínicos, com animais, o imunizante produziu altos níveis de anticorpos do tipo IgA e IgG. Essa promissora pesquisa, no entanto, está paralisada.
Pelo cronograma inicial, a previsão era ter os testes clínicos concluídos até o fim de 2022, mas não há mais prazo, segundo Kalil. Os testes da fase 1, previstos para começar agora em janeiro, não começam porque falta a vacina experimental.
“Estamos com problema sério, que é a parte industrial”, relatou o médico ao Metrópoles. “Temos que produzir em ambiente industrial com as chamadas boas práticas de fabricação, e aqui no Brasil não temos isso. Não é a parte científica, que nós já desenvolvemos, mas a parte da tecnologia de produção nos falta. Quem produz são grandes laboratórios no exterior, e, no momento, eles estão trabalhando com uma sobrecarga e dando preferência, por pressão dos governos, aos projetos internos de cada país”, completa Jorge Kalil.
Além de pesquisadores da USP e do Incor, profissionais de várias outras instituições brasileiras, como da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e da Fundação Oswaldo Cruz (FioCruz), trabalharam na pesquisa. Parte do financiamento vem do governo federal, por meio do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), e o ministro Marcos Pontes chegou a visitar o Incor no ano passado para ver de perto o desenvolvimento e falar com os cientistas responsáveis (imagem em destaque).
Ao contrário de outras vacinas em desenvolvimento apoiadas pelo governo federal, a do spray nasal tem tecnologia toda nacional e a expectativa de custar menos para produzir do que o país paga pelas doses importadas. “A gente estudou a resposta imune, todo conceito da vacina foi feito aqui”, valoriza o doutor Jorge Kalil.
No momento, não falta dinheiro para continuar com os testes, mas, ainda assim, não há previsão para que a paralisação na pesquisa seja superada, porque nenhuma negociação para a busca de uma fábrica dos imunizantes a serem testados está avançando.