Imposto 0 em “comprinhas on-line” agride varejo e indústria, diz IDV
Instituto para Desenvolvimento do Comércio (IDV) defende que volte a ser aplicado 60% de imposto nas compras até US$ 50, hoje isentas
atualizado
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O dirigente do Instituto para Desenvolvimento do Comércio (IDV) e CEO da Petz, Sérgio Zimerman, diz que a isenção do imposto de importação para compras até US$ 50 (cerca de R$ 256) em sites como Shein, Shopee e AliExpress é uma “agressão” à indústria e ao varejo nacionais.
Na visão dele, as plataformas de comércio eletrônico estrangeiras têm controlado a narrativa.
“Se criou um falso debate dizendo dizendo tributar o pobre versus tributar o rico. Nós fomos jogados para um debate absolutamente falso”, afirma Zimerman em entrevista ao Metrópoles. “O que nós estamos defendendo é que haja isonomia na cobrança de impostos”.
A renúncia que o governo tem hoje com a isenção é da ordem de R$ 30 bilhões por ano.
“Não faz sentido o governo fazer uma renúncia em favor de quem não investe e não gera emprego no Brasil”. A estimativa dos grupos nacionais é que 18 milhões de postos de trabalho estejam ameaçados no país. “Não cobrar [o imposto] é destruir o nosso varejo”, afirma Zimerman.
Questão do imposto judicializada
A questão foi judicializada no começo deste ano no Supremo Tribunal Federal (STF), ainda sem conclusão. A regra vigente é a cobrança de 17% do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), de competência estadual, e isenção de imposto de importação (que era de 60%), de competência federal, para lojistas estrangeiros que seguem um programa de conformidade do governo, o Remessa Conforme.
“É uma verdadeira agressão ao varejo nacional e à indústria nacional”, prossegue o representante do varejo brasileiro. Sobre a falta de controle para as compras internacionais, ele questiona: “Precisa acontecer uma tragédia para se ter algum tipo de regulação?”. Ele argumenta que a entrada desses produtos no país não se limita às famosas “blusinhas”. Citando brinquedos infantis, produtos de maquiagem e dermatológicos, ele entende não se tratar de algo inofensivo.
Em abril, o secretário especial da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, afirmou que o Ministério da Fazenda tem se reunido com representantes do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para “chamá-los à responsabilidade”.
O secretário explicou que, por exemplo, no caso de brinquedos e cosméticos, há riscos à saúde do consumidor. Ele disse que, em função da intensificação das ações fiscalizatórias, algumas plataformas passaram a vender menos.
“Estamos atentos ao volume. Ele caiu e continua estável, mas é por conta disso que estamos acomodados. Estamos falando com as agências para dar um pouco de tranquilidade e para que avancemos”, ressaltou o secretário.
Secretário da Receita diz que caíram remessas do e-commerce ao Brasil
Fim da isenção em debate na Câmara
O IDV, que reúne grandes varejistas nacionais, apoia que o fim da isenção seja aprovado por meio de uma emenda incluída no projeto de lei (PL) que cria o Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover). De iniciativa do Poder Executivo, o texto trata de incentivos a veículos sustentáveis e o trecho que acaba com a isenção é um “jabuti” — matéria estranha ao texto principal.
O relator do PL do Mover, deputado Átila Lira (PP-PI), propôs revogar a isenção de importações via remessa postal sob a justificativa de “não gerar desequilíbrio com os produtos fabricados no Brasil, que pagam todos os impostos”.
O projeto está pronto para entrar na pauta do plenário da Câmara, e há previsão de que seja votado a partir desta terça-feira (21/5).
Sobre o local para discussão do assunto, Zimerman defende que a questão da competitividade da indústria e do varejo nacionais precisa ser resolvida o quanto antes.“Então, é absolutamente apropriado, absolutamente pertinente”, sustenta.
As varejistas estrangeiras, por sua vez, pedem que o debate seja feito no âmbito de outro projeto, o PL 2339/2022, que estabelece as regras a serem observadas pelas pessoas físicas ou jurídicas na venda dessas mercadorias estrangeiras no e-commerce.
Em meados do ano passado, o Ministério da Fazenda lançou o programa de conformidade Remessa Conforme para colocar as empresas estrangeiras, em especial as asiáticas, no radar, com análises de mercado e de impacto regulatório.
As empresas que aderiram ao programa têm isenção do imposto de importação, de caráter federal, nas remessas de pequeno valor — aquelas até US$ 50.
O varejo entende que o programa foi importante, mas agora o governo dá sinais trocados ao reduzir o controle. Portaria de fevereiro deste ano, por exemplo, alterou o programa para permitir que a empresa apresente uma autodeclaração de que possui programa de conformidade tributária e aduaneira.
Na visão de Zimerman, o governo caiu na “falsa narrativa” de que a retomada do imposto de importação significaria taxar os mais pobres. “Colou essa narrativa nas redes sociais, com a ajuda dos influencers e de políticos de oposição que utilizam para fins eleitorais esse discurso falso de que o PT, em vez de taxar ricos, está taxando pobres. Isso, naturalmente, cria um constrangimento para a classe política”, avalia.
A Shein diz que o universo de consumidores das plataformas internacionais no Brasil é de 50 milhões de pessoas (cerca de 25% da população brasileira), dos quais 90% são das classes C, D e E.
Alíquota
Ainda que o Congresso aprove o fim da isenção, a definição da alíquota é uma atribuição do Poder Executivo federal. As últimas discussões apontam para uma alíquota entre 20% e 30%. Com volume de remessas baixo antes de 2020, o comércio cross border explodiu a partir da pandemia.
Para os comerciantes e industriais nacionais, que têm ainda o apoio de sindicatos de trabalhadores, o percentual justo seria o mesmo válido até então, de 60%.
“A alíquota de 60%, que era a alíquota anterior, atenderia ao conceito de isonomia. Qualquer número diferente de 60% sempre vai gerar falta de isonomia”, defende o dirigente do IDV. “Só existem duas alíquotas possíveis: a alíquota justa, de 60%, ou qualquer outra alíquota injusta, que vai ser menos que 60% e quanto mais longe de 60% for, mais injusta será.”
Os estados discutem subir a alíquota do ICMS de 17% para 25%. “Subir o ICMS seria perfeitamente coerente com os níveis de ICMS a que praticamente todos os varejistas estão submetidos”, entende Zimerman.
Ele se defende de críticas de que a elevação do imposto levará o país a ter uma das cargas tributárias do mundo, porque em nenhum país o varejo local tem uma carga tributária da magnitude da do Brasil e o imposto sobre consumo em outros locais é mais baixo.
O projeto de lei complementar que regulamenta a reforma tributária, recém-enviado ao Congresso, prevê que as compras feitas em sites estrangeiros, como Shein e Shopee, passarão a ser tributadas pelo Imposto sobre Valor Agregado (IVA), alíquota criada pela nova proposta.
Caso o texto seja aprovado, a mudança passará a valer a partir de 2027, sem impacto imediato.
“Quando isso vai acontecer? Daqui a 10 anos? Daqui a 10 anos não tem mais varejo para normalizar. A reforma tributária é uma perspectiva de que algum dia, talvez, isso vai ser resolvido. A gente não tem esse prazo de jeito nenhum, a gente tem pressa, a gente tem urgência. A gente esperou muito já”, ressalta Zimerman.
Judicialização
Em janeiro deste ano, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) protocolaram uma ação direta de inconstitucionalidade no STF contra a isenção do imposto de importação para bens de pequeno valor destinados a pessoas físicas no Brasil.
As entidades alegam que a isenção em vigor é inconstitucional por violar princípios como o da isonomia, da livre concorrência e do desenvolvimento nacional e dizem que hoje o comércio eletrônico tem dimensões que precisam ser consideradas.
Os órgãos técnicos que se manifestaram até o momento no âmbito dessa ação, como Advocacia-Geral da União (AGU) e Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), emitiram pareceres no sentido de que o local do debate não é o Supremo.