Guerra entre Israel e Palestina provoca tensões políticas no Brasil
Embora não interfira diretamente no Brasil, o conflito é explorado por representantes de esquerda e de direita
atualizado
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O ataque do grupo extremista islâmico Hamas contra Israel, no último sábado (7/10), representa a maior ofensiva contra o território israelense em anos e estreia um novo capítulo do conflito que se arrasta há décadas. Em resposta, o premiê israelense, Benjamin Netanyahu, decidiu declarar guerra, o que fez subir a temperatura de visões políticas divergentes também em território brasileiro.
Sob presidência temporária do Brasil, o Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU) convocou uma reunião de emergência sobre o conflito, condenou a ofensiva do Hamas contra civis israelenses, mas não tomou decisões tangíveis. Oposição e governistas manifestaram, nas redes sociais, suas respectivas opiniões sobre o tema, que também impacta a comunidade israelense no Brasil.
Especialistas consultados pelo Metrópoles avaliam que, apesar de a situação no Oriente Médio não ter efeitos diretos no cenário político brasileiro, a temática é explorada por articuladores tanto de esquerda quanto de direita, como uma forma de “prestar contas” ao eleitorado.
“Há tendência de aproximação da centro-esquerda com a causa palestina, mas também sabendo que o Hamas exagerou, foi terrorista e tem que ir com calma. Lula e seu entorno sabem que não é tão simples assim, tem muitas nuances. Acho que influencia pouco o quadro interno da polarização. O político está basicamente falando para o eleitor dele”, afirmou o cientista político André Pereira César.
Além de deputados, senadores e ministros, os partidos têm se posicionado. Siglas como PSol, PCdoB e PCB, por exemplo, manifestaram seu apoio a um ato a favor da Palestina previsto para ocorrer em Brasília, nesta terça (10/10).
Por outro lado, a direita tradicional brasileira tende a concordar com os Estados Unidos e as potências europeias. O Itamaraty, por sua vez, já construiu um “histórico de não alinhamento automático e busca de argumentos que melhor atendam o interesse nacional no curto, médio e longo prazo para a soberania brasileira”, conforme explicou Vladimir Feijó, doutor em direito internacional e professor na Faculdade Arnaldo.
O analista internacional ressaltou que outros aspectos influenciam os posicionamentos, além de fatores políticos, como interesse industrial, agroindústria diversa e comércio estrangeiro.
Veja manifestações, nas redes sociais, sobre o conflito:
Lula chegou a ser cobrado pela oposição. O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), afirmou que petistas e apoiadores “não condenaram os terroristas e todas as atrocidades cometidas pelo Hamas”, e questionou: “Alguém sabe o motivo?”.
Ernesto Araújo, que era ministro das Relações Exteriores durante o governo Bolsonaro, avaliou que, “para a esquerda” e “os isentões”, os territórios devem “ficar sempre livre para os pilantras, ladrões, terroristas, mafiosos, traficantes e assassinos, seja em nome de alegadas injustiças históricas, seja em nome dos direitos humanos, seja ainda em nome dos conceitos de ‘paz’ e ‘democracia’ completamente falsificados”.
A divergência em apoiar Israel ou Palestina foi ecoada até por membros do governo Lula. Paulo Pimenta, ministro da Secretaria da Comunicação Social, destacou as vítimas palestinas, mas amenizou ao escrever que espera pela paz e por um cessar-fogo entre as nações.
Alexandre Padilha, ministro das Relações Institucionais, solidarizou-se com as vítimas civis em Israel e falou em “terrorismo”, sem citar o Hamas. Padilha também adotou tom conciliador, ao dizer que o governo Lula reconhece “a importância de ambos os territórios”.
Brasil tem “chance de ouro” em conselho da ONU
O Brasil assumiu a Presidência do Conselho de Segurança da ONU com intenção de tratar temas ambientais, mas terá uma “chance de ouro” para se solidificar como membro permanente, se souber conduzir bem o conflito entre Israel e Palestina.
Sem obter consenso no colegiado, o Brasil pautou uma reunião, mas não avançou no tema. Para o cientista político André Pereira César, ainda assim, apenas o fato de reunir os países já representa uma vitória brasileira.
“O Brasil tem uma tradição diplomática forte, e o governo Lula está muito cauteloso. Se fosse o governo Bolsonaro, eu não sei como se daria isso. Mas, sendo o governo Lula nessa anormalidade, ficou mais fácil de trabalhar a questão. É uma chance de ouro para o governo brasileiro que pleiteia um assento permanente no Conselho de Segurança.”
Feijó, analista internacional, disse que a Presidência não tem tanta influência na ONU, mas ressaltou que o Brasil possui “ótimos laços com Israel e Palestina” e uma “posição peculiar a se apresentar como potencial intermediador”.
Veja imagens do conflito:
Alinhamento a Israel
A situação palestina e israelense sob a visão brasileira ganhou uma nova perspectiva durante o governo de Jair Bolsonaro, que decidiu abandonar a posição tradicional do Itamaraty de apoio à criação de dois Estados – ou seja, a demarcação oficial de um território palestino, como defende a Organização das Nações Unidas (ONU).
Como em outros aspectos políticos, Bolsonaro seguiu um alinhamento pró-Israel, mais uma agenda “importada” dos Estados Unidos. Em um exemplo mais claro, o ex-titular do Planalto define o Hamas como um grupo terrorista, uma denominação não adotada pela ONU.
“Para que a paz reine na região, lideranças palestinas precisam abandonar o terrorismo e reconhecer o direito de Israel existir”, frisou Bolsonaro, ao se pronunciar sobre o conflito.
Lula, por outro lado, tem uma visão de mundo a favor da neutralidade, ao condenar ataques a civis – proposta do governo brasileiro também em outros conflitos bélicos, como o caso da Rússia e da Ucrânia. Ao contrário de Bolsonaro, o atual titular do Planalto defende “a existência de um Estado Palestino economicamente viável, convivendo pacificamente com Israel, dentro de fronteiras seguras para ambos os lados”.
Repatriação de brasileiros
A Força Aérea Brasileira (FAB) já enviou dois aviões para essa operação de repatriação de brasileiros que vivem em Israel. Ao todo, o governo planeja enviar seis aeronaves para buscar os mais de 1,7 mil brasileiros que pediram ajuda para sair da zona de conflito. Também serão disponibilizados médicos e psicólogos para prestar assistência aos resgatados.
A previsão é que o primeiro voo desembarque no Brasil na madrugada de quarta (11/10).