Guarda que multou desembargador: “Usar máscara é ato de amor ao próximo”
Um dos responsáveis por autuação em Santos está sem dormir, orgulhoso de sua postura e diz que não perdoa integrante do Judiciário
atualizado
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Após ser humilhado pelo desembargador Eduardo Almeida Prado Rocha de Siqueira, que se recusou a usar máscara de proteção facial em passeio público na cidade de Santos (SP) e rasgou a multa recebido pela infração, um dos guardas municipais responsáveis pela abordagem afirmou estar sem dormir e que a repercussão do caso alterou sua rotina.
“Se ele me pedisse desculpas hoje, eu não aceitaria, porque acho que não seria sincera e sim pela repercussão que teve o vídeo. Estou desde ontem sem dormir, fiquei chateado, mas me sinto orgulhoso por ter cumprido o meu papel. Não aceito desculpas”, disse o guarda Cícero Hilário, em entrevista ao G1. Ele (de azul na foto em destaque) estava com o colega Guilhermino (de camiseta branca na mesma foto) durante a abordagem ao integrante do Poder Judiciário.
Hilário contou já ter multado outras pessoas pelo não uso do equipamento que ajuda a evitar a proliferação do coronavírus. Contudo, para o servidor municipal, o caso do desembargador foi o mais grave, com mais falta de respeito.
“[O pior foi] foi ser chamado de analfabeto, quando ele perguntou se eu sabia ler e quando disse que jogaria a autuação na minha cara. A gente não espera uma atitude dessa de um senhor com a formação que ele tem. Estávamos fazendo nosso trabalho pelo bem da população. Acho que usar máscara nessa situação que vivemos é uma demonstração de amor ao próximo”, afirmou Hilário.
Investigação
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) vai apurar a conduta do desembargador no caso.
Em ofício, o corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, disse que há necessidade de se averiguar os fatos, pois o CNJ tem a competência constitucional de disciplinar casos de conduta que infringem os deveres dos magistrados estabelecidos no Código de Ética.
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) também abriu um procedimento interno para apurar a conduta do desembargador. Em nota, o órgão disse que, ao tomar conhecimento do fato, “determinou imediata instauração de procedimento de apuração dos fatos; requisitou a gravação original e ouvirá, com a máxima brevidade, os guardas civis e o magistrado.”
“O TJSP não compactua com atitudes de desrespeito às leis, regramentos administrativos ou de ofensas às pessoas. Muito pelo contrário, notadamente em momento de grave combate à pandemia instalada, segue com rigor as orientações técnicas voltadas à preservação da saúde de todos”, destaca o órgão, em nota.
Entenda o caso
Durante a abordagem, o desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) disse que não assinaria a multa e confrontou o guarda afirmando que rasgaria o papel caso ele insistisse em aplicar a sanção pela falta de uso do item de proteção.
O guarda alertou que se o desembargador jogasse a multa fora, ele seria autuado por desperdício em via pública, levando uma segunda punição. Ignorando o profissional, o homem rasgou o papel, jogou na faixa de areia da praia e foi embora em seguida.
Assista:
“Você quer que eu jogue na sua cara? Faz aí, que eu amasso e jogo na sua cara”, diz. Em seguida, Eduardo Almeida pega o celular e liga para um secretário Municipal de Segurança de Santos, Sérgio Del Bel Júnior. “Estou aqui com um analfabeto”, diz o homem, ao telefone. “Eu falei, vou ligar para ele [Del Bel] porque estou andando sem máscara. Eu estou andando nessa faixa da praia e ele está aqui fazendo uma multa. Eu expliquei e eles não conseguem entender”, reclama ao telefone.
Em vídeo, o secretário contou que o desembargador conseguiu seu telefone por meio de uma terceira pessoa. “Não tenho nenhum tipo de relação com esse senhor. Não tenho contato pessoal ou funcional”, disse.