GO: “Fui preso por não atender ao capricho de um delegado”, diz médico
Fábio Marlon foi preso no posto de saúde em Cavalcante depois de não dar prioridade de atendimento ao delegado local, que estava com Covid
atualizado
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Goiânia – Já solto e tentando compreender o que ocorreu consigo na quinta-feira (27/1), após ser preso por negar atendimento prioritário a um delegado em Cavalcante (GO), na Chapada dos Veadeiros, o médico Fábio Marlon Martins França, de 33 anos, diz que foi detido, unicamente, “por não atender ao capricho” do paciente.
Em entrevista ao Metrópoles, ele explicou que o delegado, diagnosticado com Covid-19, não se encontrava em estado grave. Nesse sentido, ele seria atendido, normalmente, após o cumprimento dos procedimentos e da fila de emergência no posto de saúde da cidade.
O delegado Alex Rodrigues, no entanto, não satisfeito com a negativa do médico, voltou ao local horas depois e deu voz de prisão ao profissional, alegando crimes como exercício ilegal da medicina, desacato, desobediência, resistência, ameaça e lesão corporal.
Em nota, a Polícia Civil de Goiás (PCGO) informou que a prisão ocorreu porque Fábio não teria registro junto ao Conselho Regional de Medicina de Goiás (Cremego). A situação, porém, foi rapidamente esclarecida. Ele atua por meio do programa federal Mais Médicos, que não exige o registro profissional para o exercício da medicina em postos de saúde.
Apesar disso, Fábio foi preso em flagrante e algemado de maneira truculenta pelo delegado, que, mesmo diagnosticado com Covid-19, estava sem máscara no momento da prisão, segundo o médico. Ele passou a noite detido e foi solto após audiência de custódia ocorrida no dia seguinte, na qual o juiz Fernando Oliveira Samuel entendeu que houve abuso de autoridade por parte do delegado.
“Ele queria me prender ilegalmente. Eles me bateram, me submeteram a prisão ilegal, qualquer iniciativa minha foi reflexa, uma legítima defesa, e qualquer um faria o mesmo na minha posição”, diz Fábio.
Veja a fala de Fábio no dia da soltura:
Covid: isolado por causa do contato com o delegado
Desde sexta-feira (28/1), após ser solto, Fábio está isolado da esposa e do filho, de apenas 6 meses de vida, em um hotel da cidade. Em decorrência do contato que teve com o delegado sem máscara, o médico decidiu se isolar para não colocar a família em risco.
Segundo a Secretaria Municipal de Saúde de Cavalcante, ele deverá passar por um exame nesta terça-feira (1º/2). “É doloroso ter sido preso e agora isolado da família, principalmente, longe do meu filho, de apenas 6 meses de idade, e da minha esposa, que precisam de mim”, lamenta ele.
Tanto a prefeitura quanto o médico pretendem entrar com ações na Justiça contra o delegado Alex Rodrigues. O jurídico da administração local já está avaliando quais medidas tomar.
“O caminho não é a omissão. Isso só permitirá que casos como este perdurem e sejam aceitos pelos órgãos. O processo será por abuso e já estamos peticionando para a corregedoria e para o MP”, conta Fábio.
Médico diz ter medo, mas voltará à ativa
A maneira como tudo ocorreu e o que ele ouviu entre a quinta e sexta-feira, quando foi solto, geraram algumas consequências e sentimentos de medo e intranquilidade no médico.
O Metrópoles perguntou se ele foi alvo de alguma ameaça. Fábio não entrou em detalhes e disse que, “por receio”, prefere aguardar o final das investigações.
“Angústia e medo resumem bem a situação. Fui orientado a não falar muito, pois estamos ainda reunindo os elementos. O que posso dizer é que a tristeza tomou conta de mim. Não me sinto tranquilo, mas estou me preparando para voltar a atender as pessoas que precisam de mim em Cavalcante”, expõe.
Ele atua na cidade desde 2016 e se formou em medicina em 2015. Na noite em que esteve preso, Fábio chegou a pensar em deixar o município, por vergonha e pelo medo de sofrer alguma retaliação. A maneira como a população se mobilizou e se colocou ao lado dele, no entanto, fizeram ele repensar e decidir ficar.
Corregedoria da PCGO investiga o caso
A Delegacia-Geral de Polícia Civil informou ter determinado o acompanhamento do caso pela Gerência de Correições e Disciplina. Acrescentou, ainda, que a Corregedoria da Polícia Civil de Goiás acompanhará o caso em toda a sua extensão.
“A PCGO reafirma seu compromisso com os cidadãos, colocando-se sempre no mesmo nível que os demais goianos e nunca corroborando com atitudes de abuso de autoridade”, explica a nota.