Gêmeas Tasha e Tracie: da quebrada paulistana à carreira ascendente no rap
Indicadas ao MTV Miaw 2021, as MCs de 26 anos, que têm o sonho de ganhar um Grammy, falam da vida na periferia do Jardim Peri
atualizado
Compartilhar notícia
São Paulo – Seria clichê dizer que as MCs Tasha e Tracie Okereke saíram do Jardim Peri, na periferia de São Paulo, para conquistar o mundo. Mas não é bem assim.
Primeiramente, porque Tracie ainda mora lá. Depois, porque as pretensões dessas irmãs gêmeas vão muito além disso. A dupla não quer se desapegar do bairro, mas carregar junto a quebrada em sua trajetória e também levar o resto do planeta para lá.
A cultura periférica dá o ritmo da batida e das letras das irmãs de 26 anos, indicadas na categoria Beat BR, do MTV Miaw 2021. Na premiação, Tasha e Tracie concorreram com nomes conhecidos da área, como BIN, Djonga, Filipe Ret, L7nnon, Lourena, MC Cabelinho e Xamã. L7nnon acabou anunciado vencedor da competição na sexta-feira (24/9).
“Com o nosso primeiro trabalho solo, conseguimos estar ao lado dos maiores. Nunca nem imaginamos que seríamos indicadas”, comemora Tasha, mencionando o álbum Diretoria, lançado neste ano em meio à pandemia. “Participar de uma categoria que não é só de iniciante é muito foda”, complementa Tracie.
O clipe das garotas da música Salve conta com mais de meio milhão de visualizações no YouTube. Na letra, mandam: “Contando os contando os contando os placo que eu hoje eu vou de pião, passei na nave a milhão, meu som em slow motion, é que a vida mudou hein, você não botou fé/ Ainda bem que eu corri né /Ainda bem que eu não te ouvi né.”
“Se você não tá na mesa, você tá no menu”
É o que elas dizem na música Flo Jo. No rap, o papo é direto. Mas ao falar da carreira artística, a conversa traz mais sutilezas. “A gente está na mesa, mas comendo de pé ainda”, diz Tracie. “Estamos no processo de fazer o que queremos”, afirma Tasha.
As MCs apostam principalmente no rap e no funk com inspiração em R&B, jazz, forró e outros estilos. “Quando definimos a nossa música, é aquela que queríamos ter ouvido quando éramos mais jovens“, conta Tracie. Tasha resume, sobre suas influências: “Tudo que é negro e periférico”.
Quebrada
“Mudamos para o Jardim Peri quando tínhamos 18, 17 anos, e fomos morar sozinhas. Ficamos só nós duas, então precisávamos de um lugar mais barato e seguro para andarmos sozinhas. Periferia é um lugar mais seguro, em geral”, relembra Tracie, que ainda mora no pedaço. Tasha escolheu migrar para a Pompéia, para ficar mais perto dos trabalhos.
Antes da pandemia, Tasha e Tracie promoviam no bairro a festa Hip Hop na Quebrada, por Expensive Shit. “Demorávamos no mínimo uma hora e meia para chegar em qualquer lugar. Então, por que não fazer o caminho inverso?”, questiona Tasha.
“Vinha todo tipo de gente. Gente que não estava acostumada a correr da polícia. Artistas foda, fotógrafo foda, contratante foda. E, no meio de tudo isso, um artista que estava começando. E aí as pessoas vão se conhecendo, as coisas vão acontecendo”, orgulha-se Tracie.
As gêmeas destacam que o baile fora do centro é importante para ampliar horizontes e abrir portas. “Tem muita gente que é apontada como vagabundo. Mas às vezes a pessoa tem vocação para uma profissão que ela nem sabe que existe ou acha que não é possível para ela”, conta Tasha.
Expensive Shit
Na periferia e sem internet em casa, as estilosas Tasha e Tracie começaram suas carreiras com o blog de moda Expensive Shit, postando conteúdo na residência de amigos. Com o projeto, tornaram-se em 2015 as primeiras brasileiras a saírem no Afropunk, portal americano do maior festival de cultura negra do mundo.
Depois, começaram a se aventurar por publicidade, consultoria, palestras e coleções para marcas. Com isso, surgiram os convites para serem DJs e, assim, a costura com a música. “A moda nos deu recursos financeiros e visibilidade”, diz Tasha.
Ao olhar para o futuro, as rappers do selo Ceia Ent priorizam a música, mas não esquecem das raízes. “A gente quer ganhar um Grammy e financiar potenciais artistas, que depois possam fazer o mesmo por alguém”, afirma Tasha. “Queremos que pessoas do Peri nos vejam e se sintam capazes também”, finaliza Tracie.