Falta de recursos ameaça sobrevivência de balé em comunidade do Rio
Instituição sem fins lucrativos chega a 10 anos em 2022; Ballet Manguinhos já promoveu cultura e a transformação social de 4 mil jovens
atualizado
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Rio de Janeiro – Há dez anos representando a resistência, a inserção e a transformação social, o Ballet Manguinhos enfrenta uma crise que pode levar ao fechamento da organização sem fins lucrativos. Para muitos da comunidade da Zona Norte do Rio, a ONG é a única forma de contato com a cultura e diversas outras oportunidades.
“O Ballet manteve minha filha de pé. Ela perdeu o avô, a Daiana [ex-presidente do Ballet] e teve o pai preso. Tudo isso, que foi muito próximo, bagunçou a cabeça da minha filha. Lá foi a forma que ela achou para expressar seus sentimentos. O Ballet salvou minha filha, deu todo o suporte para ela e eu sou muito grata”, contou Rosilene Silva, mãe da Anna Júlia, de 15 anos, uma das alunas mais antigas da instituição.
“Eles não ensinam só a dança lá, eles fazem muito pelos alunos. Minha filha teve a oportunidade de conhecer o Theatro Municipal, de conhecer a [ginasta] Rebeca Andrade, de viajar para São Paulo. Coisas que eu não teria, de jeito nenhum, como proporcionar para ela. Se fechar, vai ser uma perda enorme para a comunidade”, completou.
Sem patrocínio desde abril deste ano, a instituição, que fica na comunidade de Manguinhos luta para receber apoio financeiro. Ainda em abril, foi lançado o projeto Adote uma Bailarina, com o intuito de financiar os estudos das meninas que participam do Ballet.
O custo calculado é de R$ 90 por mês, mas de lá para cá, apenas 22 jovens foram adotadas. A escola soma mais de 400 alunos.
“Esses doadores, no entanto, não são fixos. Alguns deles são pontuais. Então, posso dizer que uns 10 deles doam todos os meses”, afirma a atual presidente da ONG, Carine Lopes, ao Metrópoles.
História
O Ballet Manguinhos foi fundado em 2012 pela bailarina, professora e coreógrafa Daiana Ferreira. No entanto, perdeu sua tutora em janeiro de 2021, quando faleceu devido a complicações da Covid-19. Desde o princípio, a instituição teve o objetivo de tirar as crianças das ruas, ensinar a cultura e tentar amenizar questões sociais.
Com o trabalho desenvolvido pela equipe, hoje, apenas 1% das meninas que participam da instituição engravidam na adolescência. Dado este que, de acordo com Carine, era historicamente o oposto antes da criação do ballet.
“As pessoas daqui querem ter acesso a coisas que são negadas a elas, os direitos mais básicos, como é o caso da cultura. As meninas – digo meninas, porque apenas 5 meninos estudam aqui, muito pelo preconceito que ainda existe – passam mais da metade do dia com a gente”, explica a presidente.
“Aqui, não temos aulas só de ballet, temos dança contemporânea e diversas outras atividades. Incentivamos a educação, falamos sobre empoderamento, ingresso em universidades. Elas se sentem pertencentes a esse lugar. E não é à toa que diversos alunos nossos ingressam em importantes faculdades públicas no Rio”, completa.
Inspiração
Para Fernanda Graciela, mãe da Vitória, de 17 anos, o Ballet tem um forte significado, já que inspirou a filha a querer seguir na dança profissionalmente. “Ela já tem idade para um jovem aprendiz, mas ela quer a dança e ela vai seguir seu sonho. Com certeza o Ballet tem parte nisso, ela está lá há 10 anos”, conta ao Metrópoles.
“Eles são muito importantes para a transformação social na comunidade. A Vitória tem várias amigas que já são mães e ela me diz que quer estudar e que só quer saber de filho mais lá para o futuro. É um ensinamento que eu tive da minha mãe e tento passar para ela. O Ballet me ajuda muito nisso. Eles fazem palestras e incentivam muito a educação”, completa.
Patrocínio e como doar
O Ballet Manguinhos tinha um patrocínio da fundação social norte-americana The Secular Society (TSS), firmado em 2018 por Daiana, mas que terminou em abril deste ano.
Desde então, outros patrocínios são buscados para a manutenção das atividades. Como o repasse de parte do imposto devido de ICMS ou ISS por empresas, através das leis de incentivo à cultura, como a Lei Rouanet.
“Dependendo, as empresas podem repassar entre 4% e 10% para um projeto social, como nosso. Em vez de pagar ao governo do estado, ela repassa esse imposto para manutenção do projeto e para que o trabalho continue sendo executado”, explica Carine.
O Adote uma Bailarina foi uma ideia para captar recursos também de pessoas físicas. “Um patrocínio fixo nos dá essa segurança e a possibilidade da gente planejar dois ou três anos de atividades. O ‘Adote’ é um novo eixo, uma nova estratégia de captação, que também está aí para nos apoiar até mesmo para manter nossos 15 funcionários, IPTU, luz e água”, assegura.
Para adotar, basta entrar no site (DOA.RE/BM), realizar um cadastro e escolher se vai apadrinhar uma, duas ou mais bailarinas. O pagamento pode ser feito por boleto bancário, PIX, cartão de crédito, entre outras formas.
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