metropoles.com

Ex-ministro da Saúde do PT, Padilha defende cloroquina: “Não é Fla-Flu”

Médico infectologista por formação, o agora deputado avalia que todos os medicamentos “promissores” devem ser testados

atualizado

Compartilhar notícia

Google News - Metrópoles
Agência Brasil/Divulgação
alexandre padilha
1 de 1 alexandre padilha - Foto: Agência Brasil/Divulgação

Ex-ministro da Saúde no governo de Dilma Rousseff (PT) e médico infectologista por formação, o agora deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) defende que sejam feitos testes com a cloroquina para tratar o novo coronavírus. No entanto, avalia que houve uma tentativa do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em capitalizar em cima do medicamento.

“Isso aqui não é Fla-Flu, isso não pode ser contra ou a favor. Eu sou favorável ao uso não só da cloroquina, mas de todos os medicamentos que podem ser alternativos à terapia. São mais de 40 medicamentos em análise, sou favorável à utilização de todos eles”, defendeu em entrevista ao Metrópoles.

O uso da cloroquina no tratamento contra a Covid-19 tem sido causa de embates no governo federal. Enquanto o presidente defende o medicamento, seus ex-ministros da Saúde (Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich) seguiam a recomendação do Conselho Federal de Medicina (CFM), que permite, mas não recomenda, seu uso. Nessa terça-feira (19/05), Bolsonaro afirmou que o ministro interino, Eduardo Pazuello, irá assinar o protocolo de uso do medicamento nesta quarta (20/05).

Na sua avaliação, a forma como Bolsonaro defende o remédio é mais um episódio do que ele chamou de “estratégia de marketing” para colocar alguns setores da população contra os outros. Em live nas redes sociais nessa terça-feira (19/05), Bolsonaro disse: “Quem é de direita toma cloroquina. Quem é de esquerda, tubaína”.

“Bolsonaro fica o tempo todo inventando operações de marketing, tentando colocar profissionais médicos contra o outro, criar um Fla-Flu em um medicamento que está, entre outros, em análise para ver se é efetivo ou não no tratamento da Covid-19”, afirmou

Se no assunto cloroquina o petista defende o medicamento, desde que testada sua eficácia, não há convergência entre a opinião do deputado e de Bolsonaro sobre a flexibilização do isolamento social. Para Padilha, os países que estão conseguindo recuperar as suas economias mais rapidamente são justamente aqueles que iniciaram o isolamento mais rápido.

Dessa forma, ele atribuiu o aumento no número casos e óbitos por Covid-19 ao discurso presidencial. Nesta terça-feira (19/05), o Brasil atingiu a triste marca de 17.981 mortes pela doença, com mais de 1.000 vítimas em apenas um dia.

“A irresponsabilidade de Bolsonaro, que tratava a Covid-19 até pouco tempo como uma ‘gripezinha’, fez com que o Brasil caminhasse no escuro em relação à real progressão no número de casos de Covid-19 em todo o país”, argumentou.

H1N1 e Covid-19

Quando era ministro da Saúde, Alexandre Padilha enfrentou uma emergência sanitária com a gripe H1N1. Segundo o deputado, apesar de tratar-se de uma doença menos grave que a Covid-19, a estratégia utilizada naquele momento ainda é válida. Ele propõe a seguinte receita: aumentar a testagem, fortalecer o papel do Sistema Único de Saúde (SUS) e seguir as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS).

4 imagens
Alexandre Padilha visita médicos do Mais Médicos
Alexandre Padilha como deputado federal
Deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP)
1 de 4

Quando era ministro, Alexandre Padilha foi um dos responsáveis pela criação do programa Mais Médicos

Reprodução/PT
2 de 4

Alexandre Padilha visita médicos do Mais Médicos

Reprodução/site oficial
3 de 4

Alexandre Padilha como deputado federal

Reprodução
4 de 4

Deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP)

Câmara dos Deputados

Confira os principais trechos da entrevista, concedida por e-mail e telefone:

Metrópoles: Na sua avaliação, a pandemia do novo coronavírus provocou uma crise no SUS ou apenas revelou um sistema de saúde já deficiente quanto às demandas da população?

Alexandre Padilha: A crise do coronavírus desafiou os sistemas de saúde de todo 0 mundo, inclusive sistemas públicos mais tradicionais e consolidados do que o SUS, como o inglês, o espanhol, e sistemas absolutamente privados e excludentes como dos EUA — que é o país com o maior número de mortes até este momento. Aqui no Brasil, a crise do coronavírus escancarou o quanto Bolsonaro não tem compromisso de fortalecer o SUS. A pandemia pega o sistema enfraquecido com a retirada dos recursos pelo congelamento da Emenda Constitucional nº 95, são R$ 22.5 bilhões retirados da saúde; com o fim do programa Mais Médicos; e no momento mais crítico, Bolsonaro faz questão de não fortalecer a saúde pública.

O senhor esteve à frente da pasta da Saúde durante o último governo da ex-presidente Dilma Rousseff. Caso ainda ocupasse a cadeira do ministério, quais seriam as medidas contra a Covid-19?

Em primeiro lugar, respeitar a ciência, respeitar as orientações da OMS e cooperar com estados, municípios e com os demais países da América do Sul. Este é o ensinamento básico e até isso Bolsonaro desrespeita. Ele não respeita a OMS, não respeita a ciência, acaba de exonerar um ministro que a única discordância que teve foi se sustentar em relação à ciência. Em segundo lugar, aproveitar ao máximo a oportunidade do orçamento de guerra para dar uma verdadeira injeção de investimento no SUS. Em um momento como este, desde o começo do ano, já era para termos investido fortemente na produção de testes, na ampliação de leitos de UTI, retomada o programa Mais Médicos, proteção dos trabalhadores da saúde, e infelizmente não é isso que o governo tem feito.

O senhor é favorável ao uso da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19? Qual sua opinião sobre a defesa do presidente Jair Bolsonaro na medicação?

Sobre a cloroquina, isso aqui não é “Fla-Flu”, isso não pode ser contra ou a favor. Eu sou favorável ao uso não só da cloroquina, mas de todos os medicamentos que podem ser alternativos à terapêutica. São mais de 40 medicamentos em análise, sou favorável à utilização de todos eles. São medicamentos que tentam atacar o vírus, que tentam reforçar a capacidade de defesa do corpo, medicamentos que tentam interromper a cascata inflamatória. O que eu sou contra é a operação de marketing do Bolsonaro. Ele não quer se justificar e responder por que faltam leitos de UTI, por  que os Mais Médicos não foi retomado, por que os trabalhadores estão sem proteção e o ministério da saúde não entregou quase nada de equipamento. Fica o tempo todo inventando operações de marketing tentando colocar profissionais médicos contra os outros.

Por que o Brasil tem dificuldade em realizar testes? Como médico, te preocupa o número de subnotificações de mortes pelo novo coronavírus?

A irresponsabilidade de Bolsonaro, que tratava a Covid-19 até pouco tempo como uma “gripezinha”, fez com que o Brasil caminhasse no escuro em relação à real progressão no número de casos de Covid-19. Só para se ter uma ideia, o Brasil está entre os 10 países com o maior número de casos de coronavírus, está entre os 5 com maior número de mortes e está abaixo dos 100 países com maior realização de testes em relação ao número de habitantes. Bolsonaro optou por deixar o Brasil no escuro. Nem metade dos recursos liberados foram utilizados até agora porque o governo está paralisado em relação ao enfrentamento do coronavírus.

A respeito da flexibilização do isolamento social, questiona-se o aumento no número de casos que podem ocorrer com a reabertura do comércio. Em contraposição, o governo federal teme um agravamento na crise econômica com o congelamento das atividades. De qual lado o senhor fica nessa discussão?

As lideranças mundiais que criaram um dilema entre salvar vidas e salvar a economia tiveram que recuar depois que as milhares de mortes paralisaram as cidades, as vidas e a própria economia. E este é o grande risco que existe no país hoje. E, mais uma vez, Bolsonaro, em vez de cuidar de salvar vidas e renda, fica estabelecendo uma disputa, gerando um dilema para a população. Bolsonaro, Trump [presidente dos EUA] e Boris Johnson [primeiro-ministro do Reino Unido] estão se caracterizando como o trio do genocídio do coronavírus. Não à toa, esses três países caminham para serem as piores situações em relação ao coronavírus nesta pandemia. Precisa priorizar a vida e a renda neste momento. Aliás, em todos os países que uniram esforços em juntar vidas e renda, morreram menos pessoas. Agora, se preparam mais rapidamente para a reabertura econômica.

Enquanto enfrentamos a pandemia, o governo federal trocou duas vezes o ministro da Saúde. O que o senhor acha dessas trocas? A crise política agrava a sanitária?

A imprensa internacional e o próprio editorial de uma das cinco principais revistas acadêmicas da área médica estabelecem Bolsonaro como o maior obstáculo para o enfrentamento da pandemia do coronavírus no nosso país. E eu não tenho dúvida nenhuma disso. Bolsonaro gera atrito internacional, desintegração entre países da América do Sul, gera disputa permanente entre governadores e prefeitos, com a imprensa, Judiciário e Congresso e gera disputa diária com sua equipe de governo, enfraquecendo todo tempo o Ministério da Saúde. O que está acontecendo é como se fosse uma equipe que estivesse fazendo uma cirurgia e troca o tempo todo o médico, troca o enfermeiro, o enfermeiro troca o técnico de enfermagem, que manda trocar o instrumentador… Ou seja, as equipes vão mudando, ficando inseguras, e nós vamos perdendo dias — e vidas. Uma pandemia como essa não dá pra perder um dia, e as trocas dos ministros fazem o Brasil perder semanas.

Defensores do governo federal têm feito protestos pedindo a reabertura do comércio, fechamento do STF, do Congresso Nacional. Neste fim de semana, manifestantes foram às ruas carregando caixões e usando máscaras de caveira. Como o senhor vê este movimento?

Esse movimento tem nome: é neofascismo. As manifestações, as atitudes, os rituais, a militarização da sua atuação, a constituição de verdadeiras milícias por todo o país, os repetidos atentados à Constituição… Não tenho dúvida nenhuma que Bolsonaro opera para criar o caos político, social, sanitário no país, para avançar nas medidas autoritárias. Se faltava algum fato para que todos que prezam pela democracia venham se unir para barrar o projeto genocida e neofascista de Bolsonaro, eu não acredito que possam faltar mais fatos. Passado o período da pandemia, do distanciamento social, instalado o caos sanitário e econômico no país, ele vai colocar um projeto autoritário de estimular milícias paramilitares para enfrentarem os movimentos sociais e os esforços dos democratas do nosso país.

Quais assuntos você deseja receber?

Ícone de sino para notificações

Parece que seu browser não está permitindo notificações. Siga os passos a baixo para habilitá-las:

1.

Ícone de ajustes do navegador

Mais opções no Google Chrome

2.

Ícone de configurações

Configurações

3.

Configurações do site

4.

Ícone de sino para notificações

Notificações

5.

Ícone de alternância ligado para notificações

Os sites podem pedir para enviar notificações

metropoles.comNotícias Gerais

Você quer ficar por dentro das notícias mais importantes e receber notificações em tempo real?