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A Câmara dos Deputados tem parlamentares de 33 religiões diferentes, conforme apurou o (M)Dados. Dos 513 deputados procurados pelo núcleo de jornalismo de dados do Metrópoles nos últimos quatro meses, 501 responderam à pergunta da reportagem. Com base nessas informações, foram realizados diversos cruzamentos para verificar a atuação dos grupos religiosos na Câmara Federal. O resultado está nesta série Poder e Fé.
A maioria dos parlamentares é católica apostólica romana. São 333 deputados pertencentes à religião, ou 66,5% do total. O percentual é similar ao existente na sociedade brasileira, de acordo com o Censo 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na pesquisa, 65% da população afirmaram ser católica.
A mesma proporção acontece quando se somam todos os evangélicos, segunda maior religião na Câmara dos Deputados, com 107 parlamentares (21,4% do total). No Censo 2010, 22,1% dos brasileiros afirmaram pertencer a uma das igrejas evangélicas existentes.
No entanto, esse equilíbrio na correlação entre a Câmara e a sociedade não se mantém ao fazer a separação dos deputados evangélicos por denominação. Nesse caso, observa-se que 55 são pentecostais e 52, neopentecostais. O censo mostra que 60% dos brasileiros evangélicos são pentecostais, mas, entre os deputados dessa religião, o número é de 51%.
Ou seja, proporcionalmente, há mais representantes de igrejas neopentecostais na Câmara do que participantes delas na sociedade brasileira. “Existe uma super-representação, especialmente da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd)”, aponta o professor de Ciência Política da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Geraldo Monteiro.
Segundo o especialista, essas igrejas fazem um trabalho específico para aumentar a participação delas na política. “A Iurd tem que eleger deputados e vereadores como forma de se proteger contra possíveis ataques de outros grupos e religiões. É uma postura muito defensiva. Eles estão ali para defender institucionalmente a sua fé e colaborar com os governos”, explica.
Conservadorismo
Professor de ciência política da Fundação Escola de Sociologia e Política (FESPSP), Aldo Fornanzieri aponta que isso não é uma situação exclusiva do Brasil. “Existe um expansionismo conservador dos evangélicos a partir dos Estados Unidos, quando, nos anos 1980, apoiaram o governo do Bush pai”, diz.
“Essa influência se espalhou para a América Latina e para o Brasil. Eles apoiam todos os líderes conservadores da América Latina. Aqui no Brasil, apoiaram o presidente Jair Bolsonaro [sem partido]. Não é um fenômeno isolado.”
Das pentecostais, o maior grupo é o da Assembleia de Deus, com 33 parlamentares. Já entre as neopentecostais, é a Igreja Universal do Reino de Deus, com 18 congressistas. Ao todo, 14 denominações de neopentecostais estão representadas, além dos 11 deputados que declaram não seguir nenhuma especificamente. Já o grupo de parlamentares pentecostais segue oito igrejas diferentes.
O Metrópoles questionou a religião dos deputados federais com o compromisso de não identificar a fé de cada um. A informação serve apenas para alimentar a base de dados, que foi cruzada com os resultados de votações na Câmara e os discursos feitos pelos parlamentares, entre outros. Foi utilizada a linguagem de programação Python tanto para obter os dados do Parlamento através de sua API quanto para levantar as informações e fazer as análises necessárias.
O resultado de todo esse trabalho pode ser lido na série Poder e Fé, do (M)Dados, que estreou no último domingo (12/01/2020). Esta é a segunda das cinco matérias jornalísticas. A primeira revelou que os deputados evangélicos são os que mais seguem a orientação do governo.
Além de apurar qual grupo é mais governista, o levantamento também buscou descobrir se a Câmara representa fielmente a população quando a questão é a religião, qual grupo é mais coeso nas votações, como os diferentes grupos religiosos se dividem nas frentes parlamentares e quais temas estão mais presentes em seus discursos.