Estado de SP multará Globo em R$ 88 mil por racismo com “cãodomblé”
Tribunal de Justiça determinou a multa; em 2013, quadro do programa Sensacionalista, do Multishow, exibiu cachorro que “recebe entidades”
atualizado
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São Paulo – O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) autorizou, neste mês, o Governo de São Paulo a multar em R$ 88 mil o Grupo Globo por racismo.
Isso porque, em 26 e 28 de outubro de 2013, foi ao ar um episódio do programa Sensacionalista, do canal Multishow, no qual um cachorro com vestimentas brancas era tratado pela comunidade como um animal especial, porque “recebe entidades” e “joga búzios”. O pet foi apelidado de “cãodomblé”.
A Coordenação de Políticas para a População Negra e Indígena (CPPNI), então, denunciou o caso à Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania. Em dezembro de 2013, o processo administrativo foi instaurado e a pasta impôs a multa à rede televisiva.
Entretanto, a Globo acionou a Justiça para reverter a multa, e conseguiu decisão favorável em outubro de 2021, na primeira instância. O Estado de São Paulo então recorreu, e o caso acabou julgado pelo TJSP em 9/2 – que autorizou a cobrança da multa.
No processo, a empresa argumentou que o conteúdo é “fictício, caricato, com propósito humorístico e pautado na liberdade de expressão”.
Já para a CPPNI, “durante todo o quadro são feitas evidentes referências às religiões de matriz africana em inequívoca abordagem jocosa e discriminatória dessas religiões que restaram, em franca e absurda atitude de menosprezo e rebaixamento, associadas a um animal”.
Em seu voto – que foi acompanhado por unanimidade na 2ª Câmara de Direito Público do tribunal –, a desembargadora Maria Fernanda De Toledo Rodovalho afirma que a multa não foge ao razoável ou ao proporcional, “visto que não se pode aceitar, sob a roupagem do exercício do humor, que a imagem das religiões de matrizes africanas, historicamente perseguidas, continue flagelada com piadas e expressões estigmatizantes”.
“Essas culturas e tradições sofrem maior descriminação. Basta lembrar, por exemplo, que em 2015, uma adolescente de 11 anos, vestida de branco, foi apedrejada no Rio de Janeiro ao retornar de uma festa no terreiro. O episódio reflete um dado objetivo de que religiões de origem africana são os principais alvos de intolerância no país”, afirmou a magistrada.
“Conclui-se que discriminação, no caso em tela, é deliberada e dirigida especificamente à identidade de um grupo étnico minoritário (candomblecistas), o que configura ato ilícito de prática discriminatória e preconceituosa de raça e de cor, com as consequências administrativas que o acompanham”, acrescentou.