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Especialistas defendem respeito às diferenças contra o bullying

Tragédia no Colégio Goyases, em Goiânia, teria sido motivada por provocações de colegas de classe de atirador

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1 de 1 atentado tiros escola goyases - Metrópoles - Foto: Michael Melo/Metrópoles

O ataque a tiros consumado por um adolescente de 14 anos nesta sexta-feira (20/10) em um colégio particular de Goiânia (GO) reacendeu o debate em torno dos possíveis impactos do bullying. O termo, derivado da palavra inglesa que designa uma pessoa brigona, passou a identificar, mundialmente, a situação em que uma criança ou adolescente se torna alvo de repetidas agressões físicas ou verbais.

Para especialistas ouvidos pela Agência Brasil, a prática é indicativa dos preconceitos e da intolerância às diferenças que permeiam o convívio social e só será superada com o engajamento de toda a sociedade.

Segundo as primeiras informações de policiais civis, o adolescente que pegou a arma da mãe, uma sargento da Polícia Militar (o pai do garoto também é oficial da corporação), e disparou contra colegas de classe, declarou ser alvo de frequentes gozações de outros alunos.

Internet
De acordo com os investigadores, o garoto pesquisou na internet por cerca de seis meses sobre armas e atentados como os ocorridos em um colégio de Columbine, nos Estados Unidos, em 1999, e em Realengo, no Rio de Janeiro, em 2011. Atingidos pelos tiros, um estudante de 13 anos e outro de 14 morreram instantaneamente. Outros quatro foram feridos e permanecem internados. A ação ocorreu no Dia Mundial de Combate ao Bullying.

Para a presidente da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional (Abrapee), Marilene Proença, professora do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP), a violência física ou psicológica, intencional e repetitiva, é capaz de fragilizar um jovem a ponto de levá-lo a extremos contra si próprio ou contra terceiros.

“Importante é não culpabilizarmos a criança, a família ou uma escola em particular, mas sim analisarmos o quanto estamos produzindo, socialmente, situações como esta”, defendeu a psicóloga. Ela sugere que houve avanços na compreensão do possível impacto e combate ao bullying ao longo da última década, como a aprovação da Lei 13.185, que institui o Programa de Combate à Intimidação Sistemática.

Preconceitos
A lei classifica a intimidação sistemática como verbal, moral, sexual, social, psicológica, física, material e/ou virtual. A norma também caracteriza que é bullying toda a forma de violência física ou psicológica recorrente, seja por meio de atos de intimidação, humilhação ou discriminação, por ataques físicos, insultos pessoais, uso de apelidos pejorativos, ameaças por quaisquer meios, grafites depreciativos, expressões preconceituosas, isolamento social consciente e premeditado ou pilhérias.

“O bullyng evidencia, através das crianças, todos os preconceitos existentes em nossa sociedade, como a intolerância às diferenças sociais, sexuais, regionais”, explicou Marilene. “Em última análise, é um reflexo dos valores difundidos por amplos setores da sociedade. São valores que acabam sendo interpretados pelas crianças, que os expressam com outras crianças, em ambientes como o escolar”, acrescentou.

Para a psicóloga, pais, pedagogos, comunicadores e outros profissionais devem estimular uma cultura de paz, na qual se valorize a tolerância e o respeito às diferenças, se quiserem contribuir para que episódios como o de sexta-feira não se repitam. “Nossa sociedade está tão intolerante que a violência passa a ser uma atitude para expressar a falta de diálogo e de acolhimento”, completou Marilene.

Adultos
De acordo com a pedagoga Cleo Fante, consultora em bullying, há muitas outras crianças em todo o país vivenciando a mesma situação que culminou na tragédia de Goiânia, seja sujeitando outras a humilhações, seja como vítimas da intimidação e violência por parte de outros jovens ou grupos.

“Felizmente, um número muito pequeno delas chegará a protagonizar tragédias como esta – o que não minimiza o sofrimento. Daí a importância de enfrentarmos o problema com seriedade. Até quando vamos fechar os olhos para esse problema de convivência? Quantos outros jovens vão ter de perder a vida até a sociedade entender a dimensão do problema?”, questiona Cleo. Ela afirma que muitos adultos tendem a minimizar a questão, mesmo que também tenham sofrido na infância.

“Nem toda pessoa tem a mesma capacidade para lidar com o bullying, que, além de causar grande sofrimento imediato,  compromete o desenvolvimento, a aprendizagem e o processo de socialização, podendo acarretar uma série de sintomas psicossomáticos já na infância, como transtornos alimentares ou de sono, entre outros problemas que, se não forem tratados, podem se agravar”, observou a especialista.

Pesar
Em nota conjunta, a Fundação Abrinq e o Instituto Sou da Paz manifestaram pesar pelo ocorrido em Goiânia. Para as duas organizações, todos os que “tiveram suas vidas transformadas”, incluindo o adolescente que disparou contra os demais jovens e todas as famílias atingidas pelo episódio, merecem cuidados. E, assim como as duas especialistas entrevistadas, destacam o papel das escolas no enfrentamento ao bullying.

“As escolas do país tem sido palco de violência. Em primeiro lugar, é fundamental que toda a comunidade escolar, professores, outros profissionais, famílias e outros serviços passem a ter ferramentas para identificar e lidar com situações de violências nas relações entre alunos e desses com os profissionais da educação antes que estas se agravem”, sustentam as organizações.

Há inúmeras formas para que a escola trate dessas questões, como formar os profissionais para mediação e manejo de conflitos, desenvolver habilidades socioemocionais, fortalecer o protagonismo juvenil nos encaminhamentos dos dilemas escolares e a apropriação da escola pela comunidade

Trecho da nota conjunta de pesar divulgada pela Fundação Abrinq e o Instituto Sou da Paz

Embora admitam que a presença de uma arma de fogo na casa de uma família de policiais era “inevitável”, as duas entidades apontam os “riscos inerentes” de facilitar o acesso da população a armas de fogo. “Infelizmente, ao conseguir acesso a uma arma, os resultados produzidos pelo ataque foram muito mais graves do que caso o adolescente não tivesse tido esse acesso e sim a outros meios de mediação do conflito com seus colegas”, pontuaram.

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