Engajada e barulhenta, oposição amargou derrotas no Congresso em 2024
Oposicionistas não conseguiram apoio político para avançar com votações caras ao grupo, como o PL da Anistia e o PL do Aborto, por exemplo
atualizado
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A oposição ao governo Lula, conhecida pelo forte engajamento nas redes sociais e por fazer barulho, amargou derrotas em 2024 no Congresso Nacional ao não conseguir apoio político para avançar com temas caros ao grupo.
Entre os projetos que eram prioridades para o ano e que não foram votados estão o Projeto de Lei (PL) da Anistia, o PL que queria proibir o aborto e equiparar a prática acima de 22 semanas ao crime de homicídio, com pena de até 20 anos, e a proposta de emenda à Constituição (PEC) para proibir o porte e a posse de todas as drogas no Brasil.
Assim como a gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) depende de votos de parlamentares do centro, conhecido como “Centrão”, a oposição também carece de apoio do segmento quando quer avançar com suas pautas. Atualmente, nenhum dos dois lados da polarização PL e PT conseguem pautar agendas sem o apoio político do centro.
A falta de sintonia da Câmara com o Senado também contribui para que a oposição não consiga votar projetos. A PEC das Drogas, por exemplo, foi aprovada pelos senadores, mas, quando chegou à Câmara, só avançou na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), comandada neste ano pela deputada bolsonarista Caroline de Toni (PL-SC).
Depois de ser aprovada pela CCJ da Câmara, a proposta não andou mais dentro da Casa. Pelo regimento, deveria seguir para uma comissão especial, o que não ocorreu. Bolsonaristas tentaram trabalhar para que o texto fosse direto ao plenário, mas também não tiveram sucesso.
Em outro episódio, um tema andou na Câmara, mas, ao chegar no Senado, o governo fechou um acordo, e um projeto que derrubava um decreto sobre armas, do presidente Lula, não foi votado. Na ocasião, a oposição concordou em esperar um novo decreto. O texto, no entanto, ainda não foi publicado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública. A previsão é de que ele saia no começo do próximo ano.
CCJ da Câmara pautada pelas demandas da oposição
A maioria das pautas caras à oposição no Congresso teve andamento na comissão comandada por De Toni. Aliada fiel do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), a parlamentar fez avançar até mesmo uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha sobre aborto.
A proposta aprovada pelos deputados do colegiado proíbe o aborto em qualquer circunstância, incluindo quando a pessoa é vítima de estupro. À época, a votação foi feita sob forte protesto. A comissão precisou ser interrompida, e o plenário, esvaziado de pessoas que não fossem do colegiado, para que a votação pudesse ser feita.
Em 2024, a CCJ virou palco para que os bolsonaristas pudessem fazer seus recortes para as redes sociais. Além disso, a comissão foi o refúgio para que pautas que não tinham chance de avançar no plenário fossem deliberadas.
Desse modo, os parlamentares de oposição podiam dizer que as “suas demandas” estavam tendo andamento, embora, depois de aprovadas pelo colegiado, as pautas fossem para a “geladeira” da Câmara.
Entre as propostas que passaram pela CCJ neste ano estão um pacote “contra a invasão de terras” e outro “anti-STF”. Os projetos contra a invasão de terra miram, principalmente, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Uma das propostas estabelece que proprietários de terra possam chamar a força policial, independente de ordem judicial, e também o aumento de pena para quem “invadir, ocupar ou permanecer de forma não autorizada em terreno ou edifício alheio, para o fim de esbulho possessório ou para reivindicar qualquer ação ou inação do Estado”.
Em outra frente, as propostas que tinham como alvo o Supremo Tribunal Federal (STF) envolvem a permissão para que o Congresso derrube decisões da Corte (a derrubada só pode ser revertida pelos ministros se o placar foi de 9 x 2) e a proibição de que decisões monocráticas dos ministros do STF e dos demais tribunais superiores suspendam atos dos presidentes da República, da Câmara e do Senado.
A única exceção para a ocorrência de decisões individuais seria durante o recesso judiciário, em casos de “grande urgência ou risco de dano irreparável”. Nessa conjuntura, depois de retomar as atividades, o colegiado teria o prazo de 30 dias para julgar a decisão.
Leia abaixo outras derrotas da oposição:
PL da Anistia
O Projeto de Lei (PL) nº 2.858/2022 prevê anistia aos envolvidos nas manifestações antidemocráticas de 8 de janeiro de 2023. Em outubro, a proposta estava pronta para ser apreciada pela CCJ da Câmara, mas, no dia em que o texto seria apreciado, o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), retirou o projeto da comissão em uma canetada.
No ofício assinado por Lira na ocasião, ficou determinado que a proposta seguiria para uma comissão especial. Na prática, a retirada do texto da CCJ e o encaminhamento para uma comissão devolveu o projeto à estaca zero.
A comissão especial nunca foi criada, e a proposta segue paralisada na Câmara. O episódio envolvendo o ataque de um homem-bomba em Brasília (DF) em novembro deixou o debate sobre anistia ainda mais em segundo plano.
Nesta reta final de 2024, a avaliação feita pela cúpula da Câmara era de que a polêmica proposta “não está enterrada”, mas terá um caminho difícil quando voltar ao debate entre os deputados. A pressão do PL, partido de Bolsonaro, para que o tema volte a ser discutido ficará para o próximo presidente da Casa.
A pauta, inclusive, foi usada como moeda de troca para o PL anunciar apoio ao deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), favorito para suceder Lira em fevereiro. Porém, além de convencer o presidente da Câmara, a sigla vai precisar buscar diminuir resistências dentro do Congresso.
PL Aborto
O Projeto de Lei (PL) nº 1.904/24, conhecido como PL do Aborto, à época em que ganhou destaque, equiparava o aborto acima de 22 semanas ao crime de homicídio, com pena de até 20 anos. A prática do aborto passaria a ser proibida inclusive por vítimas de estupro, que responderiam criminalmente caso fizessem o procedimento depois da 22ª semana.
A proposta teve a urgência aprovada no plenário da Câmara, o que libera para que o texto não precise passar por comissões e possa ser votado diretamente no plenário. O ato de aprovar a urgência era naquele momento uma sinalização do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL) à bancada evangélica.
Depois da aprovação da urgência, o caso ultrapassou o noticiário e ganhou as ruas de diferentes capitais do Brasil, trazendo desgaste para a imagem do presidente da Câmara, apesar da proposta não ser dele.
A reação negativa ao texto havia sido tão grande que o autor do PL, o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), admitiu que a proposta teria de ser modificada para diminuir as resistências.
Com a crise instalada, Lira anunciou que criaria uma “comissão representativa”, na qual o texto seria debatido. Tal comissão nunca foi criada, e o projeto ficou esquecido pelo resto do ano pelos deputados.