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Emendas, articulação falha: governo Lula tem ano difícil no Congresso

O segundo ano do governo teve atritos, problemas de articulação e pautas que deixaram de ser votadas, inclusive o Orçamento de 2025

atualizado

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Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Presidente Lula da Silva
1 de 1 Presidente Lula da Silva - Foto: Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O segundo ano do governo Lula ficou marcado por uma relação difícil com o Congresso Nacional, na qual o Executivo seguiu sem conseguir consolidar uma base de apoio. Ao longo de 2024, o Planalto teve falhas com a articulação política, atritos entre ministro e cúpula da Câmara, e emendas suspensas por decisão judicial, o que deixou o ambiente político ainda mais desafiador.

Nesta semana, um novo episódio envolvendo o pagamento das emendas tensionou ainda mais o conflito do Legislativo com o Judiciário. Outro bloqueio de emendas por parte do Supremo Tribunal Federal (STF) fez a Câmara arrastar o Executivo e o Senado para uma crise em torno do tema, em um sinal de que o atrito entre os Poderes deve persistir em 2025 (entenda mais abaixo).

Além disso, mesmo conseguindo avançar com a pauta econômica dentro do Congresso, inclusive com a aprovação do pacote de corte de gastos na reta final dos trabalhos do Legislativo, o governo não conseguiu aprovar tudo o que queria. Por exemplo, parte da regulamentação da reforma tributária e o Orçamento de 2025 não foram apreciados a tempo e vão ser analisados só no próximo ano.

Neste ano, foram muitas as reclamações dos parlamentares em relação à articulação política do governo e à falta de envolvimento de forma mais efetiva em alguns debates. A avaliação final feita por líderes é que uma reforma ministerial é inevitável para que a relação possa melhorar.

Rompimento de Lira e Padilha

Um episódio que marcou o desgaste na articulação foi o rompimento do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), com o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, responsável pela articulação política do governo.

Em abril, Lira chamou Padilha de “desafeto” e “incompetente”. O ministro reagiu compartilhando um vídeo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) o elogiando.

Desde o episódio, Lira não falou mais com Padilha e passou a articular pautas de interesse do Planalto com o líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad e o ministro da Casa Civil, Rui Costa.

Clima piorou com a MP da Desoneração da Folha

A relação mais conflituosa começou antes do rompimento de Lira com Padilha. Ainda no fim de 2023, a equipe econômica editou uma medida provisória (MP) que previa a reoneração gradual da folha de pagamento para 17 setores da economia. A edição da MP no recesso parlamentar surpreendeu o Congresso e irritou os parlamentares, até mesmo os da base.

Foi no clima já azedo que a relação do governo com o Congresso iniciou 2024. Depois de um janeiro de negociações, o governo retirou a MP e apresentou um projeto de lei (PL) sobre a desoneração. Por fim, depois de meses de discussão, a proposta de reoneração gradual da folha de pagamento para 17 setores da economia foi aprovada por deputados e senadores, mas em formato diferente daquele pretendido pelo Planalto.

Preço a pagar

Mesmo com as dificuldades, o governo fechou 2024 com pautas importantes concluídas. São exemplos a aprovação do texto principal da reforma tributária, do Programa de Mobilidade Verde e Inovação (Mover) e da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

Entretanto, houve um preço a ser pago, além das emendas parlamentares. No caso do PL do Mover, por exemplo, o Executivo teve de lidar com o ônus da inclusão da taxação aplicada às compras internacionais on-line de até US$ 50, que ficou conhecida como “taxação das blusinhas”.

O “jabuti” — termo aplicado a uma matéria estranha incluída dentro de um projeto — causou debates públicos e reprovação por parte do eleitorado, o que suscitou preocupação do Planalto sobre sua popularidade. A Câmara dos Deputados incluiu a taxação, e o texto só avançou porque o governo concordou em mantê-la na proposta.

Existe ainda outro exemplo do preço que o Executivo pagou para aprovar propostas. Na chamada pauta verde, o governo cedeu em alguns pontos para concluir a tramitação de determinados temas.

Um exemplo foi o texto que regulamenta a produção de energia eólica. Conhecido como PL das Eólicas Offshores, o projeto recebeu diferentes “jabutis”, como a contratação compulsória de térmicas a gás inflexíveis com preços aumentados, manutenção de térmicas a carvão e postergação do prazo para usinas de fontes renováveis entrarem em operação com subsídio e contratação compulsória de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs).

Durante a discussão da proposta no plenário, o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), até chegou a dizer que Lula vetaria os “jabutis” e que, mesmo que o Congresso derrubasse os vetos, o governo iria judicializar o tema. Mesmo assim, os senadores mantiveram as alterações, e o texto foi à sanção presidencial.

Emendas bloqueadas causaram atrasos

O imbróglio que se instalou entre o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF) foi outro “calcanhar de Aquiles” para a gestão de Lula em 2024. Em agosto, o ministro do STF Flávio Dino bloqueou o pagamento dos recursos, exigindo mais transparência e rastreabilidade do dinheiro público. A decisão foi chancelada pelos demais integrantes da Corte.

Nos meses seguintes, houve a campanha eleitoral, período em que emendas não podem ser pagas. Mas, depois do pleito municipal, realizado em outubro, deputados e senadores se debruçaram para aprovar um projeto fruto do acordo dos Três Poderes para dar mais transparência ao pagamento das emendas.

Depois de ser aprovado por Câmara e Senado, o texto foi sancionado na íntegra por Lula, mas Dino liberou a volta das emendas estabelecendo novas regras, o que causou “mau humor” no Congresso. A partir disso, acentuou-se a relação tensa também com o governo, já que parlamentares ameaçavam não votar pautas importantes, incluindo o pacote fiscal, sem receber emendas.

Em meio a atritos, e com sinalizações do Planalto em defesa das emendas, as principais propostas foram concluídas antes do recesso parlamentar no Congresso. Porém, o Orçamento de 2025 ficou para o próximo ano e deve continuar preocupando o Executivo nos primeiros meses, uma vez que a novela envolvendo o pagamento de emendas segue ativo.

Na segunda (23/12), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino determinou a suspensão imediata do pagamento de 5.449 indicações de emendas de comissão, o que afeta uma fatia de R$ 4,2 bilhões do orçamento da União. Além disso, Dino mandou a Polícia Federal (PF) abrir uma investigação sobre as emendas.

O magistrado considerou que o pagamento não poderia ser concretizado até que a Câmara apresente as atas das sessões das comissões permanentes. Na madrugada de sexta (27/12), a Câmara respondeu à Corte. Argumentou que cumpriu as atuais regras determinadas pela Corte e que a decisão de destinar as emendas recebeu o aval do Executivo, ou seja, do governo Lula.

No fim da manhã do mesmo dia, Dino manteve o bloqueio e pediu mais informações, elencando em quatro perguntas o que queria saber. A Câmara respondeu na noite de sexta, em tom mais político do que técnico, reforçando que as regras foram cumpridas e tiveram o aval do governo, além de acrescentar, nas palavras da defesa dos deputados, que o Senado fez a mesma coisa e não estava sendo cobrado.

No entanto, no ofício enviado pelos senadores ao governo, diferentemente da Câmara, houve a indicação de que os líderes partidários eram os padrinhos de cada uma das indicações.

Sessões do Congresso duras para o governo

De tempos em tempos, o Congresso faz sessões conjuntas de deputados e senadores. Neste ano, houve uma em especial em que o Planalto colecionou derrotas, demonstrando a fragilidade da base governista.

Em 29 de maio, deputados e senadores derrubaram um trecho do Projeto de Lei nº 2.253, de 2022, conhecido como “Lei das Saidinhas”, que autorizava a saída dos detentos dos presídios para convívio familiar.

Na mesma sessão do Congresso que derrubou o veto sobre as saídas de presos, os parlamentares também mantiveram o veto do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) à Lei de Segurança Nacional sobre o trecho que tratava da criminalização da comunicação enganosa em massa, ou seja, a divulgação de notícias falsas.

Naquela sessão, o Planalto tentou articular a derrubada do veto de Bolsonaro, mas recebeu uma derrota acachapante: 319 deputados votaram para mantê-lo.

Para 2025: necessidade de mais corpo a corpo e trocas do alto escalão

O governo Lula tem ciência de que algumas coisas vão precisar mudar para 2025. Um dos recados que o presidente tem recebido nos últimos meses é que será necessário mais “corpo a corpo” com o Congresso para melhorar a articulação política. Na prática, Lula terá que reunir mais os líderes e as cúpulas das duas Casas.

A interlocutores o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse recentemente que só o pragmatismo do petista não basta. Para o deputado alagoano, é preciso que o atual chefe do Palácio do Planalto receba os parlamentares para conversar.

Em sinalização de que está disposto a atender a este pedido do Congresso, Lula recebeu na sexta-feira (27/12) o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), favorito para suceder Lira na presidência da Câmara em fevereiro. O encontro serviu para Lula estreitar os laços com Motta e abrir um diálogo mais direto com o parlamentar.

Em outra frente, a reforma ministerial prevista para depois da troca de presidentes do Legislativo é vista como outro remédio que pode melhorar a situação do governo no Congresso.

Além de possíveis mudanças de ministros do Palácio do Planalto e da Esplanada, o governo também não descarta a troca do líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE).

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