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Em queda de braço, Senado e STF têm Marco Temporal indígena na pauta

A CCJ do Senado marcou a leitura do relatório a favor do Marco Temporal de demarcação de terras indígenas no mesmo dia de votação no STF

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Manifestação no Congresso Nacional contra políticas antiambientais - Metrópoles
1 de 1 Manifestação no Congresso Nacional contra políticas antiambientais - Metrópoles - Foto: Igo Estrela/Metrópoles

O Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF) voltam a ser personagens dentro um ringue de interesses nesta quarta-feira (20/9). A bancada ruralista tenta transformar o Marco Temporal de demarcação das terras indígenas em lei e leva o tema para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) no mesmo dia em que o Supremo Tribunal Federal (STF) aprecia o tema em Recurso Extraordinário.

Às 9h30, o senador Marcos Rogério (PL-RO) vai ler seu parecer sobre o projeto do Marco Temporal na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Relator do texto na comissão, ele vai confirmar o relatório da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) a favor do Marco Temporal, fixando a data da promulgação da Constituição Federal, de 5 de outubro de 1988, como parâmetro para verificação da existência da ocupação da terra pela comunidade indígena que solicita reconhecimento.

Em seguida, segundo apurou o Metrópoles, haverá pedido de vista (mais tempo de análise) para que o caso volte a ser analisado na CCJ quando o presidente da comissão, senador Davi Alcolumbre (União-AP) volta de viagem. Alcolumbre deu aval para o avanço da votação, mas a deliberação final deve ser feita dentro de 7 dias para que ele participe.

De acordo com o PL 2.903/2023, para que uma área seja considerada “terra indígena tradicionalmente ocupada”, será preciso comprovar que, na data de promulgação da Constituição Federal, ela vinha sendo habitada pela comunidade indígena em caráter permanente e utilizada para atividades produtivas. Também será preciso demonstrar que essas terras eram necessárias para a reprodução física e cultural dos indígenas e para a preservação dos recursos ambientais necessários ao seu bem-estar.

Horas após o parecer favorável do relator na CJJ ao Marco Temporal, o STF inicia sua sessão plenária, por volta das 14h, para apreciar a constitucionalidade do tema.

4 a 2

Na Corte Suprema, o entendimento sobre o Marco tem caminhado para ser diferente do conduzido no Congresso. Até o momento, quatro ministros – Edson Fachin (relator), Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e Luís Roberto Barroso – entendem que o direito à terra pelas comunidades indígenas independe do fato de estarem ocupando o local em 5 de outubro de 1988. Para os ministros Nunes Marques e André Mendonça, a data deve ser fixada como Marco Temporal da ocupação.

Em seu voto, o relator do caso, ressaltou que a data da promulgação da Constituição Federal não pode ser considerada como o marco temporal para a aferição dos direitos possessórios indígenas sobre a terra

Edson Fachin é relator do Recurso Extraordinário (RE) 1017365, que discute a definição do estatuto jurídico-constitucional das relações de posse das áreas de tradicional ocupação indígena e desde quando deve prevalecer essa ocupação, o chamado Marco Temporal.

Para ele, a teoria desconsidera a classificação dos direitos indígenas como fundamentais, ou seja, cláusulas pétreas que não podem ser suprimidas por emendas à Constituição. Para o ministro, a proteção constitucional aos “direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam” não depende da existência de um marco nem da configuração do esbulho renitente com conflito físico ou de controvérsia judicial persistente na data da promulgação da Constituição.

Alexandre de Moraes

O ministro Alexandre de Moraes defendeu que, prevalecendo a hipótese do marco temporal, a demarcação de terras de uma comunidade retirada à força do local antes da promulgação da Constituição seria impossível. Segundo ele, não há um modelo global de reparação aos povos originários pela ocupação de suas terras pelas nações colonizadoras, e essa é uma das questões históricas mais difíceis a serem enfrentadas no Brasil e no resto do mundo

“É uma questão que vem afetando a paz social por séculos sem que haja, até hoje, um bom e efetivo modelo a ser seguido. Nenhum país do mundo conseguiu resolver de forma plena e satisfatória esse problema”, afirmou.

Moraes apontou a necessidade de conciliar os direitos dos indígenas com os de produtores rurais que adquiriram as terras regularmente e de boa-fé. Ele propôs que, se for reconhecida a ocupação tradicional sobre terras que tenham uma cadeia de domínio legítima, os proprietários não podem ser prejudicados. Nesses casos, a União deve ser responsabilizada e pagar indenização sobre o valor total dos imóveis, e não apenas sobre as benfeitorias.

Cristiano Zanin

O ministro Cristiano Zanin também votou contra o Marco. Para ele, a Constituição de 1988 é clara ao dispor que a garantia de permanência nas terras tradicionalmente ocupadas é indispensável para a concretização dos direitos fundamentais básicos desses povos.

Zanin considera que as demarcações das terras indígenas devem ter tramitação rápida e prioritária, em razão do atraso de 30 anos do Estado brasileiro em cumprir o compromisso de concluí-las cinco anos após a Constituição de 1988.

O ministro também reconhece o direito à indenização das benfeitorias decorrentes das ocupações de terras indígenas feitas de boa-fé, mas defendeu a necessidade de também indenizar o valor da terra nua, se for comprovada a aquisição de boa-fé. Segundo ele, nesses casos, a responsabilidade civil não deve ficar restrita à União, mas também aos estados que tenham causado danos decorrentes de titulação indevida.

Luís Roberto Barroso

Luís Roberto Barroso analisou que a Constituição Federal reconhece o direito das comunidades indígenas ao usufruto da terra e, para isso, é necessário comprovar a ocupação física na data da promulgação da Constituição ou, quando a comunidade tiver sido forçada a se afastar da área, a existência de vínculo cultural, por meio de laudos antropológicos. Em relação à indenização aos compradores de boa-fé, ele considera que a responsabilidade deve ser do ente federado que emitiu o título de posse.

André Mendonça

O ministro André Mendonça é a favor do Marco Temporal. Para ele, o objetivo dos constituintes foi estabilizar a situação dos povos indígenas no momento em que a Constituição foi promulgada e, até por esse motivo, previu a conclusão das demarcações em cinco anos.

Para Mendonça, laudos antropológicos são essenciais para demonstrar a tradicionalidade da ocupação, mas devem ser elaborados por uma comissão especialmente constituída para essa finalidade, podendo ouvir especialistas de outras áreas.

Nunes Marques

O ministro Nunes Marques divergiu do relator. Para ele, a decisão do STF no julgamento do caso da Terra Indígena Raposa Serra do Sol (Petição 3388), em que foi adotado o Marco Temporal, é a solução que melhor concilia os interesses do país e os dos indígenas. Segundo ele, esse parâmetro tem sido utilizado em diversos casos, e a revisão da jurisprudência ocasionaria insegurança jurídica e retorno à situação de conflito fundiário.

Na avaliação de Nunes Marques, a Constituição de 1988 reconheceu aos indígenas, entre outros pontos, os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, mas essa proteção constitucional depende do Marco Temporal. Segundo ele, a posse tradicional não deve ser confundida com posse imemorial, sendo necessária a comprovação de que a área estava ocupada na data da promulgação da Constituição ou que tenha sido objeto de esbulho, ou seja, que os indígenas tenham sido expulsos em decorrência de conflito pela posse.

Caso concreto

O caso concreto que originou o recurso diz respeito à reintegração de posse requerida pelo Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA), de uma área localizada em parte da Reserva Biológica do Sassafrás (SC), declarada pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) como de tradicional ocupação indígena.

No recurso, a Funai contesta decisão do Tribunal Regional da 4ª Região (TRF-4), que entendeu não ter sido demonstrado que as terras seriam tradicionalmente ocupadas pelos indígenas e confirmou a sentença em que fora determinada a reintegração de posse ao órgão ambiental.

Indígenas no Congresso e no STF

Acampados em Brasília, indígenas vão estar no Senado Federal e no STF. Eles prometem acompanhar toda a votação. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) tem cobrado do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que não permita que o Projeto de Lei seja votado antes do julgamento da tese no STF.

“Esse projeto está sendo analisado de forma atropelada. Os direitos dos povos indígenas estão sendo violados e não estamos sendo escutados. O parlamento não está ouvindo a opinião pública o que beneficia apenas os interesses do agronegócio”, afirmou Dinamam Tuxá coordenador executivo da Apib.

Segundo a Apib, políticos brasileiros, representantes no Congresso Nacional e no Executivo, têm 96 mil hectares de terras sobrepostas às terras indígenas.

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Povos indígenas protestam contra o Marco Temporal
STF e comissão do Senado vão tratar do tema no mesmo dia
Indígenas na porta do STF durante julgamento do Marco Temportal
Indígenas acompanharão a votação no STF
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Manifestação contra o Marco Temporal dos territórios indígenas

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Povos indígenas protestam contra o Marco Temporal

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STF e comissão do Senado vão tratar do tema no mesmo dia

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Indígenas acompanharão a votação no STF

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