Em gravação, padre Robson afirma: “Sou o chefe da quadrilha”
Figura pop da Igreja Católica é alvo de investigação por corrupção ativa. Áudios mostram participação dele em esquema para burlar contratos
atualizado
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Goiânia – Ex-reitor do Santuário Basílica de Trindade (GO) e investigado por supostos desvios de dinheiro proveniente da doação de fiéis, o padre Robson de Oliveira Pereira, de 47 anos, admitiu, em áudio, que participava de esquema para burlar contratos e sabia do risco de ser preso pela polícia. “Sou o chefe da quadrilha”, diz ele, em um trecho.
A gravação, registrada pelo próprio padre Robson durante reunião com advogados, foi divulgada pelo Jornal da Record, na quarta-feira (24/11). O Ministério Público do Estado de Goiás (MPGO) apreendeu o material.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) ainda analisa novo pedido de prisão preventiva contra o religioso e mais quatro pessoas, por corrupção ativa. A solicitação foi apresentada pela Polícia Federal (PF) na última quarta-feira (17/11), seis meses depois de a Corte ter suspendido uma investigação criminal contra o padre.
Durante a reunião, conforme mostrou a reportagem, o padre e a equipe jurídica discutem estratégias para tentar camuflar a ilegalidade de contratos de compras feitas em nome de terceiros pela Associação Filhos do Pai Eterno (Afipe), presidida pelo religioso até ele ser afastado da instituição, após o MPGO deflagrar a Operação Vendilhões, em agosto de 2020.
“Isso não é bom”
No encontro, padre Robson e sua equipe reconhecem que, futuramente, os contratos poderiam ser alvo de investigação, inclusive porque poderia haver dificuldades para explicar a relação da associação com negócios e investimentos imobiliários.
Advogada (nome não divulgado): Da representação nos negócios de investimentos na área imobiliária. Isso é muito ruim.
Advogado Klaus Marques: Quer dizer, eu estou assumindo que eles eram seus representantes nos negócios e investimentos na área imobiliária.
Advogada: e rádios.
Padre Robson: Isso não é bom.
Advogada: De jeito nenhum. Isso é a pior coisa que o senhor pode fazer.
Alessandra (funcionária da Afipe): Isso aqui é péssimo também. Investimentos na área imobiliária, tendo em vista tudo que, de fato, todo mundo sabe que eles fizeram, foi o quê? Um roubo, né?
Padre Robson: O povo tem essa ideia, né? (…)
Alessandra: Está oficializando, está oficializando.
Padre Robson: (…) Eu estou dando legitimidade para uma coisa ilegítima, porque eu considero que foi estelionato aquilo lá. Os caras lá já falavam: olha, você vai passar, por fora, para mim, tanto. Eu, de bobão… complicado isso aqui. Não está bom, não. Isso aqui é a mesma coisa de estar assinando um mandado de prisão.
“Problema sério”
A conversa também mostra que o religioso já suspeitava de ser alvo de uma operação policial e que ele poderia ir parar na prisão.
Padre Robson: Ô, gente. Lá no inquérito policial, basta eu apresentar um contrato de parceria contratual.
Klaus Marques: padre, assim, eu vou pedir desculpas, mas é [sic] ilógico umas coisas aqui.
Padre Robson: Ô, gente. O meu medo nessas coisas aí chama-se… apuração dos fatos. Quando for apurar fatos, olhando nossa contabilidade, olhando nossa contabilidade do Júnior, do Gleison, vão ver que eles deram outra destinação aos valores, que não bate com datas e nem com nenhum tipo de… não tem jeito, gente.
Klaus Marques: Isso aqui é até perigoso ficar num computador.
Padre Robson: Eu estou dizendo é o seguinte. Eu não posso ter isso aqui no meu computador. Eu troco a placa desse “trem” aqui loguinho.
Klaus Marques: Se apreende esse computador… Olha esse tanto de contrato feito, mas não assinado.
Padre Robson: Contrato feito e tudo mais, né, gente? Eu estou enfiando a Afipe em um problema sério.
“Chefe da quadrilha”
A reunião durou quase uma hora, segundo a reportagem. Durante o encontro, uma das pessoas diz ter lido o resultado da possível investigação.
Funcionária da Afipe: Vai prender o senhor.
Em outro momento, padre Robson admite que seria o “chefe da quadrilha” e demonstra medo de ser preso.
Padre Robson: Deixa um delegado meio doido começar a fazer pergunta pesada. Aí, gente, eu vou falar para vocês uma coisa. Isso aí é crime organizado.
Klaus Marques: É crime organizado, e o senhor é o chefe.
Padre Robson: E eu sou o chefe da quadrilha.
Na época, o padre estava sendo investigado por suposto desvio de dinheiro proveniente da doação de fiéis, as quantias eram entregues à Afipe. A entidade, até então presidida pelo padre, era responsável por administrar cerca de R$ 2 bilhões recebidos para a construção do novo Santuário Basílica de Trindade, segundo o MPGO.
No entanto, o dinheiro foi usado para possíveis aplicações financeiras, além de compras de fazenda e imóveis de luxo. Apesar da investigação, o STJ manteve trancados, em maio, o inquérito policial e a ação criminal contra o padre.
Na decisão, o ministro Olindo Menezes entendeu que o compartilhamento de dados do religioso foi ilegalmente utilizado pelo MPGO para iniciar a operação. O mesmo entendimento teve o TJGO.
Respostas
O advogado Klaus Marques disse que desconhece os fatos e afirmou que a Afipe foi pautada pela legalidade, ressaltando que agiu conforme o que estabelece o Estatuto da Advocacia
A Afipe informou que nenhuma pessoa mostrada na reportagem tem qualquer relação com a associação.
Sobre o novo pedido de prisão preventiva contra padre Robson, o advogado Cleber Lopes confirmou ao Metrópoles que ainda não há decisão sobre a solicitação feita pela PF.
O STJ informou ao portal que “não divulga informações sobre ações originárias em segredo de Justiça, as quais estão sob o comando dos respectivos relatores, sob pena de prejuízo ao andamento das investigações”.