Em caso sobre Marielle e Google, STF julga alcance de quebra de sigilo
STF analisa possibilidade do fornecimento de dados de indeterminadas pessoas em curso de ação penal. Google recorre de decisão do STJ
atualizado
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O Supremo Tribunal Federal (STF) volta a analisar nesta quarta-feira (14/10) caso que dirá se é legal, em procedimentos penais, a quebra de sigilo de dados telemáticos de um conjunto não identificado de pessoas. A análise ocorre dentro de recurso do Google contra a quebra de sigilo de um grupo indeterminado de pessoas que buscou informações sobre a vereadora Marielle Franco antes de seu assassinaro, em 2018.
O tema é debatido no Recurso Extraordinário (RE) 1301250, que teve repercussão geral reconhecida (Tema 1.148). Isso significa que a decisão valerá para casos semelhantes em outras instâncias. O primeiro voto na sessão será do ministro Alexandre de Moraes, que devolve um pedido de vista.
O recurso do Google foi interposto contra decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que restabeleceu a quebra de sigilo de todos que fizeram pesquisas relacionadas à vereadora do Rio de Janeiro (RJ) e sua agenda nos quatro dias anteriores ao atentado em que ela e o motorista Anderson Gomes foram assassinados, em 14 de março de 2018.
A decisão do STJ determinou a identificação dos IPs (protocolos de acesso à internet) ou “Device Ids” (identificação do aparelho) que tenham acessado o mecanismo de busca usando parâmetros de pesquisa como ‘”Marielle Franco”; “vereadora Marielle”; “agenda vereadora Marielle; “Casa das Pretas”; “Rua dos Inválidos, 122” ou “Rua dos Inválidos”.
Fundamentada
O STJ considerou a ordem judicial devidamente fundamentada para direcionar-se à obtenção de registros relacionados à identificação de aparelhos usados por pessoas que, de alguma forma, possam ter algum ponto em comum com os fatos objeto de investigação pelos crimes de homicídio.
Pelo que prevê a decisão, não há necessidade de que, na quebra do sigilo de dados armazenados, a autoridade judiciária indique previamente as pessoas que estão sendo investigadas.
Para o STJ, a medida não é desproporcional, pois a ordem judicial delimita os parâmetros de pesquisa em determinada região e período de tempo.
“Intrusão inconstitucional”
O Google recorreu ao STF com o argumento de que “varreduras generalizadas em históricos de pesquisa de usuários e o fornecimento de listas temáticas dos que pesquisaram certa informação representam uma intrusão inconstitucional no direito à privacidade sem relação com o crime investigado”.
Argumenta, ainda, que os dados gerados por pesquisas em páginas na internet, especialmente num mundo cada vez mais digital, estão protegidos tanto pela cláusula geral de proteção da intimidade, quanto pela norma específica de sigilo de dados.
O Google alega ainda que a busca atinge pessoas inocentes, pois os termos indicados são comuns, envolvem pessoa pública e têm lapso temporal longo (96 horas), o que aumentaria a possibilidade de lesão de direitos.
Repercussão geral
A ministra Rosa Weber, enquanto relatora do caso no STF se manifestou pelo reconhecimento da repercussão geral do caso por considerar inegável a existência de questão constitucional. A ministra aposentada, à época, ressaltou que a proteção de dados pessoais é um dos desafios à privacidade na chamada “era da informação”.
Antes de se aposentar, Rosa Weber proferiu seu voto no julgamento no sentido de dar provimento ao recurso do Google. Ela considerou que não existir dispositivo legal que legitime o emprego de medida tão ampla como a que determinou o fornecimento de dados pessoais de indeterminadas pessoas.
Rosa sugeriu a seguinte tese: “À luz dos direitos fundamentais à privacidade, à proteção dos dados pessoais e ao devido processo legal, o art. 22 da Lei 12.965/2014 (Marco Civil da Internet) não ampara ordem judicial genérica e não individualizada de fornecimento dos registros de conexão e de acesso dos usuários que, em lapso temporal demarcado, tenham pesquisado vocábulos ou expressões específicas em provedores de aplicação”.