Perdido no personagem: MBL busca caminhos para superar escândalos
Polêmicas e escândalos recentes envolvendo expoentes do grupo, aliados à dificuldade de decolagem da 3ª via, causaram crise no movimento
atualizado
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Acossado por polêmicas e escândalos recentes, o Movimento Brasil Livre (MBL) entrou de vez em crise e analisa que deve encontrar dificuldades para repetir em 2022 o resultado positivo nas urnas que teve em 2018. Se nas eleições passadas o grupo teve êxito ao se institucionalizar e conquistar cadeiras legislativas para alguns de seus integrantes, neste ano o desafio será conseguir manter o mesmo nível de representação.
Fortes reações a falas problemáticas de expoentes do grupo — das quais as declarações misóginas do deputado estadual Arthur do Val (sem partido-SP) são emblemáticas — têm gerado abatimento sobre integrantes do grupo.
Pelas redes sociais, líderes do movimento tentam apelar ao instinto de autopreservação e estimular os seguidores a não esmorecer. “Precisamos nos unir e nos engajar para que esse movimento tenha cada vez mais voz, e não para que seja silenciado”, diz trecho de uma mensagem espalhada em um grupo do Telegram na última quinta-feira (10/3).
O grupo, nascido como defensor de pautas liberais, se afastou do bolsonarismo, se envolveu em polêmicas, adotou posturas questionáveis e se perdeu no personagem criado na batalha pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).
Sem o mesmo grau de adesão dentro da direita que possuía há seis anos, a agremiação agora tenta se manter relevante em alas juvenis da política neoliberal, e se vende como um contraponto entre a esquerda e a direita “radicais”.
Festival de polêmicas
Nos áudios da semana passada, revelados pelo Metrópoles, o deputado Arthur do Val diz que as ucranianas são “fáceis” de pegar por serem pobres e afirma que a fila de refugiados da guerra tem mais mulheres bonitas do que a “melhor balada do Brasil”.
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Frente às reações, do Val primeiro decidiu deixar o MBL e desistiu da pré-candidatura ao governo de São Paulo, que era uma das apostas de projeção do grupo. Pouco depois, foi forçado a anunciar que agora nem sequer tentará a reeleição à Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp). O partido de que fazia parte, o Podemos, tinha aberto um processo de expulsão do parlamentar youtuber de seus quadros. Ele se adiantou e pediu desfiliação. Do Val ainda enfrenta processos de cassação de seu mandato na Alesp.
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Em fevereiro, em entrevista ao Flow Podcast, o deputado federal Kim Kataguiri (União-SP) defendeu que a Alemanha não deveria ter criminalizado o nazismo. Kataguiri é um dos cofundadores do MBL e principal figura do movimento dentro do Congresso Nacional .
Kataguiri também afirmou no programa que não deveria ser proibida e criminalizada a existência de um partido nazista. O deputado sofreu uma enxurrada de críticas pela declaração, que tentou modular dias depois. Entre aliados, a avaliação é de ele saiu chamuscado do episódio e que isso pode lhe criar dificuldades para o possível projeto de reeleição.
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Procurado pela reportagem para comentar os caminhos do grupo para 2022, Kataguiri disse não estar comentando o assunto no momento.
Integrantes do MBL veem uma tentativa de atacar o MBL após o “hype” das últimas semanas e dizem que há uma tentativa de “destruir reputações”. “Querem pegar qualquer coisa para atacar a gente”, queixa-se o coordenador do MBL, Renan Santos, em um áudio divulgado a simpatizantes.
Entre as formas de mobilização, Renan Santos pede que apoiadores e integrantes do grupo se manifestem em redes sociais. “Esse é o nível: é tentar destruir o MBL, é requentar coisa velha, vai vir mais coisa velha requentada, porque eles não têm o que dizer, mas vamos ficar de pé”, diz ele em mensagem de áudio, após reclamar de reportagens envolvendo seu nome.
3ª via empacada
Outra dificuldade enfrentada pelo MBL é a estagnação do principal candidato da chamada terceira via, defendida pelo MBL e outros integrantes da direita como uma alternativa à polarização entre Lula e Bolsonaro.
O grupo vinha participando da formulação de estratégias de comunicação e de articulações políticas em favor do ex-juiz Sergio Moro (Podemos), mas a relação azedou depois que Moro disse “lamentar profundamente e repudiar veementemente as graves declarações do deputado”.
Era no Podemos, inclusive, que o grosso do grupo pretendia se concentrar para disputar as eleições, mas as polêmicas recentes têm dificultado essa unidade. A saída de Arthur do Val do Podemos bagunçou o jogo político, e a sigla, que até então era vista como abrigo do grupo, pode assistir a uma debandada de integrantes do MBL.
Histórico
Nascido nas eleições de 2014 na esteira do antipetismo e do apoio à Operação Lava Jato, o MBL completa em novembro sete anos de existência. Seu propósito inicial era divulgar as ideias do liberalismo no Brasil. O grupo, formado por jovens na faixa entre 20 e 30 anos, ganhou relevância ao articular uma série de protestos em favor do impeachment da ex-presidente Dilma em 2015 e 2016.
No governo Michel Temer (MDB), o grupo ajudou a promover as reformas trabalhista e previdenciária. Nas eleições subsequentes, apoiou o candidato Jair Bolsonaro (então no PSL, hoje no PL). Entre as pautas em comum, estavam a defesa do armamento da população e o apoio às reformas econômicas.
Com a pandemia de coronavírus, o grupo rompeu com o bolsonarismo. Em setembro de 2021, o MBL organizou um protesto nacional para pedir o impeachment de Bolsonaro. Junto com o Vem Pra Rua, o grupo tentou trair segmentos da esquerda para os atos, mas não só não houve uma oposição unificada como os protestos acabaram esvaziados.
Além de vitórias nas eleições gerais, o grupo conseguiu conquistar cadeiras nos pleitos municipais de 2016 e 2020, dos quais são exemplos Fernando Holiday (hoje fora do movimento) e Rubinho Nunes, ambos vereadores de São Paulo.