Trans podem utilizar nome social em eleições municipais pela primeira vez
No total, 167 candidatos aos cargos de vereadores optaram por utilizar o nome social nas eleições
atualizado
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As Eleições 2020 quebraram diversas barreiras sociais. O TSE registrou 554.493 mil candidaturas até a tarde de sexta-feira (16/10), com recorde no número de postulantes mulheres e, pela primeira vez, mais concorrentes se autodeclararam negros do que brancos. Mas a comunidade LGBTQI+ também conseguiu uma importante marca.
A Resolução nº 23.609/2019 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) possibilitou a candidatos e candidatas transgêneros concorrerem às eleições usando o nome social. A medida vale desde 2018 mas é a primeira vez em que os postulantes aos cargos de prefeitos e vereadores em todo o país têm essa possibilidade.
O formulário do Requerimento de Registro de Candidatura (RRC) pede, entre outros dados pessoais, o nome social que o candidato ou candidata utiliza, se for o caso. Assim, quem não se identifica com o gênero designado no seu nascimento pode concorrer a cargos eletivos utilizando o nome pelo qual a sua comunidade o conhece. É importante destacar que para ser inserido na urna eletrônica, o nome social já deverá constar do cadastro eleitoral e estar no título do candidato ou candidata.
No total, 167 candidatos a vereador optaram por utilizar o nome social nas eleições. Desses, 136 (81,88%) são do gênero feminino e 31 (18,13%), do masculino.
Para a candidata a vereadora Bruna La Close (PT-AM), poder utilizar o nome social tem grande valor em qualquer situação. “Você constrói a sua identidade ao longo da vida, com o tempo você vai entendendo quem é.”
Além disso, ela destacou que seria injusto com todos aqueles que possuem uma trajetória baseada no nome social. “Tenho 20 anos de militância e ativismo LGBT usando o nome Bruna La Close, como vou colocar na urna José Antônio? Fica até incoerente e acaba apagando minha história”, completa.
A candidata Neta (PCdoB-CE) destaca que se sente orgulhosa e vitoriosa por poder usar a Resolução nº 23.609/2019. “Em pleno 2020, é a primeira vez na história do Brasil que podemos usar o nome social nas eleições municipais. Essa medida tem extrema importância porque a luta por esse direito foi muito grande”, disse.
Além do nome social, as candidatas transexuais vão poder usar as cotas destinadas às mulheres. Em 2018, o TSE confirmou que os partidos políticos deveriam reservar pelo menos 30% dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, conhecido como Fundo Eleitoral, para financiar as campanhas femininas no período.
Em nota, o TSE informou que a identificação de gênero do candidato será levada em conta de acordo com a autodeclaração de cada um.
Em agosto, o presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, afirmou que segundo as estatísticas das Eleições 2020, quase 10 mil pessoas utilizarão o nome social no título neste ano. Conheça algumas:
Neta
José Honorato Batista Neta (PCdoB) vai usar o nome Neta. Tem 27 anos, é candidata a vereadora em Fortaleza, Ceará.
“Vamos fazer história com a Neta: mulher trans, negra, periférica e estudante de pedagogia na Universidade Estadual do Ceará. Além disso, ela é poeta, educadora popular e atua em mais de 10 movimentos sociais. Neta quer construir uma Fortaleza de todas as vozes e de todas as cores!”, disse a candidata em sua campanha.
Ela explica que uma de suas maiores dificuldades é conseguir votos de pessoas heterossexuais. Além disso, segundo Neta, muitos indivíduos da comunidade LGBT não conhecem as diferentes realidades que enfrentam.
“Quando a gente vai falar da LGBTfobia, as pessoas chamam de ‘mimimi’. Mas o Brasil é o país que mais mata LGBTs no mundo, em especial as mulheres trans, e 90% da população trans brasileira faz trabalhos de prostituição por que são expulsas da escola”, conclui.
Bruna La Close
Bruna La Close (PT), de 46 anos, é candidata a vereadora em Manaus, Amazonas. “A nossa representatividade vive na essência o drama LGBT todos os dias. Eu acredito sim que a minha candidatura é importante para esse pleito e para a representatividade LGBT.”
A principal proposta de seu governo é o Centro de Referência LGBT. A ideia é criar um centro público que possa garantir acolhimento à comunidade vulnerável por meio de cursos, para capacitar e garantir a inserção no mercado de trabalho. Por isso, busca criar esse centro e transformá-lo em referência.
A candidata conta que precisou ter estratégias para conseguir os votos dos heterossexuais que compreendem e acolhem. Para Bruna, aqueles preconceituosos, que não “aceitam”, infelizmente são votos difíceis de conquistar.
“É uma campanha trans, LGBT, voltada aos nossos anseios. Mas nós não vamos abrir mão de dialogar e pedir votos dos heterossexuais porque a gente sabe que é fora da nossa bolha que a gente pode alcançar um número capaz de nos levar ao Parlamento. E sabemos que existem os ‘simpatizantes’, que compreendem e acolhem, embora não sejam da comunidade LGBT.”