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Militares captaram discursos de Marina Silva em greve de professores

Documentos dos serviços de inteligência da repressão registraram participação da presidenciável em movimento dos docentes no Acre em 1984

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1 de 1 marina destaque - Foto: Reprodução

Marina Silva ainda cursava história na Universidade Federal do Acre (Ufac) quando começou a lecionar na rede pública estadual, em 1984. Logo nos primeiros meses de trabalho, os professores entraram em greve por melhores salários e outras reivindicações da categoria. Atuante na paralisação, a militante teve discursos captados e registrados pelo Serviço Nacional de Informações (SNI).

Esta é a terceira reportagem publicada pelo Metrópoles com arquivos produzidos pela ditadura sobre Marina Silva no início de sua vida política. Obtido no Arquivo Nacional de Brasília, o material trata do período em que ela foi professora no Acre e destaca falas registradas pelos espiões durante o movimento grevista. Nas duas edições anteriores, foram apresentados documentos relacionados à participação da jovem ativista no movimento estudantil e no Partido Revolucionário Comunista (PRC).

Os agentes identificaram a nova professora no início da paralisação, conforme descrito no documento Informação nº 0033/19/ANA/84, organizado pelo SNI. A referência a Maria Osmarina da Silva (Marina) aparece no relatório do dia 1º de maio de 1984, data da decisão de suspensão das aulas.

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O nome da futura candidata a presidente da República faz parte de uma lista de 19 docentes que lideraram uma passeata pelas ruas do centro de Rio Branco depois de uma assembleia geral, com 300 participantes, no colégio Meta. No mesmo dia, Marina entra para o comando de greve dos professores. Ela é a última em uma relação de 18 grevistas encarregados de encaminhar as deliberações da categoria.

Na ocasião, os professores debateram o reajuste salarial de 30% para as menores remunerações e de 20% para as maiores, proposto pelo governador Nabor Júnior (PMDB).

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No dia 7 de maio, cerca de 300 pessoas participaram de uma concentração em frente à Assembleia Legislativa e de outra passeata pela cidade. No percurso, gritavam palavras de ordem: “Greve geral, derruba general”, “o povo unido jamais será vencido”,  “o povo na rua derruba a ditadura” e “educação, queremos solução”.

Cerca de 300 professores fizeram outra assembleia, no saguão da Assembleia Legislativa, no dia 9 de maio. “Dentre os oradores, destacaram-se os seguintes…”, diz o documento sobre seis grevistas que se manifestaram a favor da continuação da paralisação.

Marina era uma das pessoas apontadas pelo documento militar. O discurso feito naquele dia foi assim anotado no relatório do SNI: “Declarou que era pela mudança social que os professores tinham que lutar” para viver “num regime sem exploradores, onde o trabalhador possa sobreviver condignamente”.

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Posta em votação, a proposta do governo foi derrotada. Um dos argumentos para a rejeição foi o fato de não ter sido garantida a paridade salarial de todos os professores, uma das reivindicações dos grevistas.

Pressionado pelo movimento, Nabor Júnior fez outra contraproposta. Aceitou efetivar professores em situação trabalhista precária; contratar auxiliares escolares; fixar paridade salarial; estabelecer progressão funcional automática; instituir eleições diretas para diretores de escolas.

Nova assembleia foi realizada no dia 11 de maio. Os docentes aceitaram os termos encaminhados pelo governador e encerraram a paralisação. Embora tenha manifestado favoravelmente ao fim da greve, Marina Silva marcou posição com algumas considerações sobre a mobilização da categoria. Ela responsabilizou o regime militar pela “desgraça” da categoria e pediu união dos presentes em torno dos trabalhadores como “única saída para uma ampla e total modificação na sociedade brasileira”. Por fim, Marina recorreu a uma retórica típica dos ativistas da resistência contra a ditadura: “A opressão mata um, dois, até três, mas não um milhão”.

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O nome da futura deputada estadual, senadora e ministra do Meio Ambiente faz parte de um anexo do relatório do SNI intitulado Relação de participantes das manifestações do movimento grevista dos professores de Rio Branco/AC. Nesse registro, ela aparece identificada como Maria Osmarina da Silva (Marina).

A partir dessa referência, é possível deduzir que os militares ainda não sabiam sobre o fato de a jovem militante integrar os quadros de um partido clandestino, o PRC. Fundada em janeiro de 1984, a organização comunista existia havia quatro meses, mas aparentemente permanecia desconhecida dos órgãos de informação da ditadura.

Outros grevistas listados no documento têm a ligação política explicitada pelos agentes. Esse é o caso, por exemplo, de Pascoal Torres Muniz, presidente da Associação dos Professores do Acre (Aspac), citado na listagem como ligado ao Partido Comunista Brasileiro (PCdoB).

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PF infiltrado
Munis foi o principal nome da greve. Comandou as reuniões e liderou o movimento do início ao fim. Um dos momentos mais tensos da paralisação foi registrado em um relatório do Departamento de Polícia Federal, classificado como Informe nº 123/84-S1/SR/DPF/AC.

Durante a assembleia onde foi decidido a suspensão das aulas, os professores identificaram um policial federal na plateia. Muniz anunciou a descoberta. “No Brasil, temos de acabar com essa opressão feita pelos militares, ou pelos que comungam da mesma hóstia, e para comprovar isso, denunciamos a presença de um agente da Polícia Federal, que está entre nós”, discursou o presidente da Aspac.

Em seguida, Muniz forneceu as características físicas do sujeito, identificado no relatório como “APF Nivaldo”. Enquanto encarava o policial, o líder grevista continuou o discurso: “Não acredito que o mesmo seja tão cara de pau a ponto de permanecer no local, espero que o mesmo retire-se, mas se por acaso isso não acontecer, não usaremos de violência e continuaremos nossa assembleia”.

Um grupo de professores, então, levantou-se e começou a gritar “fora, fora, professores unidos, jamais serão vencidos”. Entre esses manifestantes, estava Arnóbio Marques de Almeida Júnior, o Binho, colega de Marina no curso de história e futuro governador do Acre (PT). Na lembrança do antigo professor, o policial saiu de fininho da assembleia.

Binho recorda-se desse período de atuação junto com a amiga. “Participamos ativamente dessa greve. Fizemos piquetes e tudo que manda o manual. Também participamos da comissão de negociação com o governador Nabor Júnior”, rememora.

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No final do documento de 1984, o SNI faz algumas observações sobre o movimento dos professores. O órgão de informações considera que a paralisação teve como causa “justas reivindicações” há muito tempo defendidas pela categoria. “Entretanto, sua condução por uma entidade liderada por elemento comprometido com organização subversiva atuante na área deu margem a que o referido movimento fosse também explorado de forma a ajustar-se aos objetivos estranhos à classe”. Essa foi, claro, uma referência a Pascoal Torres Muniz, militante do PCdoB.

A prática de transcrever trechos de discursos de Marina e de seus companheiros continuou nos meses seguintes. Em dezembro de 1984, durante as companhas para a eleição da diretoria do Diretório Central dos Estudantes (DCE) da Ufac, os agentes destacaram declarações dos concorrentes e de apoiadores.

“Não precisa tirar a roupa”
Embora não integrasse a chapa, a mulher que agora concorre à Presidência da República apoiava a “Arueira”, formada por jovens ligados ao PRC. Ao responder a um concorrente que acusara seu grupo de participar de fraudes em eleições estudantis, Marina lembrou um episódio ocorrido poucas semanas antes.

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“Para fazer oposição consequente, não precisa tirar a roupa, como fizeram os estudantes da Libelu no Congresso da UNE”, afirmou a militante do PRC, referindo-se aos ativistas da corrente trotskista Liberdade e Luta que despiram-se durante o encontro nacional da União Nacional dos Estudantes (UNE) realizado no Rio de Janeiro.

Na ditadura, os militares se preocupavam com esse tipo de coisa.

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