Lupa: em fim de campanha presidencial, Bolsonaro e Haddad ainda erram
Confira a checagem do que os presidenciáveis, que não se enfrentaram em debates, declararam sobre segurança, economia e adversários
atualizado
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Na reta final da campanha eleitoral, Fernando Haddad (PT) e Jair Bolsonaro (PSL) seguem em rotina intensa de entrevistas. Sem se encontrarem em debates neste segundo turno, os dois candidatos à Presidência da República falam a jornalistas sobre suas propostas e também trocam acusações indiretamente. A Lupa checou algumas das declarações recentes deles. Veja o resultado:
“Nunca vi o Lula pronunciar essa palavra [fascista] para se referir a ninguém.”
Fernando Haddad, candidato do PT à Presidência, em sabatina com O Globo, Extra, Época e Valor Econômico no dia 22 de outubro de 2018
O ex-presidente Lula, preso em Curitiba (PR) desde abril, usou o termo fascista para criticar o próprio candidato Jair Bolsonaro (PSL). No ano passado, no 6º Congresso Estadual do PT de SP, ao comentar sobre o momento político do país, Lula disse: “o resultado (…) é o crescimento de um fascista chamado Bolsonaro na pesquisa de opinião pública”. Veja o trecho aqui. Além disso, em carta divulgada no dia 24 de outubro, Lula menciona duas vezes que há uma “ameaça fascista que paira sobre o Brasil”. No documento, o ex-presidente pede uma união de diversos setores em torno da candidatura de Haddad.
Procurado, o candidato não retornou.
“Hoje, está [custando] R$ 80 o gás [de cozinha].”
Fernando Haddad, candidato do PT à Presidência, em ato em São Luís, no Maranhão, no dia 21 de outubro de 2018
Segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, um botijão de 13kg de GLP, o gás de cozinha, custava R$ 68,48, em média, no país em setembro de 2018. Neste ano, o preço médio mais alto do produto no Brasil foi atingido no mês de junho, quando o botijão de gás chegou a custar R$ 68,77. Em setembro, em apenas três dos 27 estados brasileiros o preço do gás de cozinha estava próximo de R$ 80: no Acre (R$ 79,91), em Roraima (R$ 80,25) e em Mato Grosso (R$ 96,75).
Procurado, Haddad não retornou.
“O [general] Mourão [vice de Bolsonaro] foi, ele próprio, torturador.”
Fernando Haddad, candidato do PT à Presidência, em sabatina com O Globo, Extra, Época e Valor Econômico no dia 22 de outubro de 2018
Haddad repetiu frase dita pelo cantor Geraldo Azevedo, que acusou o vice de Bolsonaro, General Mourão, de ter sido torturador na ditadura militar. Em show na cidade de Jacobina, na Bahia, no dia 21 de outubro, Azevedo classificou o período da ditadura militar como “indigente” e contou que foi preso duas vezes e torturado – em 1969 e em 1974. Dois dias depois, o cantor disse que se enganou ao falar sobre Mourão.
Quando Azevedo foi preso pela primeira vez (aqui, aqui e aqui), Mourão tinha 16 anos e ainda não integrava o Exército. O vice de Bolsonaro, hoje general, entrou para a corporação em 1972. Em 1974, na segunda prisão do cantor, no Rio de Janeiro, Mourão estava em formação na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), em Resende, a cerca de 170km da capital fluminense. O general afirmou que denunciará o cantor por “declaração difamatória”.
Haddad reconheceu o erro publicamente: “Foi o que eu recebi de uma fonte fidedigna. Geraldo Azevedo realmente foi torturado e disse que tinha sido que torturado por Mourão. Eu me solidarizo com ele. Toda pessoa que foi torturada está sujeita a ter esse tipo de confusão.”
“A estimativa é que 100 mil pessoas já cumpriram pena no sistema prisional [por pequenos delitos] e não têm advogado para obrigar a Justiça a liberá-los.”
Fernando Haddad, candidato do PT à Presidência, em entrevista à Rádio Globo no dia 18 de outubro de 2018
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Fórum Brasileiro de Segurança Pública e o Ministério de Segurança Pública (por telefone) afirmam que não há estimativas no Brasil sobre o número de pessoas que seguem presas mesmo após terem cumprido suas sentenças.
De acordo com o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), 40% dos presos brasileiros estão detidos sem condenação – o equivalente a 292.450 pessoas. O Infopen, no entanto, não tem informações sobre a questão mencionada por Haddad.
Procurado, o candidato não retornou.
“Ontem [21 de outubro], ele [Bolsonaro] fez um vídeo muito grave (…) dizendo que [os adversários] não terão lugar no Brasil, ou a cadeia ou o exílio.”
Fernando Haddad, candidato do PT à Presidência, em ato em Tuca, em São Paulo, no dia 22 de outubro de 2018
No dia 21 de outubro, Jair Bolsonaro (PSL) divulgou em, sua conta no Twitter, um vídeo em que diz que “essa turma, se quiser ficar aqui, vai ter que se colocar sob a lei de todos nós. Ou vão para fora ou vão para a cadeia”. O deputado chegou a dizer ainda que os “marginais de vermelho” seriam expulsos do Brasil.
“O meu patrimônio (…) é muito inferior ao dele [Bolsonaro], diga-se de passagem.”
Fernando Haddad, candidato do PT à Presidência, em encontro no Clube de Engenharia do Rio de Janeiro, no dia 19 de outubro de 2018
Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o patrimônio de Fernando Haddad (PT) é de R$ 428.451,09. O de Jair Bolsonaro chega a R$ 2.286.779,48, de acordo com o informado pelo candidato ao TSE. Assim, o valor dos bens declarados pelo deputado federal à justiça eleitoral equivale a cinco vezes o dos bens do petista.
“Eu – dentro do hospital, baixado, de cama – cresci muito mais do que ele [Haddad] nas ruas.”
Jair Bolsonaro, candidato do PSL à Presidência, em entrevista à Band, no dia 21 de outubro de 2018
No período em que esteve hospitalizado – após sofrer um atentado em ato de campanha em Juiz de Fora (MG) –, Bolsonaro cresceu nove pontos percentuais nas pesquisas de intenção de voto realizadas pelo Ibope e seis nas aferidas pelo Datafolha. Fernando Haddad, no mesmo período, cresceu 15 pontos percentuais, segundo o Ibope, e 13, de acordo com o Datafolha.
Na pesquisa Ibope divulgada no dia 4 de setembro (dois dias antes do atentado), Bolsonaro tinha 22% das intenções de voto. Em 1º de outubro, dois dias depois de ele deixar o hospital, esse percentual havia crescido para 31%. Nos mesmos levantamentos, Haddad tinha 6% e 21%, respectivamente, das intenções de voto.
Já nas pesquisas do Datafolha, Bolsonaro saiu de 22% em 22 de agosto (a mais recente antes do atentado) para 28% em 10 de setembro, a primeira divulgada depois de ele receber alta. Haddad, por sua vez, passou de 9% para 22% das intenções de voto nestes levantamentos.
Procurado, o candidato não retornou.
“Ele [Haddad] e sua coligação tiveram mais de R$ 500 milhões para a campanha.”
Jair Bolsonaro, candidato do PSL à Presidência, em entrevista à Band, no dia 21 de outubro de 2018
O candidato Fernando Haddad, cabeça de chapa da coligação “O povo feliz de novo”, recebeu R$ 32.466.866,33 para sua campanha – valor que equivale a 6,5% do mencionado por Bolsonaro. Desse total, R$ 29.658.261,50 de despesas haviam sido, de fato, contratadas até o dia 23 de outubro.
Vale ressaltar que a minirreforma eleitoral, estabelecida em 2017, fixou o limite de gasto da campanha para presidente em R$ 70 milhões para o primeiro turno das eleições e em mais R$ 35 milhões no caso de um segundo turno. Ou seja, candidato algum poderia obter mais de R$ 105 milhões para campanha – valor que representa pouco mais de 20% dos R$ 500 milhões citados por Bolsonaro.
Procurado, o candidato não retornou.
“Para nós, coube apenas R$ 3 milhões, e eu não usei a parte desse fundo partidário.”
Jair Bolsonaro, candidato do PSL à Presidência, em entrevista à Band, no dia 21 de outubro de 2018
O candidato Jair Bolsonaro e sua coligação “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos” receberam R$2.547.640,20 em recursos para a campanha de 2018. Desse total, R$1.721.537,42 foram contratados até o dia 23 de outubro. De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), os recursos oriundos do fundo partidário utilizados pela campanha, de fato, são irrisórios: representaram 0.81% da arrecadação total.
“A Inglaterra, há 20 e poucos anos atrás, diminuiu a sua carga tributária.”
Jair Bolsonaro, candidato do PSL à Presidência, em entrevista à Band, no dia 21 de outubro de 2018
A carga tributária do Reino Unido – que compreende os três países da Inglaterra e a Irlanda do Norte – era, em 2016, equivalente a 33,2% do Produto Interno Bruto (PIB) dos países, de acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Em 1996, ou seja, 20 anos antes, ela era de 29,7% do PIB. Assim, o que houve foi um aumento na carga tributária, e não uma diminuição.
Há oito anos, o Reino Unido começou a reduzir a corporate tax, imposto que incide sobre o lucro das empresas. Essa redução foi feita gradativamente, de 30% para 20%. Mas, além de isso não ter ocorrido “há 20 e poucos anos”, como diz Bolsonaro, não é o mesmo que redução da carga tributária – já que, com relação ao PIB, ela não diminuiu.
Procurado, o candidato não retornou.
“Os cargos comissionados são muito importantes para a governabilidade.”
Jair Bolsonaro, candidato do PSL à Presidência, em entrevista à Band, no dia 21 de outubro de 2018
Assessor do núcleo duro de Bolsonaro, o deputado federal Onyx Lorenzoni (DEM-RS) recentemente defendeu um corte drástico no número de cargos comissionados do governo federal. Apontado como possível chefe da Casa Civil em um eventual governo do candidato do PSL, Lorenzoni disse, em entrevista ao jornal O Globo, que 25 mil cargos comissionados seriam extintos logo no primeiro dia de governo. À Band, Bolsonaro afirmou que serão cortados “pelo menos metade” desses cargos.
Procurado, o candidato não retornou.
“Nós temos em torno de 23 mil cargos comissionados [no governo federal].”
Jair Bolsonaro, candidato do PSL à Presidência, em entrevista à Band, no dia 21 de outubro de 2018
O painel estatístico de pessoal do Ministério de Planejamento mostra que há hoje 23.112 cargos comissionados de direção e assessoramento sendo ocupados pelo governo federal. Em nota, a pasta afirma que os cargos em comissão disponíveis chegam a 24.937 – ou seja, nem todos estão, atualmente, ocupados. Desses, apenas 6.099 podem ser preenchidos por servidores não concursados.
Além disso, o número citado por Bolsonaro não engloba os comissionados da Administração Federal Direta, agências reguladoras, universidades e institutos federais de ensino e cargos de natureza especial. Conforme o Painel Estatístico de Pessoal, se considerados os comissionados de todas as naturezas, esse número atualmente é de 32.589.
Com reportagem de Clara Becker e Nathália Afonso