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Eleição ameaça política ambiental do Brasil e governo modera apoio a Trump

A volta dos democratas ao poder poderia forçar a gestão Bolsonaro a rever uma política ambiental contestada no exterior

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Ernesto Carriço/NurPhoto via Getty Images
Fotografia colorida de Floresta amazonica incendio desmatamento crime
1 de 1 Fotografia colorida de Floresta amazonica incendio desmatamento crime - Foto: Ernesto Carriço/NurPhoto via Getty Images

A vantagem de Joe Biden na reta final da eleição dos EUA põe em xeque a política ambiental do governo brasileiro. Sem esconder a predileção por Donald Trump, auxiliares diretos do presidente Jair Bolsonaro temem que um revés do republicano isole ainda mais o Brasil e amplie as pressões internacionais contra o desmatamento na Amazônia. O Itamaraty já se movimenta de forma discreta para se mostrar disponível à negociação em caso de mudança de comando na Casa Branca.

É consenso entre diplomatas que Biden manterá a pressão pública pela preservação da floresta se vencer a disputa presidencial. A volta dos democratas ao poder poderia forçar a gestão Bolsonaro a rever uma política ambiental contestada no exterior.

Este cenário evidenciaria o esvaziamento político do grupo “trumpista” do governo brasileiro, especialmente do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles — que propôs passar a “boiada” para flexibilizar a legislação ambiental —, e do titular das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. A lista inclui ainda o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno — que já fez uma série de discursos sobre a Amazônia considerados do tempo da Guerra Fria.

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O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles
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Ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo
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O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles

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Na sua principal referência ao Brasil na campanha, Biden propôs — durante debate com Trump, em setembro — impor sanções econômicas ao Brasil e prometeu angariar US$ 20 bilhões entre países estrangeiros para oferecer ao Planalto, em troca de preservação. “As florestas tropicais do Brasil estão sendo destruídas. Aqui estão US$ 20 bilhões. Parem de destruir a floresta! Se não, vocês terão consequências econômicas significativas”, disse o democrata no debate transmitido pela TV americana.

Bolsonaro reagiu imediatamente. Afirmou que a declaração era “desastrosa” e indicava o fim da convivência “cordial e profícua”. “Nossa soberania é inegociável. Lamentável, sr. Joe Biden, sob todos os aspectos, lamentável”, escreveu o presidente no Twitter.

O chanceler Araújo já chamou Trump de “Salvador do Ocidente”. Agora, o esforço é para calibrar o tom. Nas últimas semanas, o ministro disse que a relação se “reorganizará” se o democrata vencer. A rotina no Itamaraty mudou. Araújo deixou de convidar blogueiros pró-Trump para seminários virtuais promovidos pela pasta. Diplomatas de carreira passaram a ocupar o espaço dos extremistas.

Num dos encontros, o embaixador Pedro Miguel da Costa e Silva, secretário de Negociações Regionais e Bilaterais nas Américas, minimizou prejuízos diante de uma troca de governo. “A agenda que estamos construindo é de interesse para os dois países”, disse ele. Essa agenda, segundo o diplomata, tem como base interesses “muito concretos” na área comercial e é cobrada pelos setores produtivos dos dois países.

Ricardo Salles, por sua vez, virou um peso para um governo em busca de moderação e até para o setor exportador do agronegócio. Vive agora atacando o vice-presidente Hamilton Mourão, os ministros Paulo Guedes (Economia) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Embora assessores observem que uma reforma ministerial depende mais da vontade de Bolsonaro do que de alterações de cenários internacionais, a eventual vitória de Biden tende a causar impacto na equipe brasileira.

A preocupação do candidato democrata com o clima agrada a uma ala do seu partido, que abriga distintos grupos liberais de centro e de esquerda críticos do governo brasileiro. Biden já anunciou que vai voltar ao Acordo de Paris — tratado no âmbito das Nações Unidas que rege medidas de redução de emissão de gases efeito estufa.

A vice na chapa de Biden, Kamala Harris, já havia previsto o tom da campanha democrata no ano passado, no auge das queimadas amazônicas. Ela sinalizou o bloqueio de acordos em negócios — como o almejado e ainda distante livre-comércio, barrado pela bancada democrata na Câmara. “Enquanto a Amazônia queima, o presidente do Brasil, que copia Trump, permitiu que madeireiros e garimpeiros destruíssem o território e não está agindo”, disse ela.

Condições

Na semana passada, o colombiano Juan Sebastián González, conselheiro de Biden para a América Latina, enumerou os aspectos fundamentais da diplomacia num futuro governo democrata: a política climática, o respeito aos princípios democráticos e aos direitos humanos.

“Qualquer pessoa, no Brasil ou em qualquer outro lugar, que pensa que pode promover um relacionamento ambicioso com os EUA enquanto ignora questões importantes, como mudança climática, democracia e direitos humanos, claramente não tem ouvido Joe Biden durante sua campanha”, vaticinou González, ao comentar a relação com Bolsonaro.

Um importante secretário do Itamaraty disse ao Estadão que as relações de Bolsonaro com um governo democrata dependem de um contexto mais amplo. A ameaça chinesa aos negócios americanos no continente é uma aposta do lado brasileiro na moderação por parte de Biden. A relação ocorrerá, segundo ele, também num cenário de disputas dos EUA com a Europa, o que poderia significar uma possibilidade para o Brasil se reequilibrar.

A opinião é compartilhada pelo embaixador Everton Vargas, que serviu nas Nações Unidas e se dedica a tema ambientais. “Biden não vai denunciar acordos celebrados. Os Estados Unidos têm todo o interesse em penetrar o máximo possível na América Latina, para evitar o avanço dos chineses”, disse o diplomata, que atuou em negociações bilaterais com os americanos e coordenou a Cúpula das Américas.

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