Universidades federais têm menos de 1% de intercambistas estrangeiros
Segundo MEC, há intenção de ampliar o número de países e universidades participantes do Programa de Estudantes-Convênio de Graduação
atualizado
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Aluno de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Leonardo Pontes, de 20 anos, ainda não fez um intercâmbio, mas estuda ao lado de um estudante da Turquia e de outro do Benim. “Na minha área, um aluno de fora é um prato cheio para conversar sobre relações políticas e econômicas, principalmente quando é proveniente de um país fora do centro das notícias.”
Aposta para tornar o ambiente acadêmico mais internacionalizado, a entrada de estudantes de fora do Brasil em universidades públicas ainda é pequena. O número de estrangeiros em instituições federais representa menos de 1% da quantidade total de alunos nas universidades, segundo levantamento com base em questionários enviados às instituições por meio da Lei de Acesso à Informação.
A USP traz mais estudantes – 3,4% dos alunos eram intercambistas, na graduação ou na pós, em 2016. O ideal, segundo especialistas, é essa taxa ficar entre 3% e 5% em uma universidade de grande porte. O grau de internacionalização é um dos principais critérios em rankings de avaliação do ensino superior, como o da revista britânica Times Higher Education.Como a maioria dos estudantes brasileiros não terá a oportunidade de uma experiência fora do país, a vinda de estrangeiros é vista como uma forma de trazer o ambiente internacional para a própria casa.
Nos últimos anos, programas de envio de universitários para o exterior perderam força ou acabaram, como o Ciência sem Fronteiras, encerrado em 2016. “Os alunos amadurecem mais quando expostos à diversidade cultural e linguística. Paradoxalmente, isso fortalece a própria identidade”, afirma Mariano Francisco Laplane, diretor de Relações Institucionais da Unicamp.
Uma das razões para um país ser pouco atrativo à estrangeiros é a baixa oferta de disciplinas em inglês. “Embora seja a sexta língua mais falada no mundo, dificilmente um estudante da Europa, Estados Unidos ou Ásia fala português. E se vier ao Brasil, o primeiro requisito é o idioma. A única alternativa é oferecer disciplinas em inglês”, defende o professor da Unesp José Celso Freire Júnior, presidente da Associação Brasileira de Educação Internacional (Faubai).
Fluente em francês, o aluno Sotie Ghislain, de 24 anos, natural do Benim, teve de fazer um curso de Português na Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e passar por teste de proficiência no idioma antes de começar a estudar na Unifesp. “A língua portuguesa não é fácil. Quando cheguei aqui, nem sabia dizer “bom dia” em português e era complicado achar alguém fluente em francês”, conta o jovem, colega de Pontes no curso de Relações Internacionais da Unifesp.
Em nota, a Unifesp admite desafios para tornar a instituição mais internacional, como a oferta de português para estrangeiros, de disciplinas em língua estrangeira e de infraestrutura de acolhimento para os que vêm de fora. Contra esses problemas, a reitoria pretende mapear o perfil da internacionalização na Unifesp e fortalecer a participação em redes de cooperação estrangeiras.
Política
Não há no país uma política única de internacionalização com metas para ampliar o número de intercambistas. Existem, porém, iniciativas do governo federal para atrair estrangeiros, como o Programa de Estudantes-Convênio de Graduação e Pós Graduação. Os números dessas ações ficaram estagnados na graduação – o total de participantes foi de 491 no ano passado, ante 523 em 2015. Já na pós houve queda – de 168 participantes, em 2013, para 26 no ano passado.
Estudo publicado no ano passado pelo IIE Center for Academic Mobility Research and Impact, com apoio da Faubai, mostrou que 47% das universidades apontaram falta de recursos para tomar iniciativas de ampliar suas ações de internacionalização. O levantamento considerou um universo de 158 instituições brasileiras, públicas e particulares.
Idioma oficial
No início do semestre, o professor Gilmar Masiero avisa: “não se preocupe porque falar errado aqui é a norma”. A tentativa é de encorajar os alunos a se expressarem. Professor da disciplina “Managing Organizations in Brazil” (Administração das Organizações no Brasil), ele dá aulas inteiramente em inglês para estudantes de várias partes do mundo – poucos brasileiros.
Dos 40 alunos da disciplina de graduação da Universidade de São Paulo (USP), cerca de 90% são estrangeiros e quase todos têm o inglês como segundo idioma. O curso é uma das 26 disciplinas de graduação e pós ministradas em língua inglesa na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA). Em 2015, a FEA criou uma comissão de internacionalização, com a meta de ampliar a oferta de disciplinas em inglês na unidade.
“Os alunos sempre ficam um pouco mais travados porque pensam primeiro no seu idioma”, diz o professor. Mas, segundo ele, a abordagem recente da disciplina, com estudo do desenvolvimento social em favelas brasileiras, chamou a atenção dos estudantes e fez até os mais tímidos se soltarem. “Fiquei contente porque a turma abraçou o programa. Consegui ver pela participação em aula e pela presença.”
Na disciplina, uma optativa, também se estuda desenvolvimento econômico e empreendedorismo. “A ideia é fazer os meninos pensarem o Brasil a partir de seus problemas de crescimento econômico excludente”, diz Masiero. A tentativa é promover interação entre as nacionalidades. “Não deixo “panelas” de franceses com franceses ou alemães com alemães.”
Conectado
Embora não seja o foco, brasileiros participantes da disciplina também aproveitam. “A maioria dos colegas é europeu. Acho bacana ver a visão deles e dar meus “inputs (entrada)'”, comenta a aluna de Engenharia Naval Beatriz Casotti, de 22 anos, integrante da optativa na FEA. “Já tinha feito um intercâmbio na Irlanda. Mas muitos estudantes não têm a oportunidade de sair. É um jeito de se manter conectado com a língua inglesa e também falar com os estrangeiros.”
Aumento da internacionalização pelo MEC
O Ministério da Educação (MEC) ressaltou, em nota, a intenção de ampliar o número de países e universidades participantes do Programa de Estudantes-Convênio de Graduação. Segundo a pasta, a existência de programas como o Idioma sem Fronteiras, no intuito de capacitar alunos e professores em língua estrangeira, é outra estratégia para expandir a internacionalização.
Os dez países que mais enviam estudantes ao Brasil são Colômbia, Peru, Argentina, Angola, México, Alemanha, Espanha, Portugal, Bolívia e Chile.
Já a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão vinculado ao MEC, aposta em um programa recém-lançado para a pós, o Print. A ação prevê “fomentar o desenvolvimento de planos estratégicos de internacionalização”, além de incentivar redes internacionais integradas por instituições brasileiras.
O número de estrangeiros em instituições federais do Brasil representa menos de 1% da quantidade total de alunos nas universidades, revela levantamento com base em questionários enviados às instituições por meio da Lei de Acesso à Informação.