Ciências sociais e humanas recebem um quarto das bolsas de pesquisas
Áreas consideradas pelo ministro como “produtivas” concentram a maior parte dos benefícios da Capes e do CNPq
atualizado
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Apontadas como as áreas “produtivas” para a pesquisa pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub, as ciências exatas, biológicas, agrárias e da saúde, bem como as engenharias, já recebem cerca de dois terços de todas as bolsas de estudo fornecidas pelo governo federal. Ao todo, são 119,3 mil benefícios concedidos a essas áreas entre os 185,4 mil disponíveis pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq, sede em Brasília na foto em destaque).
Desde que o governo federal anunciou os contingenciamentos em verbas para as universidades federais, o assunto tem sido o foco dos debates na redes sociais. A Lupa analisou os números relacionados ao ensino superior e mostrou que as matrículas em graduações que o governo considera que tenham “retorno imediato ao contribuinte” já superam as de filosofia e sociologia juntas em universidades federais. Também mostrou que as instituições públicas são responsáveis por 80% dos programas de pós-graduação disponíveis atualmente no Brasil.
Nessa quarta-feira (15/05/2019), manifestações contra os cortes tomaram conta das ruas de diversas capitais do país. Ao mesmo tempo, Weintraub falou aos deputados na Câmara sobre a redução nos repasses da pasta. O ministro criticou a suposta concentração de bolsas de ensino nas áreas de ciências sociais e humanas.
“As ciências sociais aplicadas, humanidades e linguística geram pouquíssimas publicações com impacto científico. (…) Onde estão as bolsas? Elas estão justamente nas áreas que não geram a produção científica”, disse Weintraub.
Os dados públicos sobre ensino superior no Brasil, no entanto, mostram um cenário diferente do descrito pelo ministro. As ciências exatas, biológicas, agrárias, da saúde e as engenharias, que, segundo Weintraub, “baseiam a pesquisa científica”, concentram 64,3% das bolsas. Ciências humanas, sociais aplicadas e linguística, letras e artes, por sua vez, recebem 24,3% delas.
A afirmação de que há concentração da pesquisa em ciências humanas, sociais aplicadas e linguística, letras e artes também é falsa quando consideramos o número de alunos de pós-graduação. Na rede federal, 30,8% dos pós-graduandos estão em programas em uma dessas três áreas. Essa proporção é muito maior na rede privada, na qual esses cursos respondem por 55,1% do total de alunos.
Produção científica brasileira se destaca nas biológicas, agrárias e da saúde
Segundo o SCImago, portal de indicadores da produtividade científica mundial, o Brasil foi o 14º país que mais produziu artigos científicos no mundo em 2017, último ano com dados disponíveis: 73.697. Isso representa 2,1% do total da produção mundial.
Apesar de parecerem modestos, esses números mostram uma evolução significativa no status do país. Em 1996, primeiro ano com dados disponíveis, o Brasil era apenas o 21º maior produtor, responsável por 0,7% dos artigos no mundo.
O número de publicações cresceu, mas o impacto das pesquisas segue sendo um problema. Esse impacto é medido pelo número de citações feitas de um artigo em outros trabalhos científicos. Em média, cada artigo na base de dados do SCImago, entre 1996 e 2017, foi citado 17,4 vezes. Entre os produzidos no Brasil, a média é menor: são 10,4 citações.
Em algumas das 27 áreas de conhecimento listadas pelo SCImago, a ciência brasileira se destacou em 2017. Em odontologia e veterinária, o Brasil foi o segundo país que mais produziu artigos no mundo (10,5% e 8,5% do total, respectivamente, atrás somente dos Estados Unidos em ambos os casos). Ficamos em 3º lugar no ranking em ciências biológicas e agricultura (4,8% da produção total).
Reportagem de Chico Marés