Militares aceitam regras mais duras na previdência deles
A participação dos militares é um ponto sensível no envio dessa nova reforma, já que o presidente é capitão da reserva do Exército
atualizado
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As Forças Armadas aceitam participar da reforma da Previdência e já têm pontos de acordo com o Ministério da Economia para endurecer as regras de concessão de benefícios aos militares da reserva e também pensionistas. As áreas técnicas estão em intenso contato e o ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, avalia que “será possível chegar a um entendimento de 100%”. O ministro disse ao Estado que a aproximação para evitar divergências entre as duas áreas foi feita sob orientação do presidente Jair Bolsonaro.
A participação dos militares é um ponto sensível no envio dessa nova reforma, já que o presidente é capitão reformado do Exército. A equipe econômica insiste que é preciso que eles sejam incluídos para “dar o exemplo” de que todos terão sua “cota de sacrifício”. Ao chegar a um consenso, antes do envio da proposta ao Congresso, o governo espera apresentar a medida como algo fechado, sem racha dentro das áreas militar e econômica.
Entre as questões que estão em discussão e que devem ser modificadas, está a cobrança de contribuição das pensionistas, dos alunos das escolas militares e dos ocupantes dos primeiros postos, incluindo os recrutas que estiverem prestando serviço militar obrigatório.
Tempo de serviço
Outro ponto que deve ser seguir adiante é elevar de 30 para 35 anos o tempo de serviço antes de o militar passar para a reserva. Para isso, a categoria defende a criação de um novo posto para acomodar os mais graduados.
Há também discussão sobre a contribuição dos militares. A minuta obtida em primeira mão pelo Estadão/Broadcast fala em alíquotas iguais à do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), de 8% a 11%. Hoje, a contribuição dos militares é de 7,5%. Eles alegam, porém, que recolhem outra contribuição obrigatória, para gastos com saúde, de 3,5%. Dessa forma, afirmam, a alíquota já é de 11%.
“Os militares vão conosco na reforma, mas não na Proposta de Emenda à Constituição (PEC)”, disse na quinta-feira (7/2) o ministro da Economia, Paulo Guedes, num café da manhã com investidores. A afirmação reflete entendimento em um ponto importante para os militares. Eles não querem ser incluídos na proposta de reforma da Previdência que altera a Constituição.
O general Eduardo Garrido, assessor especial do ministro da Defesa, foi destacado para tocar as negociações com a equipe de Guedes e vai diariamente ao ministério para despachar com os secretários Rogério Marinho e Leonardo Rolim, que cuidam das modificações na Previdência.
“O regime deles é diferente e regulado por lei, não pela Constituição”, disse Guedes, repetindo um argumento que Azevedo e Silva vem usando nas discussões internas. Os militares alegam que não têm sequer um sistema de Previdência, e sim um “sistema de proteção social” para o pessoal da reserva e pensionistas. Ainda assim, a área técnica da Economia avaliava incluir pontos dos militares na PEC.
Tiro de canhão
Para o ministro Fernando Azevedo e Silva, as Forças Armadas têm sido sacrificadas em prol do ajuste fiscal desde os anos 1980, com forte achatamento salarial e seguidas reformas que retiraram benefícios da carreira. Ele citou a Medida Provisória de 2001 que cortou o adicional de tempo de serviço de 1% ao ano, que dava ao fim da carreira uma gratificação de 35% ou 46%. O auxílio-moradia para a categoria e a contagem de tempo em dobro para quem não chegou a se beneficiar de licenças especiais. “Nosso sacrifício foi muito grande. Foi como um tiro de canhão”, afirmou.
Segundo ele, o regime previdenciário é uma característica da carreira em quase todos os países do mundo.
No Brasil, as regras atuais permitem que militares, homens e mulheres, se aposentem com salário integral após 30 anos de serviços prestados. As pensões para dependentes são integrais, mas deixam de ser pagas aos 21 anos. Na reforma mais recente, feita em 2000, ficou extinta a pensão vitalícia para filhas a partir daquela data. Todos os militares que ingressaram antes de 2000, no entanto, puderam manter o benefício vitalício para as filhas com contribuição adicional equivalente a 1,5% da sua remuneração.
Em países como Estados Unidos e Reino Unido, os benefícios só são integrais em caso de morte em serviço ou de aposentadoria por invalidez. Nos Estados Unidos, por exemplo, após 30 anos de serviço, o benefício pago ao militar representa 60% da remuneração mais uma parcela de contribuição complementar. No Reino Unido, após 30 anos de serviço, o benefício será de 63,8% do salário mais uma parcela complementar contributiva.
Dedicação exclusiva
Como peculiaridades da carreira, o general Fernando Azevedo e Silva citou a disponibilidade permanente, dedicação exclusiva, sem direito a hora extra, a adicional noturno, a fazer greve ou a Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), além do risco de vida. “Essas são características da essência da profissão militar e não queremos que elas mudem”. Os estudos feitos na Defesa mostram que 30 anos de serviço de um militar correspondem a 45 anos no serviço civil, com um acúmulo médio de 29 mil horas extras, que não são pagas.
Segundo ele, a média de um tenente hoje é prestar quatro serviços por mês, ficando seguidas 24 horas no quartel. No dia seguinte, volta para seu trabalho normal, sem direito a ir para casa descansar. O mesmo não ocorre nas polícias militares, onde existe o PM que trabalha 24 horas, tem direito a um seguido descanso de 48 ou 72 horas, dependendo do regime do estado.
Segundo o ministro, se as horas extras fossem pagas às Forças Armadas, custariam R$ 22,5 bilhões por ano. Ele afirmou que, se esse valor fosse descontado do rombo da Previdência das Forças Armadas, o resultado negativo seria reduzido para algo em torno de R$ 20 bilhões.
De acordo com o ministro, essas mudanças no sistema de aposentadoria dos militares precisariam vir junto com a reestruturação das Forças Armadas, em várias das suas legislações, inclusive no que tange a questão salarial, que diz estar “completamente defasada”, em relação às demais carreiras.
Em um dos slides que o ministro apresentou ao seu colega da Economia, ele compara o salário de delegado da Polícia Federal, que começa com R$ 22 mil, ao de um coronel, último posto da carreira militar, que recebe algo em torno de R$ 18 mil. O ministro disse que não quer discutir o salário de outras categorias, mas apenas deixar registrada a diferença entre vencimentos de diferentes carreiras do Estado. “Tem alguma coisa errada nisso”, afirmou.
Pontos em discussão
– Universalização: cobrança da contribuição dos pensionistas e dos alunos em escolas de formação;
– Tempo de serviço antes de passar para a reserva: subiria de 30 anos para 35 anos;
– Alíquota de contribuição: dos atuais 7,5% para entre 8% e 11% (como no INSS).
Instrumentos para as alterações
– Previdência do INSS: tem itens previstos na Constituição; é necessária Proposta de Emenda à Constituição (PEC);
– Proteção social dos militares: os itens estão previstos em lei ordinária; é necessário Projeto de Lei (PL).