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“Escrevemos a carta porque estávamos bastante assustados”, diz Bacha

O economista Edmar Bacha conta por que ele, Armínio Fraga e Pedro Malan, que apoiaram o PT na eleição, divulgaram um texto de alerta a Lula

atualizado

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1 de 1 imagem colorida edmar bacha - Foto: Divulgação

O economista Edmar Bacha, de 80 anos, um dos “pais do Plano Real”, assinou ao lado dos colegas Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central (BC), e Pedro Malan, ministro da Fazenda no governo FHC, todos tucanos, uma carta divulgada na quinta-feira (16/11) em que, na prática, eles dão um puxão na orelha no presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva.

O trio apoiou o petista nas eleições. Ficou, porém, “bastante assustado”, diz Bacha, com as declarações de Lula contra o teto de gastos e com nomeações de integrantes da equipe de transição de governo. Manifestações que, prontamente, têm provocado altas do dólar e quedas na Bolsa de Valores.

No texto dirigido ao futuro presidente, em síntese, o três dizem, em tom didático, que o mercado não é vilão de coisa nenhuma e a economia é um sistema de vasos comunicantes, cujo tremor num ponto pode provocar rachaduras em outros. Assim, a subida do dólar empurra a inflação para cima e a soma de tudo isso recai sobre quem? Sobre os mais pobres, indicam os autores da carta-manifesto.

Além disso, apontaram Bacha, Fraga e Malan, o teto de gastos foi criado como um mecanismo para conter as despesas públicos e, dessa forma, evitar o descontrole da dívida. Se há falta dinheiro para as áreas de impacto social, conclui o grupo, é “porque, implícita ou explicitamente, não se dá prioridade a elas”. A seguir, em entrevista ao Metrópoles, Bacha conta o que levou o trio peso-pesado da economia nacional a se manifestar publicamente.

Vocês três são pessoas com um perfil, para dizer o mínimo, discreto. Foi difícil tomar a decisão de vir a público por meio de uma carta ao presidente eleito?

Não, nós decidimos escrever a carta porque já estávamos bastante assustados.

Mas o que, exatamente, motivou vocês?

Estávamos preocupados com as declarações do presidente Lula. Aí, coincidiu. Nós três acordamos na quinta-feira [17/11] com essa ideia na cabeça. O Armínio propôs a carta e concordamos imediatamente. A redação foi conjunta. Fizemos tudo online. Nós votamos no Lula, na expectativa de uma condução responsável da economia, mas com as declarações recentes dele a gente falou: “Poxa!”.

Em qual ponto das declarações veio o “poxa”?

Principalmente, essa ideia de que existe uma contradição entre o social e o fiscal, além do uso de uma terminologia muito agressiva em relação ao mercado financeiro. Tudo como se austeridade fiscal significasse uma forma de fazer sobrar dinheiro para banqueiros. Falar isso para a plateia dele em tempos de eleição vá lá, mas nessa situação complicada em que o país está vivendo não dá.

Como o senhor avalia a PEC da Transição, cuja minuta prevê um furo no teto de gastos da ordem de R$ 200 bilhões?

Um texto recente dos economistas Cláudio Frischtak, Marco Bonomo e Paulo Ribeiro mostra que a dívida pública explode com esses R$ 200 bilhões, mas isso não aconteceria se o valor ficasse em R$ 80 bilhões. E todas as promessas de campanha do Lula cabem nesses R$ 80 bilhões. Esse é o ponto.

E quanto aos integrantes da equipe de transição? O senhor comemorou a saída do ex-ministro Guido Mantega do grupo ligado ao Planejamento?

Sim, mas logo em seguida nomearam outro. Saiu o “Guido I” e entrou o “Guido II”, o Marcio Pochmann.

Que foi presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), entre 2007 e 2012.

No Ipea, ele tirou todo mundo que era descente e colocou um bando de gente lá. Só entrava quem era de Campinas. [A Unicamp é considerada um dos berçários da Nova Matriz Econômica, teoria que orientou parte dos economistas que atuaram nos governos do PT.] Ainda bem que tem o Pérsio Arida está lá.

Mas o que ele está fazendo lá?

Ah, isso eu não sei. Ouvi noticiário que nenhum membro da área econômica foi consultado sobre a PEC.

Ainda sobre o tema gastos do governo, o que mais é preciso discutir, além da PEC da Transição?

Aí, é outra história. Temos de avançar com a reforma administrativa e tributária, além de rever os procedimentos das emendas do relator.

O senhor acha que é possível avançar nesses temas?

Estamos trabalhando para isso. Temos de criar um ambiente de pressão nessa direção.

Qual a prioridade no momento?

A PEC é o primeiro passo. É preciso evitar que ela provoque uma tendência explosiva da dívida pública. Depois, vamos discutir o resto.

Seria importante a nomeação neste momento de um ministro para a área econômica?

Bom, teria de ser alguém que ajudasse o Geraldo Alckmin [o vice-presidente eleito]. Ele não pode ficar toda hora na função de bombeiro. O presidente Lula fala uma coisa pela manhã e, à noite, o Alckmin vai à televisão para dizer que não é aquilo. O importante é o Lula parar de falar essas coisas. O que o mercado quer é alguém mais parecido com a dupla Antonio Palocci e Henrique Meirelles. O Palocci montou uma equipe de alto nível no Ministério, com nomes como Marcos Lisboa e Bernard Appy. O Meirelles fez a mesma coisa no Banco Central.

O senhor se arrependeu de ter votado no presidente eleito Lula?

Claro que não. A alternativa era a ditadura.

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