Entenda como o Renda Brasil pode mexer com os seus benefícios
Ideia pretende unificar benefícios “mal direcionados” – nas palavras de Guedes – e aumentar o valor do Bolsa Família
atualizado
Compartilhar notícia
A equipe econômica do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) estuda uma proposta para unificar alguns benefícios direcionados a famílias de baixa renda e, assim, elevar o valor pago atualmente no programa Bolsa Família.
A ideia, segundo o ministro da Economia, Paulo Guedes, é redirecionar os recursos de programas “mal focalizados”, como o abono salarial e o salário-família, para o Bolsa Família, que passaria a se chamar Renda Brasil.
“O nível vai subir para R$ 250 ou para quase talvez R$ 300”, disse Guedes, em entrevista à rádio Jovem Pan, no último dia 15. Hoje, o valor pago pelo Bolsa Família, que tem 13 milhões de inscritos, é de R$ 190 por mês.
A proposta surge, inclusive, como uma alternativa para parte das pessoas que recebem hoje o auxílio emergencial de R$ 600, criado pelo governo federal durante a crise econômica causada pela pandemia do novo coronavírus.
Ao Metrópoles, o presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, admitiu que, se o governo precisar, poderá usar a base de dados do auxílio emergencial para realizar os pagamentos do Renda Brasil.
Presidente da Rede Brasileira de Renda Básica, Leandro Ferreira analisa que a proposta de criar um benefício único é satisfatória, mas antecipa alguns problemas que podem surgir caso o governo não desenvolva bem o programa.
“Por esses desenhos que vieram até agora, o governo poderia levar um prejuízo para quem está um pouco acima da faixa de pobreza. Ou seja, são pessoas que, se perderem o emprego, entram na miséria”, afirma o especialista.
Esse grupo que está pouco acima da faixa da pobreza, citado por Ferreira, deixaria de receber, por exemplo, o abono salarial, que atualmente é pago a quem recebe até dois salários mínimos.
O risco de cair na pobreza, portanto, poderia ser maior, caso não seja incluído no Renda Brasil, uma vez que não teria mais benefícios para receber. “Seria melhor tirar de quem está mais alto na distribuição e dar para essas pessoas”, diz.
Veja outros pontos que devem ser analisados:
Como está a discussão sobre a renda básica?
Leandro Ferreira: Uma vez que o auxílio emergencial já se consolidou, inclusive com a prorrogação do governo, a gente tem um debate sobre o pós-auxílio emergencial. São vários contornos, mas muita gente chama o que vem pela frente de renda básica. No fundo, é uma reforma das políticas sociais de transferências de renda. Algumas oportunidades são únicas, como a criação da Frente Parlamentar instalada no Congresso Nacional, onde vai ser um bem caminho consistente.
Como está a participação do governo nesse debate?
Leandro Ferreira: Infelizmente, no Executivo, a gente não tem essa mesma oportunidade. Essa truculência toda do governo Bolsonaro não fez uso da inteligência em política social que o Brasil tem aí, por meios dos seus técnicos. Por isso a gente aposta no Congresso.
Existe risco do país retroceder com o Renda Brasil?
Leandro Ferreira: Evidente que sempre temos o risco de tudo ou nada acontecer. O que eu tenho visto é que essa estratégia do Renda Brasil não vai ser tão abrangente como tem sido debatido. Para mudar alguns programas, como o abono salarial, precisaria de um esforço legislativo muito grande. E eu não vejo uma disposição nem do Congresso Nacional nem do governo para propor isso, neste momento. O que eu acho que vai acontecer é que vão introduzir um monte de penduricalho no Bolsa Família, aumentar um pouco os recursos e extinguir um ou outro programa, avançando pouco para o que é o Bolsa Família, que será chamado de Renda Brasil para capitalizar politicamente.
O que pode mudar com possíveis alterações no abono salarial?
Leandro Ferreira: O governo, por esses desenhos que vieram até agora, poderia levar um prejuízo principalmente para quem está um pouco acima da faixa de pobreza. Esse cara, eventualmente, se perder o emprego, entra na pobreza. O que me parece é que o governo está propondo coisas que levaria a uma redução da proteção dessa faixa de pessoas e ainda extinguiria alguns serviços. O Guedes chegou a falar no Farmácia Popular, por exemplo, e do Fundeb.
Por que poderia levar um prejuízo para quem está pouco acima de faixa da pobreza?
Leandro Ferreira: porque os recursos do abono beneficiam até quem tem dois salários mínimos de renda. Então, se retira esses recursos para pagar só quem está na faixa de pobreza e extrema pobreza, esse cara que tem dois salários mínimos não está nessa faixas apesar de ser um beneficiário do abono. Então, ele perderia esse benefício, que é de um salário mínimo por ano, e deixaria de ter um benefício liquido de R$ 80 ao longo de cada mês. Tirar dos não tão pobres para dar para os mais pobres? Nesse sentido, seria melhor tirar de quem está mais alto na distribuição e dar para os mais pobres e também para esse cara que recebe o abono.
Hoje o auxílio emergencial chega a 67 milhões. Essa é uma base legal para pagar o Renda Brasil?
Leandro Ferreira: Existem distorções dentro dessa base. O que a gente precisa é caracterizar a família desses 67 milhões de pessoas e pagar preferencialmente por pessoa de cada uma dessas famílias. Então, é uma boa base, do ponto de vista operacional é excelente, mas esse número de 67 milhões ainda é pouco, poderia ser melhor, até próximo dos 100 milhões, pois ficaram de fora aposentados, trabalhadores e crianças.
O valor estudado de R$ 250 por pessoa é vantajoso?
Leandro Ferreira: Um benefício que seja generoso, acima das faixas do Bolsa Família, ou seja, a partir de R$ 120 reais por pessoa, já começa a ser mais vantajoso do que se a pessoa recebe Bolsa Família e abono salarial, por exemplo. O importante é que, se for mexer no abono, tem que colocar um critério de entrada tão alto como o auxílio emergencial. Ainda assim, vai ter gente que vai sair perdendo, que é o cara que é sozinho e ganha dois salários mínimos. Ele recebe o abono hoje, mas essa pessoa pode sair perdendo.