Entenda como a privatização da Eletrobras vai afetar o seu bolso
Governo estima que pode haver redução de 7,36% na conta de luz com a privatização da empresa, mas especialistas do setor apontam o contrário
atualizado
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Especialistas alertam que a desestatização da maior empresa de energia elétrica da América Latina, a Eletrobras, deve elevar o valor das tarifas de energia. Embora a privatização ainda pareça um assunto distante, os consumidores precisam estar atentos à mudança.
Criada em 1962, a Eletrobras é uma empresa de capital aberto, que tem como acionista majoritário o governo federal. A companhia atua principalmente nos segmentos de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica.
O governo estima que pode haver redução de 7,36% na conta de luz com a privatização da empresa, mas especialistas do setor apontam o contrário.
Maurício Tolmasquim, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e ex-ministro de Minas e Energia, avalia que as regras da privatização trazem uma armadilha para o consumidor.
“Em 2012, quando foram prorrogadas as concessões das hidrelétricas que estavam vencendo, o governo estabeleceu o valor do MWh em R$ 75 para essas usinas. Mas a Eletrobras privada vai poder vender a energia gerada por antigas hidrelétricas por um preço de mercado, que está em torno de R$ 150 por MWh. É a chamada descotização”, diz.
TCU aprovou
O processo de privatização da Eletrobras foi aprovado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) nesta semana. O governo federal corre contra o tempo para concluir a privatização da estatal até agosto. A expectiva é de que o negócio renda até R$ 67 bilhões para a União nos próximos anos.
Do total que será arrecadado, R$ 32 bilhões serão destinados à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Esse montante será pago ao longo de 25 anos, com R$ 5 bilhões no primeiro ano. A CDE é um fundo bilionário bancado pelos consumidores via conta de luz todos os meses.
Para Hugo Lott, da Grid Energia, uma eventual redução na conta de luz seria pequena e temporária. Ele explica que parte do valor de venda da estatal será destinado ao barateamento das tarifas, mas o impacto só deve ser sentido nos primeiros anos após a privatização da estatal.
“Só a CDE de 2022 foi orçada em R$ 32,1 bilhões. Então, R$ 32 bilhões destinados a esse fundo não é um valor tão grande quanto parece. Uma pequena redução pode acontecer no primeiro ano, mas o valor diluído pelos outros 25 anos vai ser muito pequeno para diminuir as tarifas”, destaca Lott.
Jabutis
Além disso, mais despesas devem sobrar para o consumidor com a privatização da estatal devido aos “jabutis”, termo usado para trechos incluídos em uma medida provisória (MP), que extrapolam o assunto original da proposta.
O texto aprovado pelo Congresso Nacional exige a contratação de usinas termelétricas movidas a gás natural para fornecimento de 8 gigawatts (GW) de energia por 15 anos.
Também foi determinado que as usinas estejam instaladas em localidades das regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste, que não possuem ainda infraestrutura de transporte de gás natural.
Para que elas operem, o governo se comprometeria com a construção de gasodutos, o que deve elevar os custos para os consumidores de energia.
O professor do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (USP) Célio Bermann alerta que o preço pago por essa expansão será muito acima do ideal.
“Todo esse investimento em infraestrutura e logística vai tornar as usinas térmicas financeiramente inviáveis. Não existe lógica por trás dessa decisão, que só vai beneficiar grandes empresários”, avalia.
Ao longo da aprovação da MP, os parlamentares também incluíram no texto a prorrogação, por mais 20 anos, dos contratos das usinas construídas no Programa de Incentivos às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa), implementado em 2004.
“Essa decisão não tem fundamento. Com a quantidade de projetos, empresas privadas e usinas novas que temos hoje no país, renovar o contrato de usinas antigas, muito menos eficientes, não tem sentido. Quem vai pagar a diferença é o consumidor”, afirma o professor da UFRJ Maurício Tolmasquim.
(*) Bernardo Lima é estagiário do Programa Mentor e está sob supervisão da editora Maria Eugênia