Cobertura do BNDES no Nordeste cai 46% em nove anos
Volume de empréstimos para a região em 2020 foi de R$ 6,8 bilhões. Pesquisa do Ipea também revela queda da cobertura de municípios
atualizado
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O volume de crédito desembolsado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para a região Nordeste caiu em quase três quartos (73,5%) desde 2013, mostram dados da instituição analisados pelo Metrópoles. Já a cobertura de municípios caiu de 89%, em 2010, para 48%, em 2019. Ou seja, cerca de 46% – quase a metade.
Naquele ano, o BNDES distribuiu R$ 25,657 bilhões em empréstimos. Já em 2020, o valor desembolsado foi R$ 6,795 bilhões.
A queda na região Nordeste acompanha – de maneira mais acentuada – a trajetória descendente do volume de crédito oferecido em todo o país pelo banco ao longo dos últimos anos. Entre janeiro e dezembro de 2013, foram desembolsados R$ 190,419 bilhões em crédito no Brasil, enquanto em 2020 o montante foi R$ 64,921 bilhões, baixa de 65,9%.
No entanto, a região foi a única que seguiu em declínio no ano passado, em meio à crise econômica da pandemia de Covid-19.
Houve crescimento do número de empréstimos nas ordens de 8%, 15%, 16% e 39%, respectivamente, nas regiões Norte, Centro-Oeste, Sul e Sudeste do país em 2020. Trata-se de valores correntes e, portanto, foram corrigidos pela inflação. Veja o gráfico:
“A redução do volume de recursos disponibilizados pelo BNDES ocorre, em grande parte, por uma questão fiscal do governo, devido à crise que começou a partir de 2014. O BNDES usa boa parte de recursos que são advindos do Orçamento da União”, explica o economista Joseph David Barroso Vasconcelos de Deus, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
“O que tem acontecido agora é um direcionamento da política de crédito para as demais regiões. O Nordeste também tem um banco de desenvolvimento próprio, que é o BNB [Banco do Nordeste]. Então, o BNDES tem priorizado outras regiões, que são consideradas mais dinâmicas. E, neste momento [de pandemia], o governo tem um papel essencial de entrar dentro do mercado ampliando o crédito, principalmente, para financiar as atividades produtivas das empresas”, declara o economista.
Estudo elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), ao qual o Metrópoles teve acesso, revela também uma queda na cobertura de municípios nordestinos pelo BNDES.
“Embora o BNDES não possua suas próprias agências, visto que distribui a maioria dos seus empréstimos por meio de intermediários financeiros credenciados, a cobertura de municípios caiu de 89%, em 2010, para 48%, em 2019”, assinalam os pesquisadores Philipp Ehrl e Rodrigo Portugal, do Ipea.
Isso mostra, portanto, que o banco de desenvolvimento tem atendido cada vez menos cidades na região – além da drástica queda do volume de crédito, sobretudo para empresas de comércio, de serviços e da indústria.
O estudo foi publicado em julho deste ano. Nele, os pesquisadores comparam a atuação do BNDES à do Banco do Nordeste, que, por sua vez, manteve a cobertura nos municípios ao longo do mesmo período (2010-2019). Com mais de 270 agências espalhadas pela região, o BNB consegue atender clientes em 99% dos 1.790 municípios nordestinos.
Ehrl e Portugal destacam, ainda, que a queda registrada pelo BNDES ocorreu, em especial, nas capitais e nas regiões mais desenvolvidas perto do litoral, dando prioridade à região chamada de Matopiba, que engloba Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.
“Houve uma redistribuição dos recursos do BNDES, uma vez que, quando comparado com o cenário no início da década, atualmente estão favorecendo mais o interior do Nordeste e rumando em direção ao Matopiba, uma fronteira agrícola brasileira na produção de grãos”, afirmam os especialistas, no estudo.
“A complementaridade entre os dois bancos também ocorre espacialmente. Além da maior cobertura regional, o BNB distribui seus empréstimos especialmente entre as regiões menos desenvolvidas, que fazem parte do semiárido e que se encontram mais distantes dos centros econômicos e do litoral. Enquanto isso, o BNDES empresta mais em regiões desenvolvidas, especialmente nas capitais estaduais. Essas diferenças são explicadas pelo perfil dos seus clientes, formados majoritariamente por empresas de médio e grande porte, e com ativos financeiros mais robustos”, avaliam os pesquisadores.