Altos níveis de estresse afetam mais de 30% das pessoas em empresas
O número cresceu 4,4% no ano passado, mesmo após a queda da pandemia. E isso em companhias tidas como “incríveis para trabalhar”
atualizado
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Os momentos mais críticos da pandemia parecem ter ficado para trás, mas algumas de suas consequências mais inquietantes têm mostrado uma resiliência surpreendente. Entre elas, está a questão da saúde mental. Com o fim do isolamento social, imaginava-se que o problema iria arrefecer. Mas não foi isso que se viu nos ambientes de trabalho.
Patamares elevados de estresse e esgotamento mental estão sendo mantidos nas alturas, mesmo em empresas classificadas pelos próprios funcionários como “lugares incríveis para trabalhar”. É isso o que indica uma pesquisa anual FIA Employee Experience (FEEx), que contou com a participação de 121 mil pessoas que trabalham em 140 empresas no Brasil.
O levantamento mostrou que, em 2022, 30,9% dos funcionários dessas companhias apresentam altíssimo nível de estresse. O número representa um crescimento de 4,4% em relação a 2021. Ele só perde para 2020, justamente no ápice da pandemia, quando o índice alcançou 36,5%. “O problema é que o indicador, além de ter diminuído pouco, voltou a crescer”, diz Lina Nakata, pesquisadora da FEEx (veja quadro abaixo).
De acordo com as pessoas ouvidas no estudo, a principal causa desse misto de estafa e tensão é a sobrecarga de tarefas. Mas não é só. Fatores externos ao ambiente corporativo atuam como agravantes. O principal deles? O endividamento.
A inadimplência cresceu continuamente no país ao longo deste ano e só deu os primeiros sinais de estabilização – ainda assim, tênues – em novembro. O detalhe é que as pessoas que participaram da pesquisa estão empregadas. Elas têm renda, portanto. Ainda assim, houve no ano passado um aumento de 26% no número de trabalhadores cujas dívidas foram classificadas como “fora de controle”. Ou seja, sem chance real de quitação.
Isso resultou em uma queda de 7,4% na avaliação que esse grupo deu à experiência de trabalho. Essa turma mostrou-se mais crítica principalmente em relação a tópicos como salários, benefícios e recompensas não financeiras. “Essas pessoas afirmam que trabalham muito, mas não se veem recompensadas pelo esforço”, observa Lina.
O estudo identificou ainda que um aumento dos casos de síndrome de burnout (esgotamento mental) nessas companhias. O avanço foi de 12% em 2022 na comparação com o ano anterior. Os entrevistados que fazem parte desse subgrupo também consideraram a experiência de trabalho negativa. Atribuíram uma nota ao ambiente corporativo 18% inferior ao grupo considerado saudável.
Entre sete setores avaliados, os bancos apresentam o maior número de pessoas com alto nível de estresse, com 45,2% de seus quadros em tais condições. Isso é quase a metade dos funcionários dessas empresas. A seguir, vêm os serviços de saúde, com 39,2%. A última posição é ocupada pelo agronegócio, com 21,3%, ou seja, menos da metade do líder do bloco (veja quadro abaixo).
Na avaliação de Lina Nakata, as companhias pesquisadas mostraram-se atentas ao problema, uma vez que 60% delas treinam seus líderes para identificar problemas de saúde mental em suas equipes. Isso, porém, nem sempre é suficiente. “É preciso manter um cuidado constante, o que inclui até o esforço para resolver questões do dia a dia”, afirma. “Se um funcionário tem de fazer um relatório com rapidez, mas demora para obter as informações necessárias para o trabalho, isso vai gerar estresse, mas é uma situação que pode ser evitada pelo gestor.”
A pesquisadora observa que, em casos de má gestão dos líderes, são inócuas ações como palestras, ou mesmo, atendimentos individuais. “É preciso identificar a raiz do problema e agir”, afirma. Mas existe um empecilho adicional nessas situações. Lina explica: “Muitas vezes, as pessoas que ocupam cargos de chefia estão mais estressadas do que seus subordinados e isso só piora tudo”.
Sobre a manutenção de altos níveis de estresse e esgotamento mental, mesmo com o fim das medidas mais radicais de isolamento social, Lina considera que as pessoas, assim como as companhias, ainda estão se ajustando a uma nova rotina. “Acho que todos estão aprendendo a encontrar um bom ritmo e uma forma eficaz de trabalho e relacionamento”, diz. “E isso parece ser ser mais complicado do que imaginávamos.”