“Desabei, chorei muito”, diz dono de livraria incendiada no Rio
Após perder mais de 10 mil livros em incêndio, dono da Belle Époque, no Méier, recebeu uma corrente de solidariedade
atualizado
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Rio de Janeiro- O sonho construído há mais de quatro anos foi destruído em poucos minutos, quando a livraria Belle Époque, no Méier, zona norte do Rio, pegou fogo. O incêndio aconteceu na última quinta-feira (21/7), por volta das 22h. Desde então, em meio a mais de 10 mil livros perdidos, uma corrente de solidariedade foi formada para ajudar Ivan Costa, 41, dono do estabelecimento.
“Demorei uns segundos para assimilar. Os bombeiros chegaram, e foi então que eu comecei a chorar muito, desabei. Aquilo era o sonho da minha vida, um sonho que demorei anos para conquistar e que acabou em segundos”, disse o dono da Belle Époque ao Metrópoles.
Ivan Costa recebeu a notícia do incêndio na noite de quinta-feira (21/7), cerca de três horas após ter fechado a livraria: “Uma vizinha ligou, desesperada, dizendo que estava pegando fogo. Fui correndo, cheguei em menos de 10 minutos, mas, quando cheguei lá, tinha uma labareda de fogo”, conta.
No dia seguinte, logo pela manhã, uma corrente de solidariedade começou a se formar rapidamente. Clientes, amigos, vizinhos, todos chegaram para ajudar na limpeza. Na sexta-feira (22/7) à tarde, o espaço já estava sem destroços.
Uma vaquinha online foi criada e divulgada nas redes sociais para quem pudesse ajudar com qualquer quantia. Em quatro dias, mais de R$ 30 mil foram arrecadados. Pessoas do Rio e fora do estado, que Ivan nem conhece, se sensibilizaram com a situação.
“Meu celular ficou travado de quinta à noite até sábado de manhã, de tanta mensagem e ligação que eu recebi de pessoas me oferecendo ajuda. As pessoas têm participado da vaquinha e muitos são pessoas que eu nem conheço. Tem gente fazendo ponto de coleta em Petrópolis e São Paulo”, conta Ivan.
Ajuda de voluntários
O incêndio está sendo investigado pela Polícia Civil e o perito que foi até o local estava rastreando a fiação. A hipótese é que o incêndio tenha sido causado por um curto circuito.
A ajuda chegou de todas as formas. Quem podia pegar peso, entrou na livraria para ajudar a tirar os itens mais pesados, como livros, móveis e estantes. Já quem tinha limitações, ajudou através de doações, água e cafezinho para os voluntários.
Ivan está sendo auxiliado por amigos arquitetos que estão estudando o espaço e montando um projeto de reconstrução da Belle Époque:
“O local era alugado, a proprietária foi super solidária comigo. Quero reconstruir, reformar para em breve abrir as portas. O que eu quero é paz e continuar a fazer o trabalho naquela região do Méier, que tem menos acesso à cultura. Ainda está sendo feito o cálculo de quanto iremos gastar, mas já tenho doação de tijolos, tintas, fiação e mão de obra para receber”, conta o dono da livraria.
Sonho antigo
O sonho de ter uma livraria surgiu bem antes da Belle Époque, em 2008. Ivan trabalhou em duas livrarias muito importantes no centro do Rio. Foi lá que o dono começou a vender livros para ele à preço de custo, para iniciar o seu próprio negócio: “A partir daí, comecei a vender no Largo da Carioca e as pessoas começaram a gostar. Depois comprei uma bicicleta e trabalhei rodando pelo centro do Rio, fazendo as vendas. Quando comecei na Belle Époque já tinha estante, livros e discos de vinil”, conta Ivan.
O espaço é a única livraria do Méier e trabalha com livros de filosofia, história, psicologia, literatura para adolescentes, teatro, cinema, música, além da venda de discos de vinil.
Dos 7 aos 10 anos, foram os livros que fizeram companhia para Ivan, que morava com a avó no interior do Rio de Janeiro, em Conceição de Macabú: “Sempre gostei de ler e como não tinha tantas crianças para brincar, me distraía com os livros. Adorava os livros da coleção Vagalume e um livrinho de artesanato que nunca mais encontrei para comprar”, disse o dono da Belle Époque.
Como a rua onde a livraria fica localizada não tem tanto movimento, ele precisava atrair as pessoas até lá, através de saraus e movimentos na própria rua.
Feira de livros
Após o incêndio, restaram apenas uma foto da sambista Araci de Almeida e uma cadeira de madeira, que ficou intacta.
No dia 13 de agosto, ele vai realizar uma feira com livros de expositores, que já estava marcada antes do incêndio. A partir do meio-dia a rua ficará fechada para o evento cultural com música ao vivo, barraquinhas: “vai ser um dia de cultura em frente à livraria. Quem quiser comparecer, será muito bem-vindo”, diz Ivan.
Com tanta ajuda e solidariedade das pessoas, Ivan espera que a livraria fique ainda mais bonita do que era, quando for reaberta: “Quero agradecer todo o carinho, me senti muito abraçado pela corrente que se formou. Todo mundo ajudando, me ligando, foi o que me manteve em pé até agora. O amor vai transformar esse país para melhor. É o caminho que a gente tem que seguir”.