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Depois de vencer avalanche de lama, sobreviventes esperam por auxílio

Operadora de máquinas, Maria Aparecida conseguiu salvar a própria vida e as da filha e do marido, mas não tem trabalho nem onde morar

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Bárbara Ferreira/Especial para o Metrópoles
Maria Aparecida sobrevivente da tragédia em Brumadinho
1 de 1 Maria Aparecida sobrevivente da tragédia em Brumadinho - Foto: Bárbara Ferreira/Especial para o Metrópoles

Brumadinho (MG) – Todos os dias, há quase 20 anos, Maria Aparecida dos Santos, 44 anos, operadora de máquinas em uma fazenda nas imediações do Córrego do Feijão, seguia a mesma rotina. Pouco antes do meio-dia fechava a casa de máquinas e ia para a sua residência, preparar o almoço da família.

No dia 25 de janeiro deste ano, Maria olhou o relógio e viu que faltavam 10 minutos para o meio-dia. Foi para casa, colocou as panelas no fogão e lavava algumas folhas para a salada quando ouviu um estrondo. O barulho, que para a mulher “parecia o fim do mundo”, mudou sua vida definitivamente e trouxe uma devastação de lama que varreu tudo o que ela um dia conquistou.

Enquanto arrumava o almoço, Maria Aparecida chamou a filha Ana Clara, de 9 anos, e pediu que a menina colocasse o telefone da mãe para carregar. “Ela colocou na mesinha do canto da sala e eu voltei para a cozinha. Ouvi um barulho estranho, uma ventania forte e o pontilhão do trem estalando. O trem eu sabia que não era porque não o via nos trilhos. Quando fixei o olhar, o pontilhão começou a desabar e veio tudo aquilo para cima dele”, lembra a moradora da área atingida pelo rompimento da Barragem I, da Mina do Feijão, em Brumadinho (MG).

Em meio ao desespero, mas ainda com raciocínio rápido, Maria Aparecida chamou Ana Clara novamente. Pediu que a garota pegasse o celular e saísse para o quintal. Quando as duas já estavam no terreiro, a mãe pegou no braço da filha e disse: “Você precisa me ajudar. Vamos correr muito agora. Usa toda a sua força e não olha para trás”. Assim, as duas correram na frente da lama, pelo meio do mato, até chegar a uma estrada de terra que não foi atingida.

Telefonema salvou marido
Durante a fuga, a lama chegou aos seus joelhos de mãe e filha. Ainda assim, elas seguiram em frente. Maria Aparecida caiu no caminho, mas se levantou novamente e espiou, de relance, o caminho que deixara para trás. Via pessoas e coisas sendo arrastadas. Já seguras no alto da estrada, onde a lama não alcançava, a mulher ainda conseguiu ligar para o marido, que trabalhava em uma horta na mesma fazenda em que ela e a filha estavam: o avisou a tempo pra escapar, com os companheiros de lavoura, da enxurrada de lama.

Para a operadora de máquinas, o pior dia de sua vida foi também a data em que considera ter nascido de novo. Agora, fica o vazio de lembranças, memórias de toda uma vida que está soterrada pela lama da Vale.

Salvei as nossas vidas, mas perdi tudo. O que não consegui salvar foram meus bens e tudo que conquistei em 20 anos, mas exijo que eles me devolvam isso. Preciso montar um lar para a minha filha. Eles nos arrancaram nosso lar e isso não é culpa de nenhum de nós. Ficou tudo na lama

Maria Aparecida dos Santos, sobrevivente da tragédia em Brumadinho
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Ana Clara, de 9 anos, pegou o celular da mãe e correu junto para se salvar da avalanche de rejeitos de minério: ela e Maria Aparecida ficaram com lama até os joelhos
Nas imediações da casa da família, cenário é de destruição
Maria Aparecida diz que sua vida, agora, será cobrar a Vale por tudo o que perdeu e lutar por Justiça
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Operadora de máquinas, Maria Aparecida não sabe onde vai morar nem como fará para sustentar a família: ela perdeu o trabalho e todos os bens pessoais

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Ana Clara, de 9 anos, pegou o celular da mãe e correu junto para se salvar da avalanche de rejeitos de minério: ela e Maria Aparecida ficaram com lama até os joelhos

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Nas imediações da casa da família, cenário é de destruição

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Maria Aparecida diz que sua vida, agora, será cobrar a Vale por tudo o que perdeu e lutar por Justiça

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Reparação
Agora, Maria Aparecida afirma que sua missão de vida é cobrar da Vale tudo o que foi levado. Ela conta que, em setembro do ano passado, funcionários da empresa estiveram em sua casa e orientaram a família sobre procedimentos emergenciais a serem adotados em um eventual rompimento da barragem. Nada funcionou. O silêncio ensurdecedor da sirene não tocada é o que mais angustia Maria Aparecida: segundo ela, a tristeza de perder tudo não seria evitada, mas vidas de amigos, vizinhos e conhecidos poderiam ter sido salvas pelo sinal de alerta.

Duas semanas após o rompimento da barragem, a espera, a falta de rotina, de informações e de um cantinho para chamar de lar são as maiores dores de Maria Aparecida e sua família. Ela diz ter ido a um dos centros de apoio oferecidos pela Vale, feito todos os cadastros necessários, mas não tem nenhuma perspectiva quanto a ressarcimentos e de quando poderá sair da pousada em que está hospedada.

Um teto, roupas doadas e alimentação estão sendo garantidos, mas, para além disso, tudo é apenas uma indagação. Ela não sabe como fará para se manter, pois perdeu também o emprego, para comprar novamente materiais escolares e uniforme da filha e nem como levará a vida daqui em diante.

“Estou sem emprego, sem casa, sem nada. O meu objetivo agora é lutar por Justiça para que eles devolvam tudo o que me foi tirado. Vou cobrar, vou lá todos os dias, mas preciso retomar a vida, e sem uma casa e algum tipo de auxílio financeiro é impossível”, diz. “Já comecei a emitir novamente todos os meus documentos, matriculei a minha filha em uma nova escola, mas isso é só o que eu posso fazer sozinha”, lamenta.

A Vale anunciou que fará doações de R$ 50 mil para as famílias que perderam as suas casas e R$ 15 mil para os que ficaram desempregados ou perderam as suas fontes de renda. Maria Aparecida e o marido se enquadram nas duas categorias, mas até agora ainda aguardam a efetivação dessa doação e uma moradia provisória.

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